PREFACIO
A BUSCA AMOROSA PELO SERVO PERDIDO
Um teólogo cristäo predisse
que o cristianismo estava à beira de uma revoluçäo coperniquiana. Antes de Copérnico, acreditava-se que a
terra era o centro do universo, e que o sol e outros planetas orbitavam a terra. Até recentemente, no mundo ocidental se
pensava que o cristianismo era a concepçäo central da divindade no universo
teísta. Mas como o homem ocidental
começou a olhar para o oriente, descobriu uma pluralidade de concepçöes teístas
orbitando a Suprema Verdade.
Aceitando essa pluralidade,
devemos também aceitar as gradaçöes de teísmo que vem acompanhando, superior e
inferior. Como os planetas estäo
situados de acordo com sua atraçäo gravitacional pelo sol, as variedades de
concepçäo teísta situam-se na esfera superior ou inferior conforme sua atraçäo
pelo Centro Absoluto. A concepçäo
Krishna da divindade é de ser irresistivelmente atraído numa atraçäo pelo
centro infinito de todo amor, beleza e harmonia.
A BUSCA AMOROSA PELO SERVO PERDIDO
por
Om Vishnupada Paramahamsa
Parivrajakacharya Varya
Sarva Shastra Siddhanta Vit
Astottara Sata Sri
Srimad
SRILA BHAKTI RAKSAKA
SRIDHARA DEVA GOSWAMI MAHARAJA
traduçäo de Indumukhi devi dasi
Curitiba, setembro de 1998
PREFACIO
Um teólogo cristäo predisse
que o cristianismo estava à beira de uma revoluçäo coperniquiana. Antes de Copérnico, acreditava-se que a
terra era o centro do universo, e que o sol e outros planetas orbitavam a terra. Até recentemente, no mundo ocidental se
pensava que o cristianismo era a concepçäo central da divindade no universo
teísta. Mas como o homem ocidental
começou a olhar para o oriente, descobriu uma pluralidade de concepçöes teístas
orbitando a Suprema Verdade.
Aceitando essa pluralidade,
devemos também aceitar as gradaçöes de teísmo que vem acompanhando, superior e
inferior. Como os planetas estäo
situados de acordo com sua atraçäo gravitacional pelo sol, as variedades de
concepçäo teísta situam-se na esfera superior ou inferior conforme sua atraçäo
pelo Centro Absoluto. A concepçäo
Krishna da divindade é de ser irresistivelmente atraído numa atraçäo pelo
centro infinito de todo amor, beleza e harmonia.
O infinito pode Se dar a
conhecer ao finito, e o agente divino através de quem essa funçäo se manifesta
é Sri Guru ou o guia divino. Sua
Divina Graça Srila Bhakti Raksaka Sridhara Deva Goswami é um agente da
divindade e um mensageiro dessa realidade suprema. Ele nos lembrou que somos todos "filhos do néctar"
e que teremos que "morrer para viver", "mergulhar fundo na
realidade" e entrar na "terra da dedicaçäo". Na medida em que nos sacrificamos neste
plano, nos tornaremos libertos de sua influência e seremos atraídos através da
dedicaçäo para o plano mais elevado da realidade onde os divinos passatempos
"se movimentam de maneira tortuosa". E ali encontraremos o "tesouro oculto do Doce
Absoluto" no serviço de Srimati Radharani.
Sua Divina Graça nos
informou que o anelo íntimo do coraçäo pelo êxtase, encanto e doçura, guia o na
busca por Sri Krishna - a Realidade, o Belo. A concepçäo Krishna da divindade é täo irresistível que até
mesmo o próprio Krishna é subjugado por Sua própria potência e está loucamente
ocupado em provar de Sua própria doçura, dançando extaticamente, e assim distribuindo
essa doçura aos outros.
No Sri Chaitanya-charitamrta, Srila Krsnadasa Kaviraja Goswami
descreve que enquanto dançava no Ratha-yatra, Sri Chaitanya Mahaprabhu às vezes
caía num desmaio extático e parecia "uma montanha dourada rolando no
chäo". Srila Sridhara
Maharaja descreve que: "Na
agonia da separaçäo de Krishna, erupçöes extáticas de êxtase fluíam como lava
do coraçäo do Vulcäo Dourado de Amor Divino, Sri Chaitanya Mahaprabhu."
E agora na Busca Amorosa Pelo Servo Perdido,
descobrimos que o coraçäo do Senhor é tal, que Ele também sente a agonia da
separaçäo de Seus devotos caídos, e como eles estäo ocupados em procurar por
Ele, também Ele se ocupa numa busca amorosa por Seus servos perdidos.
Bhakti Sudhira Goswami
HISTORIA
A BUSCA AMOROSA PELO SERVO
PERDIDO FOI COMPILADA DE PALESTRAS DADAS POR SUA DIVINA GRAÇA SRILA BHAKTI
RAKSAKA SRIDHARA DEVA GOSWAMI NO LINDO SRI CHAITANYA SARASWAT MATH AS MARGENS
DO SAGRADO RIO GANGES EM NAVADWIP DHAM, INDIA. A DATA DE SUA MANIFESTAÇÄO É 14 DE MARÇO DE 1987, DIA DO
DIVINO APARECIMENTO DE SRI CHAITANYA MAHAPRABHU.
INDICE
Página
INVOCAÇÄO
4
INTRODUÇÄO
6
PLANETAS DE FÉ
11
O MEIO-AMBIENTE
22
SOB O OLHAR AMOROSO DE
DEUS
34
SENHOR DAS VACAS
41
A ILUSÄO DE BRAHMA
45
DEUS COMO FILHO
57
DEVOÇÄO LIVRE DE
CONHECIMENTO
66
O SANTO NOME 81
O SERVIÇO DE SRI RADHA
92
que foi sancionado por Sri
Chaitanya através de Seu advento era conhecido intimamente apenas por Svarupa
Damodara. Foi adorado por Sanatan
e servido por Rupa e seus seguidores.
Raghunatha Dasa
provou plenamente dessa
coisa maravilhosa e realçou-a com sua própria realizaçäo. E Jiva Goswami apoiou e protegeu-a
citando as escrituras. O sabor
dessa verdade divina é a aspiraçäo de Brahma, Shiva e Uddhava, que a respeitam
como a meta suprema da vida. Qual
é essa maravilhosa verdade? Que o mais alto néctar de nossa vida é o serviço de
Sri Radha. É a mais elevada dádiva
jamais conhecida pelo mundo. ó Bhaktivinoda Thakura, está em teu poder permitir
que concedam a graça Dela a nós.
Bhaktivinoda Thakura, por favor seja bondoso para conosco e conceda-nos
tua misericórdia.
* * *
Uma vez, enquanto Krishna e as vacas estavam retornando da floresta de
Vrndavana ao final do dia, um menino acabava de alcançar a emancipaçäo
espiritual e entrou em Vrndavana como um vaqueirinho. Vendo Seu servo há muito perdido, Krishna abraçou-o e ambos
desmaiaram de êxtase.
INVOCAÇÄO
amnayah praha tattvam harim iha
paramam sarva-shaktim rasabdhim
tad bhinnamshams ca jivan prakrti-
kavalitan tad vimuktamsh ca bhavat
bhedabheda-prakasham sakalam api
hareh sadhanam shuddha-bhaktim
sadhyam tat pritim evety upadishati
harir-gauracandro bhaje tam
Aqui, num só verso,
Bhaktivinoda Thakura forneceu a própria essência da filosofia Gaudiya
Vaisnava. Ele diz: "Näo estamos interessados na
opiniäo de qualquer pessoa comum:
näo há valor em qualquer opiniäo além do que é verdade revelada (amnaya). Amnaya significa verdade
revelada ou escritura que está vindo de uma fonte confiável: o guru-parampara,
uma genuína sucessäo de gurus.
E o que dizem? Eles enumeram estes fatos: Hari é o todo de tudo (harim iha paramam). Qual é a natureza Dele? Ele é o mestre de todas potências (sarva-shaktim). E Ele mesmo é o oceano da rasa, êxtase (rasabdhim).
E a alma jiva näo é parte direta Dele, mas uma
parte de Sua potência (tad bhinnamshams
ca jivan). Näo uma porçäo
plenária (shvamsha), mas uma porçäo
parcial (vibhinnamsha). Tudo é parte de Hari, porém shvamsha significa um avatara e vibhinnamsha significa uma parte de Sua potência, tatastha-shakti. E por natureza, algumas almas estäo
absortas na potência externa, e encontramos algumas no colo da potência interna
(prakrti kavalitan tad vimuktams ca
bhavat). Por sua própria
existência, algumas almas estäo dentro da svarupa-shakti. Algumas almas säo liberadas e algumas
näo liberadas (mukta e amukta). Tudo é uma parte de Hari e tem algo em comum com Ele e algo
diferente (bhedabheda-prakasham sakalam
api hareh). E o único meio de
alcança-Lo é devoçäo pura, devoçäo exclusiva (sadhanam shuddha-bhaktim).
O próprio Hari, na forma de Gaurachandra, está dando a compreensäo de
que o amor divino é a meta mais elevada da vida (sadhyam tat pritim evety upadishati harir-gauracandro bhaje tam)
* * *
BRHAD-BHAGAVATAMRTA
Porque te afastaste?
Porque estiveste vivendo longe do lar por tanto tempo? Como foi possível para ti? Como suportaste a separaçäo de
Mim? Tu Me deixaste e estiveste
passando vida após vida sem Mim?
Todavia sei do esforço que empreendeste para retornar a Mim. Buscaste por Mim em todo lugar, e foste
mendigar de casa em casa, e foste repreendido por muitos, ridicularizado por
muitos, e derramaste lágrimas por Mim.
Sei de todas essas coisas.
Eu estava contigo. E agora,
após grande dificuldade, novamente retornaste para Mim."
INTRODUÇÄO
A Busca Amorosa do Senhor pelos Seus Servos Perdidos: Grande intensidade se expressa aqui, de maneira
simples. É uma busca louca - uma
campanha urgente. Com grande
sinceridade Krishna vem para salvar Seus servos perdidos. Krishna vem para nos levar para casa.
No Brhad-Bhagatamrta, está escrito que uma vez, enquanto Krishna e as
vacas estavam retornando da
floresta de Vrndavana ao final do dia, um menino acabava de alcançar a
emancipaçäo espiritual e entrou em Vrndavana como um vaqueirinho (sakhya rasa). Vendo Seu servo há muito perdido, Krishna abraçou-o e ambos
desmaiaram de êxtase.
Todos outros vaqueirinhos
amigos de Krishna ficaram espantados, pensando: "O que é isso?
Krishna perdeu Seus sentidos por abraçar um novato? Como isso é possível!" Entäo, todos os vaqueirinhos
presenciaram atônitos, que Balarama veio ao socorro de Krishna e de alguma
forma conseguiu acordá-Lo.
Entäo Krishna se dirigiu a
Seu amigo com grande afeiçäo:
"Porque te afastaste?
Porque estiveste vivendo longe do lar por tanto tempo? Como foi possível para ti? Como suportaste a separaçäo de
Mim? Tu Me deixaste e estiveste
passando vida após vida sem Mim?
Todavia sei do esforço que empreendeste para retornar a Mim. Buscaste por Mim em todo lugar, e foste
mendigar de casa em casa, e foste repreendido por muitos, ridicularizado por
muitos, e derramaste lágrimas por Mim.
Sei de todas essas coisas.
Eu estava contigo. E agora,
após grande dificuldade, novamente retornaste para Mim." Dessa maneira, Krishna dirigiu-se a Seu
servo há muito perdido e o acolheu dando boas-vindas. E quando Krishna retornou à casa, levou o novato junto
Consigo para tomar prasadam. Desse modo, um novo recruta é recebido
sinceramente pelo próprio Krishna.
Assim a busca do Senhor por
Seus servos perdidos é uma busca amorosa; näo é comum, mas sim do coraçäo. E o coraçäo do Senhor näo é um coraçäo
comum. Quem pode avaliar qual o
tipo de busca na qual Ele está ocupado?
Embora Ele seja pleno em todos aspectos, ainda assim sente as dores da
separaçäo de cada um de nós, por menores que sejamos. Apesar de Sua posiçäo suprema, Ele tem lugar para nós num
canto de Seu coraçäo amoroso. Essa
é natureza do infinito. Tal
autocrata absoluto, bem absoluto, é Krishna.
Um autocrata näo está sob a
Lei. Näo é que se Krishna Se der
para um, outro ficará carente. O
infinito näo é assim; em vez disso, há um infinito suprimento a Seu comando. Portanto Ele é o empório de rasa (akhila-rasamrta-murtih). E Ele está buscando por Seus servos
perdidos, para trazê-los ao lar.
Senäo näo temos
esperança. Nosso consolo, nosso
lenitivo na vida, é que afinal estamos sob os cuidados de um Senhor
amoroso. Os amigos de Krishna pensam: "Prá que ligar para outros? Temos Krishna, nosso amigo." Esse tipo de encorajamento interno,
esse encorajamento desesperado, vem de dentro. "Krishna está ali, Ele é nosso amigo. Para o quê ligamos? Podemos tomar veneno, podemos pular na
cabeça daquela grande serpente Kaliya, podemos fazer qualquer coisa. Com Krishna por trás da gente, para que
ligarmos?" Esse sentimento é
expressado por Bhaktivinoda Thakura em seu Sharanagati.
raksa koribo tuhum nishcaya jani
pana korobun hama yamuna pani
"Destemido e confiante
na Tua proteçäo, hei de beber as águas do Yamuna, quer estejam envenenadas ou
näo.
"Sou Tua
propriedade. Deves cuidar de mim;
näo podes abandonar-me."
kaliya-dokha korobi binasha
shodobhi
nadi-jala badobi asha
bhakativinoda tuwa gokula-dhana
rakhobi keshava! korato
janana
"Embora o veneno da
serpente Kaliya tenha envenenado as águas do Yamuna, sei que o veneno näo
atuará. Tua presença limpará as
águas e assim aumentará nossa confiança na Tua proteçäo. Bhaktivinoda agora é propriedade de
Gokula, Tua morada sagrada. ó
Keshava, bondosamente proteja-o com cuidado."
Como faremos para entrar
numa relaçäo amorosa assim com o Senhor?
Por meio da graça de Sri Gauranga.
Um devoto disse: "Se
Gauranga näo tivesse vindo, como poderíamos viver? E quem nos informaria sobre a perspectiva final da
vida?" Temos essa grande
perspectiva. E no entanto, sem
Gauranga, quem teria vindo nos informar de que temos tanta fortuna
internamente? E Sri Gauranga
diz: "Näo sabeis, mas tendes
essa grande magnitude de fortuna."
A vinda Dele para nos informar é como o astrólogo que lê o horóscopo de
um pobre e lhe diz: "Porque
estás vivendo esta vida pobre?
Tens imensa fortuna enterrada no solo. Tenta recuperá-la.
És täo grande e teu guardiäo é täo amoroso e täo elevado, e no entanto
estás vagando como um pobretäo na rua?
Que é isso! Näo és um
desamparado, näo é que näo tens um guardiäo. Apenas tens que lembrar de teu misericordioso
guardiäo."
No Srimad-Bhagavatam 11.5.32 onde se menciona o Kali-yuga avatara, encontramos evidência do advento de Sri
Chaitanya Mahaprabhu. Ali está
escrito:
krsna-varnam tvisha 'krsnam
sangopangastra-parshadam
yajnaih sankirtana-prayair
yajanti hi su-medhasah
"Na era de Kali,
pessoas de grande piedade e inteligência iräo adorar o Senhor como Sri
Chaitanya Mahaprabhu. Ele
aparecerá numa forma dourada cantando o nome de Krishna, acompanhado por Seus
associados e séquito."
E depois disso, há dois
outros versos sobre Sri Chaitanya Mahaprabhu:
dhyeyam sada paribhava-ghnam
abhishta-doham
trithaspadam
shiva-virinci-nutam sharanyam
bhrtyarti-ham pranata-pala
bhavabdhi-potam
vande maha-purusha te caranaravindam
O Srimad-Bhagavatam 11.5.33 explica aqui, que "aquela mesma
personalidade que veio como Ramachandra e Krishna novamente apareceu. Ele veio para nos dirigir na verdadeira
realizaçäo da vida. Ele está
atraindo o mais doce néctar lá do alto para todos. Meditem só Nele e todos problemas acabaräo. Ele purifica todos locais sagrados de peregrinaçäo
e grandes pessoas santas através de Seu toque e por meio de Seu sankirtana. Ele atrai para cá as coisas mais elevadas lá do plano mais
alto. E mesmo Brahma e Shiva,
confundidos por Sua nobre dádiva, começaräo a louvá-Lo. Eles aspiraräo ansiosamente por tomar
refúgio sob Seus pés de lótus, em rendiçäo. As dores de todos que vêm para serví-Lo seräo removidas, e
suas necessidades internas seräo realizadas. E Ele tomará conta daqueles que tomam refúgio Nele; eles
receberäo proteçäo bem como tudo que possam precisar. Nesse mundo no qual a mortalidade governa, onde estamos
continuamente experimentando as indesejáveis mudanças de repetidos nascimentos
e morte, nessa área onde ninguém quer viver, um grande navio virá por nossa
causa e nos levará para dentro, e carregará para longe dessa desagradável
posiçäo. Caiamos aos pés dessa
grande personalidade que veio para nos dar o mais elevado néctar."
tyaktva sudustyaja-surepsita
rajya-laksmim
dharmistha arya-vacasa yad agad aranyam
maya-mrgam dayitayepsitam anvadhavad
vande maha-purusha te caranaravindam
"ó Senhor Supremo,
deixaste a deusa da fortuna e sua grande opulência, que é muito difícil de
abandonar, e é buscada até mesmo pelos deuses. A fim de estabelecer perfeitamente os princípios da
religiäo, saíste para a floresta a fim de honrar a maldiçäo de um brahmana. Para salvar as almas pecaminosas que perseguem prazeres
ilusórios, procuras por elas e lhes concedes Teu serviço devocional. Ao mesmo tempo, estás ocupado numa
busca por Ti próprio, numa busca por Sri Krishna, a Realidade, o Belo."
Esse verso em geral se
aplica ao Senhor Ramachandra, que deixou Seu reino, e depois de ir para a
floresta com Sitadevi para cumprir com seus deveres designados por Seu pai,
perseguiu o maya-mrgam, veado
dourado. Srila Visvanatha
Chakravarti Thakura entretanto, mostra como esse verso também se aplica a Sri
Chaitanya Mahaprabhu. Ele diz que
a palavra maya-mrgam significa que Sri
Chaitanya Mahaprabhu corria atrás das almas que estäo envolvidas por maya ou a concepçäo equivocada. A palavra maya-mrgam, quando aplicada a Ramachandra, significa que Ele correu
atrás de Marici, que tomara a forma de um veado dourado. Quando aplicadas no caso de Sri
Chaitanya Mahaprabhu, as palavras maya-mrgam
anvadhavat significam "Ele perseguiu aquelas almas que estäo na ilusäo
a fim de salvá-las. Ele correu no
encalço das almas caídas como um salvador, para salvá-las da maya ou ilusäo."
Visvanatha Chakravarti
Thakura também deu outra interpretaçäo:
ele diz que dayitaya ipsitam
significa "é desejado pelo amado", isto é, a busca por Krishna. Dessa forma, ele identifica duas
qualidades no Chaitanya avatara: Ele alivia as almas caídas, e Ele busca
por Krishna no humor de Sua amada (dayitayepsitam
anvadhavat). Inspirado pelo
humor de dayita, Sua amada, Srimati
Radharani, Ele correu atrás das almas aprisionadas para salvá-las. Aqui encontramos a referência
escritural, a semente dessa concepçäo.
Ele está em busca das almas perdidas, absorvido numa procura amorosa por
Seus servos perdidos.
E por toda vida de Sri
Chaitanya Mahaprabhu e de Seu outro ser, Nityananda, é muito claro que Eles,
sendo Eles próprios a Suprema Entidade, estäo procurando pelas almas caídas
para salvá-las. Isto será a
espinha dorsal de nossa concepçäo da busca amorosa do Senhor por Seus servos
perdidos.
E também foi dito:
yada yada hi dharmasya
glanir bhavati bharata
abhyuthanam adharmasya
tadatmanam srjamyaham
paritranaya sadhunam
vinashaya ca dushkrtam
dharma-samsthapanarthaya
sambhavami yuge yuge
"Onde quer que haja
declínio na religiäo e a irreligiäo prevaleça, Eu apareço. A fim de proteger as pessoas santas e
punir os maus, bem como restabelecer os princípios religiosos, Eu apareço
milênio após milênio." Aqui
Krishna diz: "Eu venho aqui
de vez em quando para ajudar a reestabelecer as injunçöes escriturais, bem como
para acabar com os demoníacos."
Estas säo as referências das escrituras que descrevem como Krishna vem
em busca de Seus servos. Aceitando
estas declaraçöes como nosso ponto de partida, podemos ver que Ele está sempre
vindo a esse mundo para ajudar as almas caídas, Seus próprios servos.
Qual é a posiçäo das almas
caídas? No Sri Chaitanya-caritamrta, Srila Krsnadasa Kaviraja registra Sri
Chaitanya Mahaprabhu instruindo Sanatana Goswami:
jivera 'svarupa 'haya - krsnera 'nitya-dasa
krsnera
'tatastha-shakti
bhedabheda-prakasha
krsna bhuli sei jiva anadi-bahirmukha
ataeva maya tare deya samsara dukha
"A natureza
constitucional da alma jiva é de uma
serva eterna de Krishna; a alma jiva
é uma manifestaçäo da divindade que é una com Krishna e diferente Dele. As almas jivas säo a potência marginal do Senhor. Embora na realidade sejam servas de Krishna, desde tempos
imemoriais, elas tem se ocupado na concepçäo equivocada, como agentes
exploradores." A fim de
salvar Seus servos perdidos, o Senhor vem de vez em quando para levá-los de
volta para Seu próprio lar.
Em outras religiöes podemos
encontrar muitos messias vindo para auxiliar-nos a reencontrar nosso caminho de
volta para a consciência de Deus, a partir da consciência mundana. Entretanto embora vejamos essa
concepçäo em outros países e outras tradiçöes religiosas, na India a
encontramos de modo mui profuso e sistemático.
No Srimad-Bhagavatam 11.14.3 Krishna diz:
kalena nasta pralaye
vaniyam veda-samjnita
mayadau brahmane prokta
dharmo yasyam mad-atmakah
"Pela influência do
tempo, o som transcendental do conhecimento védico foi perdido na época da
devastaçäo. Novamente, na época da
criaçäo, Eu primeiro inspirei Brahma, o criador, de dentro de seu coraçäo. E entäo, através de Brahma, tantos
discípulos foram iluminados. Estes
por sua vez iluminaram seus discípulos.
E dessa maneira, a linhagem da verdade revelada descende de Mim."
E no Bhagavad-gita Krishna diz:
imam vivasvate yogam
proktavan aham avyayam
vivasvan manave praha
manur iksvakave'
bravit
evam parampara-praptam
imam rajarshayo viduh
sa kaleneha mahata
yogo nastah parantapa
"Primeiro, instruí o
deus do sol Surya nesse conhecimento, e de Surya foi passado para Manu, e de
Manu para Iksvaku; assim desde os primórdios do tempo, estou dando Meus
ensinamentos a outros, transmitindo a verdade de que Eu sou a meta por meio
dessa sucessäo discipular, geraçäo após geraçäo."
Dessa maneira, Krishna
aparece repetidamente para reinvindicar Seus servos desde muito perdidos. E, como Sri Chaitanya Mahaprabhu,
Krishna também está provando Sua própria doçura. Quando deseja distribuí-la aos devotos, a causa é Sua
potência extática (hladini-shakti). Quando Krishna Se combina com Sua
potência como Sri Chaitanya Mahaprabhu, Ele Se torna o acharya. Assim Krishna
diz: acharyam mam vijaniyan:
"Saibam que Eu sou o acharya". Sua acharya-lila
é Sua auto-distribuiçäo, e através disso Ele está levando Seus servos perdidos
para casa. Sua forma de recrutar é
distribuir conhecimento sobre Si mesmo e devoçäo por Si próprio, e entäo
levá-los ao lar.
Em Vrndavana, Krishna está
saboreando rasa dentro de Seu próprio
círculo, e em Navadvipa, como Sri Gauranga e Seu grupo, Ele está saboreando a
Si próprio e distribuindo o sabor para outros. Sua distribuiçäo e recrutamento säo uma e mesma coisa. Distribuindo a Si mesmo, Ele está
atraindo nossos coraçöes para Ele, levando-nos para o lar. A auto-distribuiçäo do Absoluto
destina-se a atrair-nos de volta para casa, de volta para Deus, e desta
maneira, o Senhor está eternamente ocupado em Sua busca amorosa por Seus servos
perdidos.
* * *
A GRADAÇÄO
Assim como no mundo tangível existe o sol, a lua, e tantos outros
planetas, no mundo da fé há uma gradaçäo de sistemas planetários. Temos que examinar cuidadosamente as
escrituras, aproveitar da orientaçäo dada por santos e entender como o
progresso da fé até o plano mais elevado é alcançado por eliminar planos
inferiores.
* * *
PLANETAS DA FÉ
Fé é o único meio pelo qual
podemos ver, ouvir ou sentir o mundo superior; senäo fica tudo sem sentido para
nós. Para entender aquele plano, é
necessário um despertar interno.
Podemos conectar com o mundo superior apenas através de uma fonte mais
elevada. Por isso divyam jnanam, conhecimento do plano
superior, näo é conhecimento comum; é transcendental, sentimento e sentido
supramental.
Mas para perceber isso, a
rendiçäo é compulsória. Depois
disso, poderemos continuar a ouvir e cantar, lembrar e adorar e louvar o
Senhor, ou prestar tantos outros tipos de serviço, mas a primeira coisa - o fundamento
da devoçäo - deve ser auto-rendiçäo.
Senäo nada se efetuará; nossa demonstraçäo de devoçäo será tudo
imitaçäo.
Devemos sentir
sinceramente: "Serei fiel em
meu serviço ao Senhor Supremo.
Destino-me a Ele. Estou
pronto para morrer a fim de viver.
Quero viver para Ele apenas e näo para realizar qualquer interesse
separado. Näo quero nada menos que
o absoluto. Quero ser todo
Dele." Este tipo de
intensidade é uma necessidade indispensável para um devoto. Um devoto tem que conceber, sentir, que
se destina a Krishna. Ele näo é
uma entidade independente; ele depende de Krishna - o mais elevado centro
absoluto - e nada mais.
Identificar-nos com nossa
família, sociedade ou país é egoísmo estendido, contudo toda falsa
identificaçäo deve ser eliminada.
Temos que ser nem egoístas nem enredados em egoísmo extrapolado. Em vez disso, toda sorte de
contaminaçäo externa deve ser eliminada de nossa concepçäo do eu. Todas demandas exteriores devem ser
canceladas. Entäo sentiremos na
intimidade de nossos coraçöes que estamos conectados com todo o infinito, o
absoluto.
E nada externo é necessário
para nosso sucesso. A única coisa
que se pede da nossa parte é que desmantelemos a cobertura do ego. O ego está acumulando alguns elementos
externos, mas essa caixa coletora externa tem que ser dissolvida - destruída -
e entäo, no âmago de nossos coraçöes, encontraremos nossa conecçäo com o plano
fundamental de serviço amoroso ao todo orgânico.
Tanto o gozo como a renúncia
säo abnormais. Säo dois tipos de
demônios: desfrute ou exploraçäo,
e eterno descanso ou renúncia.
Estas duas tendências säo nossas inimigas. Uma vida positiva mais elevada só é possível quando nos
tornamos totalmente independentes tanto da exploraçäo quanto da renúncia.
Tudo nos auxiliará se
conseguirmos ver em conecçäo com o centro. Por outro lado, o tipo de renúncia exclusiva praticada pelos
shankaritas e budistas näo é recomendada por nossa linha. Estamos interessados em harmonizar as
coisas de modo que tudo nos lembre de nosso dever para com o absoluto, e nos
encoraje a nos dedicar a Ele.
prapancikataya buddhya
hari-sambandhi-vastunah
mumukshubhih parityago
vairagyam phalgu kathyate
anasaktasya visayan
yatharham upanyunjatah
nirbandhah krsna-sambandhe
yuktam vairagyam ucyate
(Bhakti-rasamrta-sindhu)
Negligenciar o
meio-ambiente, pensando que está cheio de coisas materiais indesejáveis, näo
nos auxiliará. Isso näo é
correto. Tudo dentro do
meio-ambiente deve nos lembrar do absoluto. Nesse espírito devemos nos movimentar, pensando: "Aceite e conecte-me com o serviço
de nosso Senhor." Quando o
meio-ambiente é visto com a visäo correta, tudo ajudará a encorajar e
incitar-nos em nosso serviço ao centro.
Estamos vivendo num todo orgânico, um sistema. E esse sistema é composto de proprietário e propriedade, o
possuidor da potência e os diferentes tipos de potências (shakti-shaktiman).
EMPORIO DE RASA
A potência do Senhor é
dinâmica, e esse dinamismo está sempre produzindo rasa ou o sabor do êxtase.
A lila inteira está produzindo
êxtase (anandam, rasam). O próprio Krishna é o empório de rasa (akhila rasamrta murtih... anan-damaya
vilasa). Movimento dinâmico é
uma necessidade em Sua lila; näo pode
ser eliminado. E esse movimento
está sempre produzindo um novo êxtase que alimenta cada átomo do mundo
espiritual. Nessa morada
transcendental, Krishna é o centro que atrai tudo e provoca rasa e anandam, êxtase e júbilo dentro de tudo. Essa é a natureza do movimento do absoluto. Näo é extático, mas dinâmico - cheio de
movimento. E esse movimento é prati-padam-purnamrtasvadanam: a cada ponto, a cada passo, produz um
novo tipo de alegria que é infinita.
Näo é a velha e estéril alegria que encontramos por aqui.
Essa é a devida concepçäo do
absoluto. O todo orgânico, que
está sempre trabalhando e movendo, é pleno, e sua plenitude é sempre nova. Näo está parado ou estático. Move-se de tal maneira que a cada
segundo, cada minuto, está sempre produzindo júbilo novo, desconhecido,
infinito. E podemos adquirir esse
júbilo apenas pagando o mais alto preço:
auto-sacrifício. Esse
bilhete é muito valioso, pode conseguir nosso ingresso no plano do júbilo
automaticamente movimentado, que é sempre novo a cada segundo. E o bilhete é o auto-sacrifício
integral.
Esse sacrifício é jubiloso,
e pode-se provar desse maravilhoso júbilo até mesmo aqui nesse mundo, onde a
cada momento tudo está morrendo. É
dar e tomar. Se quisermos obter
algo nobre, devemos também dar.
Temos que ser generosos em nossa dedicaçäo, e entäo receberemos
amplamente daquele lado.
Auto-sacrifício integral é o preço, e em troca, seremos abarrotados de
êxtase: anandam budhi-vardanam.
Sentiremos que estamos em meio a um oceano de júbilo. No presente, estamos procurando um
sentimento jubiloso - tal como quem procura por um copo d'água no meio do
deserto. Porém pela dedicaçäo,
descobriremos que estamos num oceano de júbilo cuja doçura suavizante está
aumentando a cada momento.
A qualidade do júbilo possui
variedade, e vem para nos auxiliar em nossa atitude de servir, de modo que a
cada momento poderemos sentir novo encorajamento. Assim temos que indagar do devido agente, seguir seu
conselho, e tentar entender como melhorar nossa condiçäo. Ao mesmo tempo, devemos estar
conscientes de que a chance que temos de prestar serviço devocional se encontra
raramente. Näo é muito
barato. Portanto, temos que
utilizar cada minuto, cada segundo, cada momento. Devemos estar muito alertas para näo perder sequer um
momento, para que nossa tentativa de nos dedicar possa continuar constantemente
sem ser interrompida. Esse estágio
de dedicaçäo se chama nistha, e
quando alcançamos esse estágio, nosso paladar melhora mais e seremos mais e
mais encorajados a ir adiante e fazer progresso rumo à realizaçäo máxima.
SETE DIAS PARA VIVER
Sukadeva Goswami disse para
Pariksit Maharaja que sete dias de longevidade é suficiente para obter a
perfeiçäo. Ele disse: "Restam-lhe apenas sete dias de
vida; acha que é pouco tempo? É
tempo suficiente. O que é de
importância máxima é a devida utilizaçäo de cada segundo." Quanto tempo temos em nossas mäos é
incerto, mas temos que tentar o melhor que pudermos, utilizar corretamente cada
segundo. Isso näo deve ser
negligenciado. Näo devemos pensar:
"O futuro está diante de mim; qualquer hora que eu queira, posso me ocupar
no vantajoso assunto da vida espiritual." Näo se deve perder um segundo. Longfellow escreveu:
Näo confia em nenhum futuro,
por mais agradável que seja!
Que o Passado morto enterre
seus mortos!
Age, - age, no Presente
vivo!
Com o coraçäo dentro, e Deus
acima!
O Presente está em nossas
mäos. Näo sabemos sobre o
futuro. Temos que tentar usar o
tempo disponível da melhor maneira.
E como nosso tempo poderá ser melhor utilizado? Na associaçäo de santos e escrituras.
A pureza deve ser medida
pela unidade do sacrifício. E näo
o sacrifício a qualquer interesse parcial, mas sacrifício ao todo. O todo absoluto foi nos mostrado como
sendo o empório de rasa (akhila rasamrta
murtih) - o bem absoluto, o autocrata, o desenhista e destinador de tudo
que vemos. Nosso ideal de
sacrifício deve ser täo alto que possamos abandonar até mesmo os resultados
correspondentes do sacrifício.
Auto-abnegaçäo, ou auto-rendiçäo, em geral é conhecido como atma-nivedanam. Contudo, atmaniksepa é uma palavra mais forte para rendiçäo. Significa: "jogar-se desesperadaamente ao infinito". Devemos ser desesperados no
auto-sacrifício. No
auto-sacrifício temos que ser muito cuidadosos para näo aspirar por um egoísmo
maior ou mais extenso, mas de rendermo-nos apenas ao centro. Sacrifício destina-se ao centro -
Krishna - que atrai todos.
Ao realizarmos essa posiçäo,
estamos interessados em duas coisas - conhecimento transcendental (sambandha), e os meios para alcançar a
meta (abhideya). Se realizarmos estes corretamente,
entäo a realizaçäo da meta máxima (prayojana)
virá automaticamente. Estaremos
muito conscientes do centro ao qual estamos dedicando tudo. O objeto de nossa realizaçäo (sambandha), e nossa dedicaçäo ou pureza
de propósito (abhidheya) - estas duas
coisas säo de importância máxima.
Isso pode ser entendido pelas escrituras e os santos. E se nos interessarmos pela meta mais
pura e o sacrifício mais elevado, a meta virá por si mesma. Näo devemos nos preocupar com qualquer
remuneraçäo. Só temos que fazer
nosso dever e a remuneraçäo virá.
A quem nos dedicaremos e o que iremos receber - essas coisas devem ser
discutidas, pensadas, meditadas, e colocadas em prática. Dessa maneira, devemos tentar viver no
infinito. Devemos sempre ficar ocupados
no cultivo do amor infinito e da beleza infinita conforme recomendado por Sri
Chaitanya Mahaprabhu.
OCEANO DE FÉ
Embora o objeto da fé de
nosso coraçäo seja infinito, ainda assim, algumas concepçöes Dele foram dadas
pelos homens com experiência no oceano da fé. No oceano da fé, muitos tiveram sua experiência especial, e isso
foi registrado nas escrituras.
Através disso podemos nos aproximar dos santos que se alçam como faróis
para nos auxiliar a cruzar o oceano de nesciedade. Mas tem que ser fidedigna e näo meramente uma criaçäo
misturada ou uma imitaçäo. Pode
ser possível também imitar a coisa verdadeira, pegando nossa experiência
mundana e introduzindo-a no mundo da fé.
Portanto devemos nos aproximar daquele plano com muito cuidado através
da linhagem dos santos confiáveis.
Devemos cuidar bem para
sabermos as qualificaçöes de um verdadeiro santo. Seus sintomas säo dados nas escrituras. E quem é um discípulo e qual deve ser
sua atitude. Todas essas coisas
estäo nas escrituras.
E a fé é requisito para se
trabalhar nesse substancial mundo consciente, que é subjetivo. Isso é a coisa mais importante que
temos de lembrar: o infinito é subjetivo.
Pode nos guiar e ser afetuoso para conosco. Devemos contar com todas essas coisas. Ele pode nos guiar. A verdade revelada repousa sobre este
fundamento: näo podemos nos
aproximar de Krishna pelo método ascendente, porém Ele pode descer até nosso
nível para dar-Se a conhecer.
Devemos entender este ponto muito fundamental e substancial: Ele pode vir até nós, e só pela fé é
que nós podemos chegar a Ele.
Shraddha - fé - é mais importante que a verdade calculista. O exemplo de grandes almas é mais
valioso para nós que nosso cálculo humano. A verdade externa, material, física näo tem muito valor. Em vez disso, é uma atitude falsa da
mente que é muito forte. Essa
verdade física näo deve receber mais respeito que as práticas intuitivas dos
devotos puros; mas sim, a intuiçäo de um devoto puro deve ter preferência aos
cálculos da verdade feitos por homens comuns.
Fé näo possui nenhuma
conecçäo com a assim chamada realidade desse mundo. É completamente independente. Há um mundo que é guiado apenas pela fé (shraddha-mayam-lokan). Fé é tudo ali, e é infinita e
oniabarcante. No mundo da fé, tudo
pode ser verdade pela doce vontade do Senhor. E aqui, na terra da morte, o cálculo é inconclusivo e
destrutivo em sua meta final; näo
tem nenhum valor no final das contas.
Deve ser rejeitado. O
conhecimento no qual os materialistas se encaixam, o cálculo falível das almas
exploradoras, näo tem nenhum valor.
Mas no mundo do infinito, a fé é o único padräo de acordo com o qual
tudo se movimenta.
svayam samuttirya sudustaram
dyuman
bhavarnavam bhimam adabhra-sauhrdah
bhavat padambhoruha-navam atra te
nidhaya yatah sad-anugraho bhavan
Srimad
Bhagavatam 10.2.31
Aqui, o Srimad-Bhagavatam diz que assim como no vasto oceano, quando nada
mais pode ser visto, o compasso é a única orientaçäo, também no mundo do
infinito, nossa única guia säo os passos daquelas grandes almas que viajaram no
caminho da fé. O caminho foi
marcado pelos santos passos daqueles que foram para o quadrante mais
elevado. Isso é nossa única
esperança. Yudhishthira Maharaja
também diz que o verdadeiro segredo está oculto no coraçäo dos santos, assim
como um tesouro se esconde numa misteriosa caverna (dharmasya tattvam nihitam guhayam). A larga linha que leva à verdade é demarcada por aqueles que
estäo indo para o mundo divino. E
isso é nossa guia mais segura.
Todos outros métodos de orientaçäo podem ser eliminados porque o cálculo
é falível.
Orientaçäo vem do absoluto
infinito. E a orientaçäo Dele pode
vir de qualquer forma, em qualquer lugar, a qualquer hora. Com esta larga visäo, devemos perceber
o significado de Vaikuntha.
Vaikuntha significa "sem limites". É como se estivessemos num barco flutuando num infinito
oceano. Muitas coisas podem vir
nos ajudar ou atrapalhar. Mas
somente nossa boa fé otimista poderá ser nossa guia, nosso gurudeva. O guia é Sri
Guru.
nr-deham adyam sulabham
sudurlabham
plavam sukalpam guru-karnadharam
mayanukulena nabhasvateritam
puman bhavabdhim na taret sa atma ha
Srimad-Bhagavatam 11.20.17
No infinito oceano embarcamos
em nosso pequeno barco, a forma humana de vida, e nosso destino é incerto e
inconcebível. Porém é concebível
para nosso gurudeva (guru karnadharam) Nosso guru é nosso guia - o capitäo do
barco. E nós temos que progredir
com fé sincera. Estamos tentando
atravessar um oceano horrível com grandes ondas e perigosos tubaröes e baleias
que engolem outras baleias. É
cheio de perigo. A orientaçäo de
santos é nossa única esperança.
Temos que depender deles.
Eles se alçam como faróis no infinito oceano para nos guiar à terra da
fé.
Fé significa "esperança
no infinito". Vaikuntha
significa "infinito". E shraddha significa "boa
fé". Assim como existe um
local chamado Cabo da Boa Esperança, shraddha
significa supercarregado de boa esperança no infinito. Vaikuntha é infinito, e se desejarmos
atrair a atençäo do infinito, o único caminho aberto a nós é shraddha.
Somente através de shraddha, podemos atrair o
infinito. E quando shraddha se desenvolve numa forma
definitiva, após progredir por bhava,
emoçäo extática, shraddha se torna prema - amor divino. Colombo partiu em viagem, e após longa
jornada, finalmente chegou na América; ele chegou na terra da boa
esperança. Da mesma maneira, com
esperança, shraddha, fé, podemos,
após atravessar Vaikuntha, chegar no local mais elevado do cosmos
espiritual. Shraddha é nossa luz na escuridäo.
Somente shraddha pode nos guiar quando somos viajantes no infinito. "Escutei que esse é o caminho para
aquele lugar" - esse espírito manterá nossos coraçöes vivificados. A definiçäo de shraddha é dada no Chaitanya-caritamrta: "Fé é a convicçäo firme de que por
servir Krishna, todos outros propósitos automaticamente säo
servidos." Nenhum risco,
nenhum ganho. Maior risco, maior ganho.
Krishna nos assegura:
"Eu estou em todo lugar - näo há nenhuma necessidade de ter
medo. Basta realizar que Eu sou
teu amigo. Sou o todo de tudo, e
tu és Meu. Acreditar nisso é teu
único bilhete para a jornada até a terra da fé."
A Verdade Absoluta, a
substância transcendental que é objeto de nossa indagaçäo através da fé, está
dotada de todo poder e toda consciência.
Ele é bondoso, benevolente, e doce. Seu poder é infinitamente superior ao nosso, e nós somos
infinitamente menores que Ele.
Nossa atitude deve ser que comparados a Ele, somos insignificantes.
Qual será entäo, o
verdadeiro sintoma de um discípulo?
Quem é um verdadeiro buscador da verdade? Qual é a qualificaçäo de quem está buscando pela verdade -
qual é sua atitude, sua natureza?
E qual será o sintoma do guru, o guia?
No Bhagavad-gita Sri Krishna diz:
tad viddhi pranipatena
pariprashnena sevaya
upadekshyanti te jnanam
jnaninas tattva-darshinah
"Pode-se aprender a
verdade somente aproximando-se submissamente e indagando daqueles que viram e
experimentaram a verdade. E por
render serviço a eles, nos tornamos iniciados no conhecimento
transcendental."
O que é preciso? Pranipat,
submissäo, e seva, serviço. Entäo a indagaçäo será fidedigna;
outrossim será uma transaçäo falsa:
poderá näo ter valor. Pode
ser tudo desperdício de energia.
Fé genuína näo nos permite acharmos que temos liberdade para fazer
qualquer coisa e tudo. Se for uma
transaçäo verdadeira, deve haver alguma orientaçäo superior. Assim shraddha, fé, é a coisa mais importante para um devoto.
Quando se desenvolve fé,
fazemos tudo para nos aproximar do reino subjetivo superior. Quem tem fé quer conectar-se com essa
substância superior, composta de eternidade, conhecimento e êxtase. A fé se
movimenta considerando a existência, conhecimento e amor. E quando estes três pontos principais
säo realizados, nossa existência se satisfaz plenamente. A fé nos solicita para nos aproximarmos
do mundo superior, näo do inferior.
E pensar: "De todas
maneiras Krishna é superior. Ele é
nosso guardiäo e bem-querente", é a base da fé.
Os racionalistas estäo
sempre procurando com seus cérebros científicos por diferentes maneiras de
utilizar e comandar as coisas que descobriram em sua pesquisa. Porém a fé lida com uma substância bem
superior em todos respeitos, que o próprio buscador. Quem é um indagante quanto a uma substância superior deve
inquirir com o que em geral conhecemos por fé.
A devida orientaçäo na fé
também é necessária, e esta é dada pelo plano superior. Essa deve ser a atitude de nossa
indagaçäo ou busca, se for para termos sucesso. Portanto o Bhagavad-gita
aconselha: pranipat, pariprashna, sevaya - Rendam-se, indaguem, e
sirvam." Nos Upanishads é dito:
tad vijnarnartham sa gurum evabhigacchet
samit panih shrotriyam brahma-nishtham
"Para compreender o
Absoluto, devemos nos aproximar de um guru que está fixo no conhecimento
espiritual e é bem versado nas escrituras. E devemos aproximar-nos do guru estando preparados para
sacrifícios." Essa é a
instruçäo geral dos Upanishads.
O Srimad-Bhagavatam 11.3.21 também aconselha semelhantemente:
tasmad gurum prapadyeta
jijnasuh shreyah uttamam
shabde pare ca nishnatam
brahmany upashamashrayam
"Quem deseja buscar
seriamente por sua mais elevada perspectiva deve tomar completo refúgio de um
guru que tenha profundas realizaçöes do Senhor Supremo e do sentido interno das
escrituras. Tais mestres
espirituais deixaram de lado todas consideraçöes em favor da suprema
consideraçäo absoluta."
Devemos ficar muito atentos
a estas coisas. Devemos tentar
compreender através de auto-exame se estamos realmente nos aproximando da
divindade através da fé. Também
devemos tratar de garantir que nossa fé seja real. A fé correta e credulidade näo säo o mesmo. É preciso considerar se somos
buscadores fidedignos da verdadeira fé ou alguém cuja fé está adulterada. E há sintomas de verdadeira fé. Temos que consultar autoridades
superiores para nos guiar, porque fé é uma coisa de muita importância.
Se estamos buscando pela
verdade, estamos insatisfeitos com nossa presente aquisiçäo. Estamos aceitando um risco para
lançarmo-nos a uma perspectiva superior.
Portanto temos que aceitar orientaçäo cuidadosamente. Temos que estar atentos ao máximo
possível. Dizem-nos que nossa
atual razäo näo é suficiente para nos ajudar; que mais que a razäo, é preciso shraddha, e esta também possui seus
sintomas. Ainda assim, aplicaremos
nossa razäo o máximo possível.
Inicialmente quando vim para
a missäo, pensei: "As
verdades transcendentais que ouço desses devotos näo entram dentro do âmbito da
inteligência mundana, contudo quando eu quiser me atirar nessa associaçäo,
empregarei minha razäo e intelecto ao máximo possível, entendendo que vou
atirar-me em algo que está além de meu controle, além de meus cálculos. Assim devemos cuidadosamente
compreender o que é shraddha, com a
orientaçäo de santos, escrituras, e gurus.
É claro, mesmo se estivermos
indo pelo caminho certo, nunca é certo que o caminho será livre de
obstáculos. Mesmo se estamos
fazendo progresso, inesperados obstáculos poderäo perturbar-nos e atrasar nosso
avanço. Embora vejamos muitos ao
nosso redor caindo ou batendo em retirada, devemos ir adiante. Devemos ter a convicçäo de pensar que
embora muitos iniciaram na senda conosco e agora estäo retrocedendo, nós vamos
ter que continuar. Vamos ter que
fortalecer nossa energia e seguir adiante - sozinhos caso necessário. Nossa fé deve ser täo forte que
tenhamos a convicçäo de seguir adiante sozinhos caso necessário e pela graça do
Senhor atravessar quaisquer dificuldades que encontrarmos em nosso caminho. Dessa maneira devemos tornarmo-nos
aptos. Devemos desenvolver devoçäo
exclusiva. É claro, sempre
tentaremos encontrar boa associaçäo.
Contudo às vezes poderá parecer que näo há associaçäo, que estamos sozinhos. Mesmo assim, devemos seguir adiante e
buscar o farol da verdade.
Progresso significa eliminar
uma coisa e aceitar outra.
Entretanto devemos ter capacidade de ver que há tantos outros que podem
nos ajudar em nosso progresso na linha da dedicaçäo; devemos seguir adiante com
nossos olhos abertos. E as
escrituras descrevem muitos níveis que teremos de atravessar em nosso
progresso. Por eliminaçäo, a senda
do progresso é mostrada de Brahma a Shiva até Lakshmi. Afinal se mostra que Uddhava é superior
a todos. Mas a opiniäo dele é que
as gopis säo as mais elevadas
devotas. Isso é confirmado por
Rupa Goswami:
karmibhyah parito hareh priyataya
vyaktim yayur jnaninas
tebhyo jnana-vimukta-bhakti-paramah
premaika-nishthas tatah
tebhyas tah pashu-pala-pankaja-drshas
tabhyo 'pi sa radhika
preshtha tadvad iyam tadiya-sarasi
tam nashrayet kah krti
- Sri Upadeshamrta (10)
"Existem aqueles no
mundo que regulam sua tendência à exploraçäo de acordo com as regras
escriturais e assim buscam gradual elevaçäo ao domínio espiritual. Contudo, säo superiores a estes, os
sábios que, abandonando a tendência de dominar os outros, tentam mergulhar
fundo no reino da consciência.
Porém bem superior a estes, säo os devotos puros que estäo livres de
quaisquer ambiçöes mundanas e estäo liberados do conhecimento, näo pelo
conhecimento, tendo alcançado o amor divino. Eles conseguiram ingressar na terra da dedicaçäo e estäo
espontaneamente ocupados ali no serviço amoroso do Senhor. Entre todos devotos, entretanto, as gopis säo as mais elevadas, pois elas
deixaram todos, inclusive suas famílias, e tudo, inclusive as escrituras dos
Vedas, e tomaram refúgio completo aos pés de lótus de Krishna, aceitando-O como
sua única proteçäo. Mas entre
todas gopis, Srimati Radharani reina
suprema. Pois Krishna deixou a
companhia de milhöes de gopis durante
a dança da rasa para procurar somente
por Ela. Ela é täo querida por Sri
Krishna que a lagoa na qual Ela Se banha é o local favorito Dele. Quem, além de um louco, näo aspiraria a
prestar serviço, sob o refúgio de devotos superiores, nos mais exaltado de
todos locais sagrados?"
APROFUNDA-TE, ELEVA-TE
Em Suas conversas com
Ramananda Raya, Sri Chaitanya Mahaprabhu disse repetidamente eho bahya, age kaha ara. Aprofunda-te, eleva-te! Existem tantos que consideram sua
posiçäo como sendo a mais elevada, e que chegando a certo estágio, param por
ali. Mas descobrimos no Brhad-Bhagavatamrtam de Sanatana Goswami,
que Gopa-kumara, começando desde o mais baixo estágio de devoçäo, gradualmente
progrediu através dos diferentes níveis, e afinal chegou à concepçäo Krishna na
doçura da amizade - sakhya rasa. Ali se descreve como ele gradualmente
elimina um estágio e continua a progredir até os estágios mais elevados de
devoçäo.
Conforme progride de um
nível ao seguinte, todos parecem ajudá-lo bastante, porém gradualmente, a
companhia deles parece-lhe tornar-se sem graça, ultrapassada. Nessa hora, uma chance mais elevada lhe
é dada através de um agente da divindade e, deixando aquele plano para trás,
ele vai para um plano novo e mais elevado. Dessa maneira, o progresso da dedicaçäo é mostrado no Brhad-Bhagavatamritam.
LUZ SUPERIOR
Assim como no mundo tangível
existe o sol, a lua, e tantos outros planetas, no mundo da fé existe uma
gradaçäo de sistemas planetários.
Temos que perscrutar as escrituras, aproveitar a orientaçäo dada pelos
santos, e entender como se consegue o progresso da fé até o plano mais elevado,
por eliminar os planos inferiores.
E sempre que houver alguma dúvida, devemos consultar algum agente mais
elevado a fim de fazermos progresso.
A realidade espiritual é a
existência eterna, completa consciência, e êxtase. A mera existência näo consegue nos realizar. Mesmo nosso sentimento e anseio
interior, consciência, näo é suficiente.
Precisamos de rasa e ananda, êxtase, para nos dar realizaçäo.
A realizaçäo espiritual
também é de tipos diferentes.
Temos que distinguir entre diferentes concepçöes espirituais, e nossas
escolhas melhoram conforme mergulhamos mais e mais fundo na realidade. Devemos morrer para viver. E a consideraçäo de morte também tem o
profundo, mais fundo e mais profundo.
A gradaçäo de mais elevado e inferior sempre está ali. Se for para progredirmos, deve haver
eliminaçäo e nova aceitaçäo.
Poderá acontecer de termos de deixar os deveres que estamos executando
por outros mais elevados.
Devemos progredir dessa
maneira, ao mesmo tempo sempre consultando os santos e escrituras. Ambos nos guiaräo no oceano da fé. Senäo o mundo espiritual fica
desconhecido e incognoscível. A
Verdade Absoluta é conhecida e cognoscível a determinada seçäo, e eles nos
deram direçäo. Se aproveitarmos
isto, entäo pela orientaçäo dos santos e escrituras gradualmente eliminaremos
nossas falhas.
Primeiro devemos eliminar
esta existência mortal. Depois,
devemos satisfazer nossa razäo, nossa consciência. E finalmente, devemos satisfazer nosso coraçäo. Sri Chaitanya Mahaprabhu diz que o
coraçäo é a coisa mais importante em nós.
Devemos seguir a direçäo do coraçäo. A mais alta realizaçäo é realizar o coraçäo, näo realizar a
consciência, ou obter existência eterna.
Existência eterna näo tem sentido se näo for consciente, e consciência
näo tem sentido se näo produzir alguma realizaçäo. Portanto sat,
existência eterna, cit, consciência,
e ananda, realizaçäo, êxtase, säo os
três princípios de nosso destino final.
E considerando-as como nossa meta, progrediremos mais e mais em nossa
vida espiritual.
No Manu-samhita está escrito que:
vidvadbhih sevitah sadbhir
nityam advesha-ragibhih
hrdayenabhyanujnato
yo dharmas tam nibhodhata
Podemos sentir em nosso
coraçäo se somos vencedores ou perdedores. Este aparelho identificador está em nós. Conforme progredimos em consciência de
Krishna, nosso karma, nossa conecçäo
com este mundo material, evaporará num átimo, e o conhecimento espacial virá
nos satisfazer. Nessa hora,
sentiremos o objeto de nossa vida em todos lugares (mayi drshte 'khilatmani)
Quando pudermos ver que a realizaçäo da vida nos abraçou, veremos que
tudo no meio-ambiente está nos auxiliando, tudo nos é simpático por todos os
lados. Nesse domínio espiritual,
todos teräo interesse em nos amar.
Poderemos ser negligentes quanto ao nosso próprio interesse, porém o
meio-ambiente lá é mais favorável e afetuoso para conosco do que possamos
avaliar, assim como uma criança näo consegue avaliar a extensäo da afeiçäo de
sua mäe. Dessa maneira, amigos e
confortos do lar nos cercaräo, e com esta realizaçäo iremos voltar para Deus,
retornar ao lar.
* * *
Devemos tentar procurar mais profundamente e entäo encontraremos nosso
amigo; se formos liberais em nossa atitude para com o meio-ambiente, näo
poderemos deixar de entrar em conecçäo com o plano que é realmente
liberal. Prahlada viu que Krishna
está em todo lugar. E a
consciência de Krishna está comandando o todo. Assim näo devemos nos permitir de ficarmos desencorajados
sob qualquer circunstância, por mais aguda que possa nos parecer
aparentemente. Krishna está
lá. Basta conseguirmos desenvolver
a visäo correta, e o rosto sorridente do Senhor irá surgir por trás da
tela. Krishna é lindo, e Ele está
esperando ansiosamente para aceitar nossos serviços.
O MEIO-AMBIENTE
Devoçäo a Krishna significa
sacrifício - "morrer para viver". Pela devoçäo a Krishna, toda nossa concepçäo de vida
mundana, auto-centrada, interessada em nós mesmos, acabará totalmente.
sarvopadhi-vinirmuktam
tat paratvena nirmalam
hrshikena hrshikesha-
sevanam bhaktir ucyate
- Narada Pancaratra
"Devoçäo pura é serviço
ao Senhor Supremo, livre de todas concepçöes relativas de auto-interesse."
Em seu Bhakti-rasamrta-sindhu, Srila Rupa Goswami cita este verso dos
antigos Puranas. Upadhi significa "todas
concepçöes relativas de auto-interesse". Devemos estar livres de todos upadhis.
E Rupa Goswami também nos dá
um verso paralelo descrevendo bhakti:
anyabhilashita-sunyam
jnana-karmady-anavrtam
anukulyena-krsnanu
shilanam
bhaktir uttama
Serviço devocional puro é o
cultivo favorável de consciência de Krishna livre de todos traços de motivos
ulteriores, tais como karma,
atividades auto-promotoras, jnana,
realizaçäo mental, e assim por diante." Bhakti, devoçäo,
deve estar livre de quaisquer desejos passageiros (anyabhilasa), tais como karma
- a tentativa organizada de se auto-elevar - e jnana, a tentativa de depender de nossa própria habilidade,
conhecimento, e consciência para alcançar a méta última. Tentar colocar nosso próprio eu como o
sujeito, tentarmos nos tornar juízes de nosso próprio destino - isto é jnana. Aqui adi significa
yoga e outras coisas externas.
Tudo isso säo coberturas externas (avrtam). Na alma propriamente dita, contudo, näo
se encontram estes elementos. A
alma é uma escrava eterna de Krishna (krsna-nitya-dasa).
Mahaprabhu disse: "Jivera 'svarupa haya - krsnera 'nitya dasa'. "Escravatura a Krishna é a
natureza inata da alma jiva."
A fim de realizar o
absoluto, devemos chegar ao estado de escravatura; nada menos que isso. Temos que nos submeter como escravos ao
jogo de Sua doce vontade.
Uma vez, o governo britânico
teve que receber o Shah da Pérsia, rei da Pérsia. Convidaram-no para a Inglaterra e tentaram agradá-lo de diversas
maneiras a fim de ganhar sua simpatia para que näo fosse convertido ao lado do
Czar Russo. Mostraram-lhe muitas
coisas, e em dado ponto, levaram-no a um local onde homens condenados à pena de
morte eram decapitados. Ali
mostraram ao Shah o local de execuçäo.
Explicaram-lhe como ali era o lugar onde tantos grandes homens,
inclusive até um rei, Carlos Primeiro, fôra decapitado. Quando mostraram esse lugar ao Rei da
Pérsia, ele perguntou: "Oh,
tragam alguém e decapitem-no!
Quero desfrutar de ver como era feito!"
Todos ficaram
espantados. "O que ele está
dizendo! Para o prazer dele, vamos
ter que assassinar um homem? Näo,"
disseram. "Näo podemos
permitir que um homem seja decapitado assim." O Shah disse:
"Ah, vocês näo entendem a posiçäo de um rei? Sou o Rei da Pérsia, e para minha
satisfaçäo vocês näo sacrificam uma vida humana? Isso é desonra.
De qualquer forma, se näo lhes é possível a vocês, fornecerei um de meus
próprios homens. Peguem um de meus
atendentes e mostrem-me como se executam pessoas aqui em seu país."
Com humildade, submeteram-se
a ele. "Sua Alteza, as leis
de nosso país näo podem permitir isso.
Pode ser feito em seu país, mas aqui, seus homens também näo podem ser
assassinados simplesmente para o prazer de um homem." O Shah respondeu: "Entäo vocês näo sabem o que é um
rei!"
Este é o significado de
escravatura: um escravo näo tem
posiçäo nenhuma; pela doce vontade de seu dono poderá ser sacrificado. É claro, no plano material inferior tais
coisas podem ser bastante abomináveis e impensáveis, mas devemos compreender
que no reino superior da divindade, em princípio, tal grau de sacrifício é
demonstrado pelos servos do Senhor.
A profundidade do amor deles é tal que estäo preparados para se sacrificar integralmente, a morrer
para viver, ao menor capricho ou satisfaçäo de Krishna. Mas devemos lembrar que seja qual for o
prazer Dele, Ele é o bem absoluto.
Portanto através de tal sacrifício näo morremos de fato, mas vivemos por
obter ingresso num plano superior de dedicaçäo.
No Srimad-Bhagavatam 7.5.23-24 está escrito:
shravanam kirtanam visnoh
smaranam pada-sevanam
arcanam vandanam dasyam
sakhyam atma-nivedanam
iti pumsarpita vishnau
bhaktis cen nava-lakshana
kriyeta bhagavaty addha
tan manye 'dhitam uttamam
"Ouvir, falar sobre, e
lembrar de Krishna, servir Seus pés de lótus, adorar Sua forma da Deidade, orar,
tornar-se Seu servo, cultivar Sua amizade, e render-se a Ele totalmente säo os
nove processos de devoçäo. Quem
cultiva esses nove processos de devoçäo, oferecendo-se completamente a Krishna,
pode facilmente alcançar a méta última da vida." Quais säo as formas de sadhana? Quais säo os meios de se obter krsna-bhakti? Como poderemos reavivar nosso amor inato por Krishna? Somos orientados para ouvir sobre Ele,
falar sobre Ele, meditar Nele, louvá-Lo e assim por diante.
Porém em seu comentário
sobre este verso, Sridhara Swami explicou que näo devemos antecipar qual
benefício advirá de sravanam-kirtanam,
ouvir ou falar ou pensar sobre Krishna.
Em vez disso devemos orar:
"Que qualquer serviço que eu faça possa chegar ao meu Senhor. Näo
sou a parte desfrutadora - Ele é o
único proprietário." Todas
essas funçöes (sravanam, kirtanam, etc.)
seräo consideradas devoçäo apenas se uma condiçäo for realizada; senäo poderäo
ser karma, jnana, yoga ou qualquer
outra coisa. Poderäo até ser vikarma, açöes equivocadas
poluídas. Deve haver uma condiçäo
ali para assegurar que todos essas diferentes formas de atividades devocionais
sejam de fato bhakti: nós somos propriedade Dele; näo somos
os proprietários de qualquer bem ou propriedade. Devemos pensar:
"Meu Senhor é o possuidor e sou Sua posse. Tudo é Sua propriedade."
Krishna diz aham hi sarva-yajnanam: "Sou o único desfrutador de toda
açäo." A dura realidade é que devoçäo näo é uma coisa barata. Serviço devocional puro, shuddha-bhakti, está acima de mukti, liberaçäo. Acima do plano negativo da liberaçäo,
do lado positivo, Ele é o único senhor.
Ele é o Senhor de tudo.
Ele é o Senhor da terra da
dedicaçäo. Devemos tentar obter um
visto de entrada para lá. Ali, a
doce vontade Dele é a única lei. É
muito fácil pronunciar a palavra "absoluto". Mas se for para penetrarmos o
significado da palavra, entäo deverá ser reconhecido que a doce vontade Dele é
o todo de tudo. Para conseguir um
visto para o mundo da realidade devemos reconhecer isso.
E isto é especialmente
verdade em Goloka, onde se exige rendiçäo completa. Em Vaikuntha há alguma consideraçäo quanto à justiça; para
aqueles que estäo ingressando ali, é permitido algum tipo de leniência. Porém Goloka é muito rígida. A rendiçäo completa é exigida naquele
local. Outrossim, a atmosfera ali
é muito livre. Depois que a pessoa
foi testada e os superiores estiverem satisfeitos de que as almas que ali
chegaram estäo totalmente sacrificadas, entäo ganhamos a confiança deles. E quando se verifica que estamos
plenamente rendidos, há total liberdade; pode-se fazer qualquer coisa.
AÇOITANDO KRISHNA
E a liberdade ali é täo
grande que a mäe de Krishna, Yasoda, está açoitando-O! Se indagarmos profundamente aonde
Yasoda está se apoiando, chegaremos ao plano do "morrer para
viver". Yasoda pode abraçar a
morte milhöes de vezes para remover uma gota de suor da testa de seu filho; ela
tem tanta afeiçäo por Krishna que está pronta para morrer um milhäo de vezes em
vez de achar o suor do trabalho na testa Dele. E essa consciência está por trás de tudo que ela faz. É por isso que ela tem tanta
independência ao ponto de poder açoitá-Lo. Tal é o jogo do absoluto.
Se tivermos uma idéia da
infinita amplitude e profundidade do absoluto, como poderemos valorizar qualquer
coisa aqui? Os Himalaias podem ser
muito grandes para o nosso padräo, porém para o padräo do infinito, os
Himalaias säo täo pequenos que nem sequer podem ser vistos. Esse mundo é todo relativo. Näo devemos nos permitir de sermos
intimidados por quaisquer eventos aqui.
Devemos seguir adiante em nossa marcha rumo à verdade. Poderemos falhar a qualquer momento, em
qualquer lugar; näo importa.
Poderá ser a vontade de nosso senhor. Ainda assim, näo temos outra alternativa senäo
esforçarmo-nos pela misericórdia Dele, a graça Dele.
Esta é nossa posiçäo
natural. Mesmo
constitucionalmente, näo há possibilidade de viver separados Dele. Se, em ignorância, às vezes pensamos
que é possível viver separados Dele, isso é insanidade temporária. Tentar fazer isto é apenas criar mais
perturbaçäo, encobrir-se de ignorância.
Enquanto estivermos
ignorantes, poderemos nos interessar por muitas coisas que näo tem valor. Mas na verdade é como numa peça
teatral: tantos participantes
estäo atuando - um tem que ganhar e outro ser derrotado - mas somos informados
de que devemos aceitar a vitória ou derrota no humor de um jogador. E tudo é a peça teatral de
Krishna. Ele está brincando com
Sua lila. Quando pensamos que algo é uma grande perda ou ganho, näo
estamos vendo a lila do Senhor. Entäo estamos fora do fluxo divino, näo
estamos em harmonia com o fluir da lila. Entäo parece que a realidade näo é a lila Dele, e achamos alguma outra razäo
de ser, ver alguns outros objetos, concebemos interesses relativos, e encontramos
perdas e ganhos, vitória e derrota, e tantos outros conceitos equivocados. Mas tudo é Sua lila, e isso é nirguna,
sem erro. Nesse plano, tudo está
certo. Tudo é perfeito. Cada polegada de movimento lá é
totalmente perfeita.
"VOU TE AMALDIÇOAR!"
Uma vez, após a guerra de
Kurukshetra, o brahmana Utanka veio
até Krishna e disse:
"Krishna, eu te amaldiçôo!" Krishna disse:
"Porque, Meu querido brahmana,
desejas amaldiçoar-Me?"
Utanka disse: "Porque
és a causa de todos desastres de Kurukshetra. Por Tua causa, tantas viúvas e órfäos estäo chorando em
sofrimento. A dor deles näo tem
limite, e Tu és a causa."
Krishna respondeu: "Pode ser que tenhas acumulado
algum poder através de tuas penitências em sattva-guna,
mas tudo isso acabará quando Me amaldiçoares. Näo irá produzir qualquer resultado sobre Mim porque estou
situado no plano nirguna." Esta é a natureza do plano nirguna. É ahaituky apratihata: é sem causa e näo pode ser impedido - é
irresistível. A onda do plano mais
fundamental é bhakti, devoçäo, onde
tudo segue a doce vontade do centro - nirguna. Esse fluxo divino é sem causa e nunca
conseguiremos nos opor a ele.
Devemos tentar nos apoiar naquele plano. Bhakti é nirguna, além da influência da natureza
material, e é ahaituki, sem causa -
esse fluxo divino está continuando eternamente. E é apratihata: bhakti
nunca poderá ser impedida por ninguém.
É irresistível.
Essa é a natureza do fluxo
da devoçäo. Qualquer um que se
colocar em consonância, em harmonia com esse fluxo, descobrirá a mesma
coisa: isso nunca pode ser
impedido e nem conseguiremos nos
opor com sucesso. Essa é a
natureza de bhakti segundo o Srimad-Bhagavatam 1.2.6:
sa vai pumsam paro dharmo
yato bhaktir adhoksaje
ahaituky
apratihata
yayatma suprasidati
Bhakti
é a funçäo mais elevada da alma (paro
dharmo). Nosso dever aqui tem
que ter sua origem no plano de bhakti;
temos de ser capazes de ler e pegar e utilizar este fluxo. Devemos dançar nas ondas desse
fluxo. O dever mais elevado de
todos será realizado com submissäo ao poder invisível, indetectável, causal,
que näo tem causa, ordem ou motivo.
É automático, eterno, e a ele nenhuma força pode se opor aqui.
E só entäo é que encontraremos
a maior satisfaçäo de nossa alma.
Sentiremos verdadeira satisfaçäo apenas quando entrarmos em contato com
aquela onda harmoniosa mais fundamental.
Entäo poderemos sentir o mais alto êxtase. Isso é bhakti.
Portanto, para chegarmos a
uma idéia täo grandiosa da vida, quaisquer obstáculos que tivermos de transpor
seräo apenas pequenas perdas e ganhos, vitórias e derrotas. Näo devemos permitir que perturbem
nossa marcha rumo à verdade.
BHAGAVAD-GITA
Krishna fala para Arjuna no Bhagavad-gita 2.47:
karmany evadhikaras te
ma phalesu kadacana
ma karma-phala-hetur bhur
ma te sango'stv akarmani
"Dê tua plena atençäo
ao cumprimento de teu dever e näo ao resultado de teu trabalho. O resultado está Comigo; toda
responsabilidade é Minha."
Cálculo superior é assim.
Os generais dizem:
"Marchem! Adiante.
Sigam adiante! Vocês säo meus
soldados; o que eu pedir, vocês tem que fazer. Vocês poderäo morrer e a vitória poderá vir depois; isso näo
lhes interessa. Vocês säo
soldados; muitos de vocês poderäo acabar-se, porém o país como um todo
lucrará." Dessa maneira,
tantas vidas importantes poderäo ser sacrificadas.
E como soldados, näo temos
direito de calcular se iremos ganhar ou perder a longo prazo. Existem duas coisas com as quais
devemos ter cuidado. Näo devemos
pensar que se näo podemos desfrutar dos frutos de nosso trabalho, entäo näo há
razäo para trabalhar. Ao mesmo
tempo, näo devemos pensar que temos que receber alguma parte dos frutos. Lembrando disso, devemos continuar
nosso dever para com Krishna. Isso
é devoçäo, e isso é o significado do Bhagavad-gita.
O Bhagavad-gita fala: "Näo podes modificar o meio-ambiente. Se desejas paz, tens que regular-te de
acordo com o meio-ambiente."
A essência toda do conselho do Bhagavad-gita
encontramos aqui: Tenta ajustar-te
ao meio-ambiente porque näo és senhor do meio-ambiente. Toda tua energia deve ser devotada a
regular-te e näo ao mundo exterior.
Esta é a chave para o sucesso na vida espiritual.
Bhakti
näo depende do meio-ambiente ou dos procedimentos dos outros. É ahaituky
apratihata. Nada pode
obscurecer esse fluxo exceto nosso ego.
Eu sou meu próprio maior inimigo.
uddhared atmanatmanam
natmanam avasadayet
atmaiva hy atmano bandhur
atmaiva ripur atmanah
"Podemos nos elevar ou
degradar. Somos nosso próprio
melhor amigo ou pior inimigo."
Nenhuma força externa pode nos deter se formos sinceros. É claro que para principiantes existe
algum interesse num meio-ambiente apropriado ao cultivo espiritual, mas até
isso também depende da natureza de sua sinceridade, ou sukrti: na hi kalyana-krt
kascid durgatim tata gacchati.
A garantia é dada aqui por Krishna. Ele diz:
"Estarei lá para cuidar de ti em qualquer circunstância
desfavorável. Sou onisciente. E também sou onipotente. Portanto se alguém se voltar para Mim,
Eu cuidarei dele." E isso
também tem sido verificado na história, nos casos de Dhruva, Prahlada, e tantos
outros. A sinceridade é
invencível. Mesmo obstáculos
melhoram nossa posiçäo se os pudermos aceitar da forma correta. De um ângulo de vista superior pode-se
ver que tudo está vindo para nos ajudar.
SRIMAD-BHAGAVATAM
tat te'nukampam susamikshamano
bhunjana evatma-krtam vipakam
hrd-vag-vapurbhir vidhadhan namas te
jiveta yo mukti-pade sa daya bhak
O Srimad-Bhagavatam 10.14.8 nos dá uma sugestäo mui esperançosa para
todos estágios de vida: culpe a si
mesmo e mais ninguém. Mantenha seu
apreço pelo Senhor, vendo tudo como graça Dele. No momento presente achamos nossa circunstâncias
indesejáveis porque näo agradam nosso gosto atual. Porém o remédio nem sempre pode se adequar ao gosto do
paciente. Ainda assim conduz à
saúde. Este verso é o tipo mais
elevado de regulaçäo dada no shastra. Se puderem seguir esta lei, entäo
dentro em breve teräo uma boa posiçäo.
Devemos ter muito cuidado de näo culpar as circunstâncias, mas de
apreciar Krishna por trás de tudo.
Krishna é meu melhor amigo; Ele está por trás de tudo. Tudo está passando pelo olhar atento
Dele. Portanto näo pode haver
defeito ali.
Mesmo Srimati Radharani
diz: "Ele näo tem culpa. Esta longa separaçäo de Krishna é o
resultado de Meu destino. Ele näo
deve ser culpado por isso."
Embora externamente todos adimitissem que Ele havia deixado as gopis cruelmente, Radharani näo está
preparada para culpar Krishna.
"Näo há nenhum mal Nele" pensa Ela. "Deve haver algo de errado em Mim que ocasionou esta
situaçäo desafortunada." A
competiçäo entre os grupos de gopis a
serviço de Krishna também é harmonizada deste modo por Radharani.
Krsnadasa Kaviraja Goswami
explicou esse ponto de muita importância.
Segundo ele, näo é que Radharani näo goste que outro grupo sirva Krishna
em competiçäo com Ela, mas Ela sente que eles näo conseguem satisfazer Krishna
tanto como Ela consegue. E disso
deve-se tomar nota cuidadosamente.
Ela sabe que eles näo conseguem proporcionar a devida satisfaçäo a
Krishna, portanto Ela näo pode apreciar que tentem tomar o lugar Dela. É essa Sua contenda. Ela pensa: "Se pudessem servir bem a Krishna e satisfazê-Lo
plenamente, Eu näo reclamaria. Mas
näo conseguem. E ainda assim,
agressivamente chegam para servir?
Näo posso tolerar isso."
O BRAHMANA LEPROSO
Kaviraja Goswami citou como
exemplo desse tipo de devoçäo, uma referência histórica dos Puranas. Havia uma vez uma esposa casta cujo marido brahmana era leproso. Ela sempre se esforçava o melhor que
podia para satisfazê-lo. Certo
dia, enquanto estava banhando seu marido num rio sagrado, ele ficou apaixonado
pela beleza extraordinária de uma prostituta chamada Lakshahira. Seu nome indicava que possuía o brilho
e a beleza de cem mil diamantes. O
brahmana leproso ficou
irresistivelmente encantado por ela.
Ao retornar à casa, sua
casta esposa detectou alguma insatisfaçäo no seu marido, e indagou: "Porque estás täo
infeliz?" Seu marido
replicou: "Senti uma atraçäo
pela beleza daquela prostituta. E
näo consigo tirá-la da minha mente."
"Oh, desejas
tê-la?"
"Sim, desejo."
"Entäo vou tentar fazer
um arranjo."
Entäo, porque era pobre, a
casta senhora, embora uma brahmana
qualificada, começou a ir para a casa da prostituta todo dia e trabalhar como
serva. Embora fosse de nascimento
aristocrático, aceitou trabalho de serva sem remuneraçäo. E cumpria seus deveres com tal diligência
que atraiu a atençäo da prostituta, a dona da casa, que começou a indagar: "Quem limpa tudo täo direitinho e
lindamente?" E ficou sabendo
que uma senhora brahmana estava vindo
todas manhäs e realizando tarefas domésticas. As outras atendentes disseram: "Tentamos pará-la, mas ela nem queria saber. Ela quer encontrar com a senhora."
A patroa retrucou: "Tudo bem. Amanhä, podem trazê-la a
mim." Entäo, na manhä
seguinte, quando foi levada diante da prostituta, a senhora brahmana expressou seu motivo
íntimo. "Meu marido está täo
atraído por ti que é meu desejo que possas satisfazê-lo. É meu interesse como sua esposa
devotada, que ele fique satisfeito, e esse é o desejo dele. Portanto quero vê-lo feliz." Entäo a prostituta entendeu tudo e disse: "Sim. Traga-o amanhä.
Convido ambos para jantarem em minha casa."
Isso foi comunicado ao brahmana e no dia seguinte ambos
vieram. Muitos pratos próprios à
ocasiäo foram preparados. Foram
servidas duas entradas. Uma era prasadam em folha de bananeira
acompanhada de água do Ganges num pote de barro - tudo alimento vegetariano
puro. Lado a lado, haviam potes de
ouro e prata com carnes e ricos pratos.
Foram servidos com um lindo arranjo de mesa e assentos. Dos dois tipos de alimentos, um era sattvik, puro, e o outro era rajasik, cheio de paixäo. Entäo, de mäos postas, a prostituta
convidou o brahmana e esposa e
indicou: "Esta é bhagavata-prasadam, e aqueles säo pratos
ricos preparados com carne. Pode
escolher o que sua doce vontade preferir."
Imediatamente o brahmana leproso escolheu a prasadam, e começou a tomar sua
refeiçäo. Depois que ele terminara
de tomar prasadam, a prostituta
disse: "Tua esposa é como
essa prasadam- sattvik - e todas
estas coisas rajasik - carne, pratos
ricos, ouro, prata - säo como eu.
Sou täo baixa e tua esposa é a mais pura das puras. Teu gosto real é por esta sattvik prasadam. Externamente, a carne é mui
deslumbrante, porém internamente é muito impura, imunda. E portanto sentiste repulsa por
ela. Entäo porque vieste a mim
aqui?"
Entäo o brahmana recobrou os sentidos. "Sim, estou equivocado. Deus enviou-me uma mensagem através de ti. Meu desejo passageiro acabou e agora
estou satisfeito. És minha
guru!"
Kaviraja Goswami citou isso
no Chaitanya-charitamrta. A casta senhora foi servir a
prostituta. Porque? Para a satisfaçäo de seu marido. Portanto Radharani diz: "Estou pronta a servir aqueles no
acampamento da oposiçäo, se conseguirem realmente satisfazer Meu Senhor. Estou completamente pronta para serví-los
se realmente conseguirem satisfazer Krishna. Mas näo conseguem.
Contudo mesmo assim fazem exigências. Mas nesse ponto Eu divirjo. Näo é que Me preocupo que Minha parte será diminuída. Näo é essa Minha atitude. Sempre que ocorrem situaçöes
desfavoráveis, fico achando que sempre estäo vindo de dentro de Mim (durdaiva vilasa); näo acho que nada
corrupto advenha de fora."
Essa deve ser a atitude de
um verdadeiro devoto de Krishna.
Com essa atitude, conseguiremos ver dentro de nós que tudo afinal é
parte do bem absoluto. Embora näo
seja muito fácil, ainda assim, nossa energia deve ser devotada somente para
coletar boa vontade de todas circunstâncias externas. Dessa maneira devemos cuidar para ver as coisas de tal modo
que purifique nossa própria posiçäo.
A VISÄO PROFUNDA DA REALIDADE
E assim, somos encorajados
pelo Srimad-Bhagavatam a buscar mais
profundamente. Temos que tentar
enxergar mais profundamente e entäo encontraremos nosso amigo; se formos
liberais em nossa atitude para com o meio-ambiente, näo poderemos deixar de
entrar em conecçäo com o plano que é realmente liberal. Isto é consciência de Krishna no seu
âmbito máximo. Se olharmos
profundamente para a realidade com este tipo de visäo, encontraremos nosso
verdadeiro lar. Prahlada
corajosamente encarou todas circunstâncias e afinal foi vitorioso. O cálculo do pai demoníaco de Prahlada
quanto ao ambiente era falsificado, mas a visäo mais profunda de Prahlada viu a
realidade corretamente.
Ele viu que Krishna estava
em todo lugar. E a consciência de
Krishna está comandando o todo.
Portanto näo devemos nos permitir de ficarmos desencorajados sob
quaisquer circunstâncias, por mais agudas que possam nos parecer. Krishna está ali. Por mais que as circunstâncias pareçam
se opor a nós, realmente näo é assim.
Basta conseguirmos desenvolver a visäo correta, e o rosto sorridente do
Senhor surgirá por detrás da
tela. Isso é consciência de
Krishna. Krishna é lindo, e Ele
está esperando ansiosamente para aceitar nossos serviços.
DEUS E SEUS HOMENS
Nossa riqueza interna só
pode ser descoberta com a ajuda de sadhu,
guru, e escrituras. Nossa visäo
deve ser que tudo é nectar, mas que puxamos uma tela entre o néctar e nós
mesmos e estamos provando veneno, pensando que é muito útil. Ao todo, devemos pensar que nenhuma
culpa cabe aos outros, e que de fato é a verdade. Somos responsáveis pela nossa desgraça, nossa condiçäo
caída. E a senda do
auto-aprimoramento também é similar:
devemos aprender a criticar a nós próprios e apreciar o meio-ambiente. Nossa apreciaçäo deve ser especialmente
por Krishna e Seus devotos, e depois gradualmente por todos mais. Ele näo deu autoridade a ninguém para
nos prejudicar. Se parece ser
assim, isto é apenas superficial e enganador. Que alguém possa lesar outro alguém é enganoso. Só é verdade no plano superficial. É claro que isso näo é desculpa para prejudicar
os outros ou ignorar a opressäo, mas desde o ponto de vista absoluto, näo
existe mal. Quando chegarmos ao
estágio mais elevado de devoçäo, veremos que tudo é amistoso e que nossa
apreensäo era errada. Era uma
concepçäo equivocada.
Concepçäo equivocada: maya
significa: "aquilo que näo
é" (mriyate anaya). Quando tudo é medido a partir do ponto
de vista do egoísmo e näo do interesse universal - isso é a causa de todos
nosso problemas. Devemos
gradualmente perceber: "Meu
ângulo de visäo era guiado por consideraçöes egoístas, näo absolutas. Portanto estou sofrendo. Mas agora acabei compreendendo que meu
interesse está incluído no interesse absoluto."
Parodiando um velho
ditado: "Um mau trabalhador
briga com suas ferramentas."
Conforme nosso karma,
produzimos nosso meio-ambiente. O
que estou culpando foi produzido pelo meu próprio karma. Quando me
alimento, o excremento vem como reaçäo natural. Seria tolo culpar o excremento por aparecer. Trata-se do efeito de ter comido. Do mesmo modo, agi de diferentes
maneiras, e o resultado karmico é meu
atual ambiente. Portanto brigar
com a reaçäo a nossos próprios atos equivocados é um desperdício inútil de
energia.
O conselho do Srimad-Bhagavatam deve ser nosso
princípio norteador sob todas circunstâncias. Tudo que vier a nós está sob sançäo Dele, sob o olhar Dele,
portanto só pode ser bom. Tudo é
perfeito. A única imperfeiçäo está
dentro de nós, e portanto devemos tentar com toda nossa energia realizar nosso
dever. Dentro em breve, nos acharemos
libertos de todos problemas. Isso
é o conselho chave do Srimad-Bhagavatam.
O OLHAR DE NOSSO GUARDIÄO
O meio-aambiente näo está
morto - existe ali um supervisor.
Assim como o sol está acima de nossas cabeças, toda açäo está sob o
olhar de nosso guardiäo. Esta
comparaçäo é dada no Rg Veda: Om tad vishno paramam padam sada
pashyanti suraya diviva cakshur atatam. Devemos nos aproximar de qualquer dever pensando: "O olhar de meu guardiäo está
sempre vigilantemente velando por mim, vendo tudo que estou fazendo, e tudo que
me acontece. Näo preciso
preocupar-me quanto a esse ambiente ou circunstância."
Portanto, o Bhagavatam diz: "Näo se preocupem com o
meio-ambiente. Façam seu
dever. Concentrem-se plenamene no
que estiverem fazendo, e dentro em breve, seräo aliviados da caixa preta do ego
e iräo unir-se ao fluxo universal de dançar e cantar, cântico e júbilo. Conseguiräo ingressar na lila ou passatempos do Senhor."
Estamos todos sofrendo de
interesse separado, conflito e reaçäo, bem e mal, prazer e dor, felicidade e
sofrimento, mas ali no domínio espiritual, tudo é consciente e cheio de
felicidade. Portanto näo só o
total auto-esquecimento é requisito, mas toda boa vontade do Senhor deve ser
convidada. Iremos nos fundir no
fluxo da boa vontade do Senhor.
Isso é Vrndavana.
Nossos guardiöes dizem: "Façam isso" e conforme nossa
capacidade iremos tentar executar a ordem deles. E aceitando que aquilo que dizem está realmente vindo de
Krishna, quanto mais formos capazes de seguir suas instruçöes, maior benefício
acumularemos. Srimad-Bhagavatam, Bhagavad-gita, os Vedas e Upanishad, e
tantos agentes que representam a divindade estäo todos nos auxiliando a
retornar ao nosso verdadeiro lar.
Atualmente estamos vivendo em diferentes estágios de consciência de
interesse separado, porém nossos guardiöes estäo todos tentando levar nos para
dentro daquele plano superior de movimento dinâmico, lila, para entrarmos nos passatempos de Krishna.
O EGO INIMIGO/EGO REAL
Aqui, tudo näo passa de um
reflexo do mundo perfeito.
Originalmente tudo está ali, inclusive todos tipos de serviço mas aqui
só temos um reflexo pervertido.
Deixando para trás este mundo variado, näo devemos tentar fundir-nos em
inconsciência de modo que näo sintamos nem prazer nem dor. Atualmente estamos sob influência de
nosso ego inimigo. O ego real
existe no mundo espiritual. Toda
experiência é encontrada ali, porém é cheia de beleza e charme.
A consciência de Krishna
significa teísmo plenamente desenvolvido.
Isso significa que temos um relacionamento com o infinito até a posiçäo
de amante. Tudo que precisamos
para auxiliar-nos e levar-nos na direçäo certa na realidade se encontra no
mundo espiritual em sua posiçäo mais pura e mais desejável. O que encontramos aqui é apenas uma
sombra, uma imitaçäo negra. Mas
realidade significa teísmo plenamente desenvolvido - consciência de Krishna -
onde o infinito abraça todo o finito.
O infinito desce para dar as boas-vindas, para abraçar plenamente o
finito - isso é Vrndavana. E isso
é teísmo plenamente desenvolvido:
através da consciência de Krishna, uma parte negligente do finito poderá
experimentar o abraço bem-aventurado de todo o infinito. E em Vrndavana, nem um canto é
negligenciado. Cada gräo de areia,
cada folha de grama, é bem representada ali com personalidade. Aqui, sem falarmos numa partícula de
areia, tantas coisas säo insignificantes.
Porém em Vrndavana, tudo é cuidado. Nada é ignorado.
Isso é teísmo plenamente desenvolvido. Isto é explicado no Srimad-Bhagavatam
10.21.5:
varhapidam nata-bara-vapuh
karnayoh karnikaram
bibrad vasah kanaka-kapisham
vaijayantin ca malam
randhran venoradhara-sudhaya
purayan gopavrndair
vrndaranyam sva-pada-ramanam
pravishad gita-kirtih
Sukadeva Goswami revela algo
espantoso a Pariksit Maharaja.
Quando Krishna entra na floresta de Vrndavana, pelo toque das solas de
Seus pés de lótus, a terra sente o prazer de Seu abraço - o abraço pessoal do
Doce Absoluto (vrndaranyam
sva-pada-ramanam). Isso é
inconcebível! Pelo toque dos
sagrados pés de Krishna, a areia e a terra sentem o prazer da posiçäo de
consorte! Glorificado por Seus
amigos vaqueiros, Ele entra na floresta de Vrndavana, e a terra, a floresta, e
tudo que entra em conecçäo com Ele sente uma experiência sensorial mais
elevada, mais próxima de prazer no grau mais feliz.
A POSIÇÄO DE CONSORTE
Em Vrndavana, a terra sente
o humor da posiçäo de consorte.
Assim a vrndavana-lila de
Krishna é täo maravilhosa que até mesmo Brahma, o criador do universo,
disse: "Como podemos
compreender-Te, meu Senhor? Sei
algo sobre meu Senhor Narayana, que me é próximo. Ele e eu temos alguma conecçäo direta para que eu possa
cumprir meus deveres oficiais. Mas
Tu entraste em meu círculo e näo consigo entender-Te. Que é isso?"
Ele se esforçou o melhor que pôde para testar Krishna raptando Seus
amigos vaqueirinhos e bezerros, porém ficou espantado ao descobrir que
"Embora os tenha removido, tudo continua como antes; Krishna ainda está
cercado por Seus amigos e seus bezerros, ocupados em seus passatempos
prazerosos. Portanto Ele é
infinito. Mesmo como senhor do
universo, minha interferência näo conseguiu desbaratar qualquer coisa sob o
controle Dele. Por Sua própria
doce vontade Ele conduz Sua encenaçäo.
Tentei testá-Lo, porém agora estou confuso por Sua potência inconcebível. Näo consegui compreender que embora
seja um menino vaqueirinho aparentemente humano, no entanto Ele é o mais
supremo, mais elevado até que o Senhor Narayana." Ele suplicou a Krishna: "Agora que recuperei os sentidos,
por favor perdoa-me, meu Senhor."
Que utilidade tem uma
partícula de nossa inteligência? O
quanto ela consegue medir do infinito?
Sri Chaitanya Mahaprabhu diz:
"Näo tente aplicar o cérebro ao infinito. O cérebro näo é um aparelho para medir naquele plano. Teu intelecto é cancelado pelo
infinito. Tente medí-lo somente
através do sentimento, do paladar, do coraçäo - o cérebro será teu
inimigo. Sempre irá enganar-te em
suas medidas, e isso te perturbará e limitará teu progresso."
Somente a fé pode nos
ajudar. Nada mais consegue
alcançar aquele plano. Podemos
alcançar o sol ou a lua somente com ajuda de tecnologia avançada. Näo podemos esticar a mäo e tocá-los
nem com ajuda de uma vara comprida.
Da mesma maneira, para conectar com a realidade superior, só a fé pode
auxiliar a pessoa. A fé é o meio
mais espaçoso. Mas até esta é
muito parca quando considerada em vista daquela coisa elevada com a qual
gostaríamos de conectar, a causa suprema de todas causas.
Somos almas ínfimas. Quanto conseguimos acomodar com nossa
fé? Quäo extensa e ampla é nossa
fé? O que conseguimos captar com
nossa fé? O que estamos buscando é
infinito, e estamos muito temerosos:
"Oh, se eu confiar na fé, algo poderá dar errado. Poderei ser iludido." Mas com nossos ínfimos coraçöes, quanto
fé conseguimos conter? Só por
analogia com o céu ou o oceano é que poderemos compreender qualquer coisa sobre
o infinito, mas o que é isso em comparaçäo? Nada.
E o que é o infinito? Aquilo do qual tudo está provindo,
através do que tudo é mantido, e no qual tudo afinal entra; o oni-compreensivo,
onipenetrante, onicontrolante, oniatraente, onisentiente Absoluto.
Assim tudo está certo com o
infinito e o ambiente. Temos
apenas que nos corrigir, nos ajustar.
Esta é a conclusäo - "Tenta ajustar-te; tudo está certo com o meio-ambiente. Devemos deixar tudo para o Senhor
Supremo e nos conduzir de acordo."
Isso nos trará real paz e realizaçäo progressiva na vida espiritual.
* * *
Nem a existência nem a consciência säo em si completas. A consciência por si só anela pelo
êxtase. E existência sem
consciência é existir sem nenhum propósito. Mas quando a existência é dotada de consciência, pode buscar
pelo seu próprio bem: êxtase.
VISHNU PADAM
Os pés divinos de nosso
sagrado Senhor säo como o olho vigilante de um grandioso guardiäo suspenso
sobre nossas cabeças tal como o sol, e estamos vivendo sob o olhar desse olho
vigilante. Vamos sempre tentar
viver näo na relatividade objetiva, mas na subjetiva. Devemos pensar:
"Acima da minha consciência está a Superconsciência; o olho do
guardiäo vigilante está sempre tomando conta de mim."
SOB O OLHAR AMOROSO DE DEUS
O mantra do Rig Veda
diz: om tad visno paramam padam sada pasyanti suraya diviva caksur atatam
- os divinos pés de nosso sagrado Senhor säo como o sol acima de nossas
cabeças. Seus sagrados pés säo
como o olho vigilante de um grandioso guardiäo suspenso sobre nossas cabeças
tal como o sol, e estamos vivendo sob o olhar desse olho vigilante.
Estamos interessados é na
realidade subjetiva, näo na objetiva. Vamos sempre tentar viver näo na
relatividade objetiva, mas na subjetiva.
Nunca devemos pensar:
"Sob meus pés estou pisando chäo firme; sou grande. Vou ficar de pé ereto." Em vez disso devemos pensar: "Acima da minha consciência está a
Superconsciência; o olho do guardiäo vigilante está sempre tomando conta de
mim. Estou vivendo sob a mirada
desse olho." Nosso apoio näo
vem de baixo, mas de cima. Ele é
nosso refúgio. Estamos
dependurados nesse mundo superior substancial no qual Ele reside; nosso apoio se
encontra ali. Devemos sempre estar
conscientes disso.
Este é um mantra principal
do Rig Veda. Antes que qualquer
pessoa se aproxime de uma nova tarefa, deve pensar sobre sua própria
posiçäo. Através desse verso dos
Vedas fomos instruídos a pensar desta forma: "Estamos sob ao olho
vigilante de nosso guardiäo, e esse grande olho é vivo como o sol; sua mirada é
tal como a do sol que está acima de nossas cabeças. Como uma luz que pode atravessar para ver qualquer coisa
dentro de nós, Sua mirada penetrante está em nós." Com essa compreensäo da identidade
devemos nos aproximar de nosso dever.
Nunca somos encorajados a pensar que estamos firmemente de pé aqui no
chäo sólido, e que com base nessa posiçäo forte, possamos cumprir nosso dharma independente de Sua graça.
Na verdade, em nosso
relacionamento subjetivo com a divindade, somos exatamente como os raios do
sol. Aonde os raios do sol se
apoiam? Se apoiam no sol - essa é
a fonte deles. Da mesma forma,
devemos pensar que nosso apoio é no reino da divindade; somos tantas partículas
de consciência, e nosso apoio, nossa pátria-mäe, é aquela área consciente. Consciência de Deus significa
consciência de Krishna. Nós somos
consciência e estamos destinados a consciência de Krishna - esse é nosso
relacionamento. Devemos sempre
estar conscientes desse fato.
Estamos conectados com consciência de Krishna. Somos membros do mundo consciente de Krishna. E viemos para vagar na estranha terra
da consciência material, conceito equivocado mayika, pensando que somos unidades desse mundo material, mas isso
näo é assim.
Somos unidades do mundo
consciente - o mundo consciente de Krishna - e de alguma maneira chegamos a
esse equivocado conceito de existência, o mundo da matéria. Matéria é o que podemos explorar,
o lado objetivo da realidade, e o lado subjetivo é o elemento que devemos
reverenciar. Nosso relacionamento com o subjetivo é o da reverência e devoçäo
pela entidade superior, e näo o de exploraçäo ou desfrute. Verdadeiro prazer, prazer divino, vem
do serviço - näo da exploraçäo.
Devemos entender todos esses
princípios básicos. Bhaktivedanta
Swami Maharaja certa vez comentou comigo que embora os engenheiros em Nova
Iorque construíram tantos arranha-céus que perduraräo por muito tempo, eles
nunca lembravam de quanto tempo seus próprios corpos durariam. Os prédios resistiräo por muito, muito
tempo. Porém aqueles que iräo
viver nesses prédios esqueceram de quanto tempo seus corpos aguentaräo. Dessa forma as pessoas estäo muito
ocupadas com o lado objetivo, mas estäo negligenciando os valores
subjetivos. A preocupaçäo delas é
com objetos e näo com quem vai usá-los.
Acham que näo é preciso nenhum cultivo subjetivo para o usuário do mundo
objetivo. Dessa maneira elas däo
toda importância ao lado objetivo, negligenciando totalmente o subjetivo.
RAIOS DE CONSCIENCIA
Nossa verdadeira posiçäo é
como a dos raios do sol. Um raio
de sol toca a terra. Onde fica seu
lar? Um raio de sol chega até
nosso plano e toca as colinas e a água, porém o que devemos considerar como seu
lar? Necessariamente o sol, e näo
a terra que ele toca. Nossa
posicäo é similar. Como raios de
consciência, pertencemos näo ao mundo material, mas ao mundo consciente. Nossa coneçäo com o lar está lá: no sol - o sol espiritual.
Somos aconselhados pelos
Vedas a considerar: "Embora
foste lançado num buraco desta terra, ainda assim tua terra natal é o sol
consciente. Emanaste de lá, és
sustentado de lá, e tua perspectiva futura está lá. Deves conceber a realidade dessa maneira. Porque és consciente, teu lar é a fonte
da consciência. Sejas ave ou
bicho, estejas nas montanhas, terra, ou água - onde quer que estejas, na
posiçäo em que estiveres, tua origem está na consciência, existência. Tua fonte está na consciência assim
como os raios da luz tem seu lar no sol."
Os Vedas nos dizem: "Näo és filho desse solo. Podes ser um prisioneiro daqui, mas
esse näo é teu lar; esta é uma terra estrangeira. Todas tuas esperanças e perspectivas podem ser supridas por
aquele solo superior, porque tua natureza é de tal ordem. Teu alimento, teu sustento, tudo teu
deve ser feito daquela substância superior. Porém o que se encontra nesse mundo material é tudo veneno
para ti."
Novamente, embora o que diga
respeito à consciência é a realizaçäo mais próxima, imediata de nossa natureza,
se for para nos aprofundarmos mais no mundo consciente, iremos encontrar algo
mais substancial. Se atravessarmos
além da visäo de consciência da luz, iremos encontrar a verdadeira necessidade
de nossa existência: felicidade - êxtase
- e amor divino.
Após estabelecermo-nos no
reino da consciência, devemos estabelecer-nos no reino do divino amor, êxtase e
beleza. Devemos procurar nossa
fortuna ali, e nunca nesse mundo material. Extase está acima da luz; doçura transcendental está acima
da consciência. Beleza e encanto
estäo acima da mera consciência e entendimento. O sentimento näo é completo em
si. O sentimento tem que ser
por algo. Portanto o conceito mais
pleno de algo perfeito é uma coisa plena de beleza ou êxtase. Mera existência ou consciência sozinha
näo pode ser a mais alta perfeiçäo.
Extase é a coisa mais perfeita.
Extase, amor divino, e beleza presupöe consciência e existência.
A realidade espiritual é
composta por três substâncias: sat, existência, cit, consciência, e ananda,
êxtase. E destes três, ananda ou êxtase é o conceito final da
substância espiritual. O êxtase
pode existir por si só. Nem a
existência, nem a consciência säo completas por si mesmas. A consciência sozinha anseia pelo
êxtase. E a existência sem
consciência é existir sem propósito.
Mas quando a existência é dotada de consciência, pode procurar por seu
próprio bem: êxtase. Extase é uma substância independente e
concreta. Tanto a existência como
a consciência säo subservientes ao êxtase.
E quem realiza o êxtase da
consciência de Krishna, se torna livre desse mundo material. Quando se realiza isso, näo há
necessidade de ter medo de nada.
Näo precisa ficar apreensivo por nenhum temor que possa surgir aqui
nesse mundo material onde existe a constante ameaça da näo-existência. Aqui no mundo material näo só näo há
realizaçäo, mas nossa própria existência está em risco. A qualquer momento poderemos ser
devorados pela näo-existência.
MERGULHE FUNDO NA REALIDADE
Mas para chegar ao plano do
êxtase, vamos ter que mergulhar fundo na realidade. Näo poderemos ficar satisfeitos com o formal, o
superficial. Se concentrarmos
nossa atençäo na forma externa de algo, negligenciando sua substância interna,
entäo iremos descobrir que estamos procurando no lugar errado. Quando Mahaprabhu olhava para a Deidade
de Jagannathadeva, aparentemente parecia que Seu direcionamento estava fixo na
mesma coisa que vemos quando olhamos para a Deidade. Para nossa visäo, contudo, a Deidade de Jagannatha é somente
um boneco feito de madeira. E no
entanto quando Sri Chaitanya Mahaprabhu ali fixava Seu olhar, Ele derramava
lágrimas de júbilo, e Suas lágrimas fluíam em incessante corrente. Onde se conectava Sua visäo da
realidade? Aquilo que vemos como
um boneco da madeira, Ele vê de maneira completamente diferente. E apenas por olhar aquilo, uma
incessante corrente de lágrimas jorra de Seus olhos. Onde se situa Sua conecçäo com a realidade? Ele está vendo as coisas do lado
oposto, a partir do mundo subjetivo.
Entäo como devemos nos
aproximar da Deidade? Quando
formos olhar a Deidade, qual deve ser nossa atitude? A forma da Deidade do Senhor näo é uma coisa mundana, logo
devemos aprender a maneira correta de enxergar a Deidade. E mais que isso, devemos tentar enxergar
isso do outro ponto de vista. Assim como estamos tentando ver a Deidade, Ele
nos vê. Ele adveio para auxiliar
as almas caídas nesse mundo material, e desceu de tal forma a nos elevar até
Seu domínio.
Ramanuja classificou a
expressäo da Entidade Suprema de cinco formas: para, vyuha, vaibhava,
antaryami, e arcana. Para, o conceito central da
entidade mais elevada; vyuha, a
extensäo de seu próprio ser em diferentes funçöes, em diferentes figuras; vaibhava, Seu aparecimento nesse plano
mundano como avataras tais como
Matsya, Kurma, e Varaha; antaryami,
Sua presença em cada coraçäo e cada alma, cada unidade consciente; e arcana, Seu aparecimento no plano de
nossa percepçäo física como a Deidade.
Em sua forma da Deidade, posso tocá-Lo, posso vê-Lo, e posso
serví-Lo. Ele veio numa forma
concreta para auxiliar nosso entendimento.
Sri Chaitanya Mahaprabhu
olhava para a Deidade e Seus olhos ficavam marejados de lágrimas. Näo é que Seus olhos estavam fixos nas
características superficiais da madeira quando Ele via a forma da Deidade do
Senhor Jagannatha, mas Ele estava conectado num nível vastamente mais elevado
com a consciência de Krishna. Seus pensamentos eram profundamente cheios de
consciência de Krishna. Sri Chaitanya Mahaprabhu pensava: "O Senhor Jagannatha veio aqui e
está fazendo arranjos para salvar milhöes da almas caídas, especialmente ao
estender Sua própria prasadam a todo
e qualquer um em grande magnitude. Sua presença magnânima manifestou-Se aqui
para o alívio desse mundo."
E consciência de Krishna é o
mais alto trabalho de alívio.
Nosso guru maharaja costumava
dizer que existe uma fome de krishna
katha. Existe uma fome no
momento. Mas o mundo está sofrendo
de uma falta de alimento? Näo. O mundo está sofrendo da fome de
consciência de Krishna, falar sobre Krishna, krishna kirtan.
Portanto devemos tentar abrir locais para distribuir alimento para que
possamos distribuir o alimento da consciência de Krishna a todas almas. Mahaprabhu disse: "Quem quer que encontres, fale de
Krishna (yare dekha, tare kaha
'krishna-upadesha')"
Dêem-lhes o alimento da consciência de Krishna, krishna katha. O mundo
está cheio de pessoas atormentadas pela fome. Devemos distribuir alimento, dar a vida e alento da
consciência de Krishna a quem quer que encontremos, falando sobre Krishna.
Esse era o sentimento de
Srila Bhaktisiddhanta Sarasvati, e Bhaktivedanta Swami Maharaja executou isso
no ocidente. Srila Bhaktisiddhanta
costumava dizer: "Näo admito nenhum outro conceito de fome. A única fome é de krishna katha, krishna smrti, consciência de Krishna." Com tal seriedade é que concebia nossa
necessidade de consciência de Krishna.
Krishna é de importância
vital para nossa existência.
Somente Krishna pode nos dar vitalidade. E como Sri Chaitanya Mahaprabhu, o próprio Krishna distribui
consciência de Krishna. Vasudeva
Ghosh portanto diz: "Sri
Gauranga é minha vida e alma, minha única vitalidade. Se Gauranga näo viesse, como poderia eu viver? (Yadi
gaura na ha'ta tabe ki haita kemane dharitam de.) Por Sua graça provei alimento täo valioso que sem isso,
minha vida seria completamente impossível."
Consciência de Krishna é a
vitalidade da vitalidade. Srila
Bhaktisiddhanta Sarasvati Prabhupada esforçou-se ao máximo para dar consciência
de Krishna ao povo da India, e Bhaktivedanta Swami Maharaja distribui essa
vitalidade pelo mundo inteiro. É
pela graça deles e pela graça do próprio Sri Chaitanya Mahaprabhu que tantos
chegaram à consciência de Krishna.
Haridasa Thakura certa vez disse a Chaitanya Mahaprabhu: "Através do Teu cantar do santo
nome de Krishna, tanto o mundo animado quanto o inanimado foram alimentados com
o alimento da consciência de Krishna.
Seja qual for a posiçäo que ocupem, a vida deles está realizada. Ouvi sobre como quando viajavas pela
selva e cantavas e dançavas, os elefantes e tigres também dançavam e cantavam o
santo nome de Krishna. Entäo näo
admira se eu disser que as pedras e as árvores também atingiram sua meta mais
alta - consciência de Krishna - quando estás cantando. Que intenso grau de consciência de
Krishna foi produzido aqui através do Teu cantar!"
Porém a fim de cantar o
santo nome de Krishna, também é necessário algo de nossa parte. Amanina
manadena kirtaniyah sada harih.
Devemos sempre recorrer ao kirtana,
mas nossa atitude deve ser como recomenda Mahaprabhu: "Trnad api
sunicena taror api sahisnuna amanina manadena." Nossa atitude deve ser de humildade, e
se achamos que estamos sendo lesados, ainda assim devemos ser pacientes, e sob
nenhuma circunstância devemos trabalhar por nossa própria posiçäo e prestígio;
essa näo deve ser nossa meta.
Quando o inferior se insurge
contra o superior, surge a ofensa.
Essa tendência deve ser evitada.
Educaçäo primária também é educaçäo, mas näo deve competir com a educaçäo
superior; devemos tomar cuidado com isso.
Ao mesmo tempo, a diferenciaçäo entre educaçäo superior e inferior deve
ser genuína. Ainda assim, näo
devemos pensar que educaçäo primária é a educaçäo mais elevada. Isso será perigoso. Há um ditado em bengali - alpavidya bhayamkori - "Um pouco de
conhecimento é coisa perigosa."
Temos que tomar cuidado com isso, senäo nossa atitude será suicida. A questäo das ofensas surge sempre
que a educaçäo primária se compara à educaçäo superior. Esse tipo de afirmaçäo é ofensivo.
Lenta e constantemente se
ganha a corrida. Nossa marcha rumo
ao infinito é uma longa jornada, näo uma jornada a terminar em poucas horas,
poucos dias, ou poucos anos. E
temos que nos ajustar de acordo.
Näo é que vamos correr rapidamente para fazer progresso e entäo parar e
dormir. O caminho a trilhar é
longo. Só teremos sucesso se
desenvolvermos humildade - trnad api
sunicena. Näo devemos criar
nenhuma circunstância que convide resistência. Ainda assim, se a resistência inesperadamente se aproximar
de nós, devemos tentar ao máximo ser tolerantes. E devemos estar sempre conscientes de que o olho de nosso
guardiäo está sempre sobre nós, pronto para ajudar-nos em nossa campanha. Näo estamos sozinhos. Podemos continuar confiantes: existe uma pessoa acima de nós para
reparar o mal que possa se apresentar diante de nós, portanto näo devemos tomar
a iniciativa.
Näo devemos permitir que
qualquer propósito ou tentaçäo ulterior nos induza a abandonar a busca por Sri
Krishna. Que a satisfaçäo de guru,
Gauranga, Krishna e os Vaisnavas sejam nosso único objetivo. Que nenhum outro elemento entre em
nosso caminho. A pureza de nosso
propósito deve sempre ser mantida escrupulosamente. Devemos pensar:
"Seguirei sozinho com meu dever. Näo vou ficar sempre procurando por alguém que venha e me
ajude. Que eles façam seu próprio
dever. Esse é meu dever."
Com essa atitude
continuaremos. Com esse tipo de
ajuste nossa concentraçäo poderá se tornar mais intensa, nossa confiança em
Krishna será aumentada, e nosso dever será puro e claro. Devemos estar conscientes que
empecilhos e obstáculos quase certamente nos atacaräo, mas devemos lidar com
eles com humildade e tolerância.
Portanto essa vida näo é uma vida de conforto.
SAGRADOS PÉS DE VISHNU
Mas a fim de desenvolver
esse tipo de humildade e tolerância, devemos aprender a ver a mäo do Senhor em
tudo. E portanto os Vedas nos
dizem para lembrar que o olhar do Senhor está sempre sobre nós. Om
tad vishno paramam padam sada pashyanti suraya: pedem-nos que vejamos os
sagrados pés de Narayana assim como vemos o sol no céu. Porque o sol? O sol é descrito como pradarshaka: o observador, a testemunha. Aparentemente vemos o sol, porém na
realidade o sol nos ajuda a ver.
Os sagrados pés de Vishnu significam a parte mais baixa de Vishnu - yoge vidhayam yasya vidyate kvacit. A parte mais baixa Dele para nós é o
começo da realizaçäo. O começo da
realizaçäo é pensar que Deus está sempre nos vendo. Assim como o sol nos ajuda a ver, os sagrados pés de Vishnu
säo como o sol. Por isso devemos
sempre tentar ver tudo pelos raios dos sagrados pés de Vishnu.
De outro ponto de vista,
Seus sagrados pés säo como um grande olho que se estende pelo firmamento. Ele vê tudo. Seja o quê fizermos, o olho vigilante de nosso guardiäo está
sobre nossa cabeça tal como o sol.
Antes que entremos em qualquer açäo devemos lembrar desse mantra
védico. O Rig Veda é o primeiro
Veda e esse é o mais importante mantra do Rig Veda. Os brahmanas da
escola védica aprendem que sempre que fizerem qualquer serviço referente a
religiäo ou varnashrama, devem
primeiro lembrar desse mantra do Rig Veda: "Os pés de Vishnu estäo sobre ti e estäo te olhando
como o olho de um guardiäo vigilante.
Sempre lembrando disso, faça teu dever."
Se sempre lembrarmos que Ele
está vendo tudo que fazemos, näo conseguiremos fazer nada errado. Näo conseguiremos aventurar-nos a fazer
qualquer coisa ofensiva ao Senhor enquanto lembrarmos que através de tudo, o
olho investigador, o olho que tudo sabe, o olho oniciente do Senhor está sempre
velando por nós. Essa lembrança só
pode purificar nosso coraçäo e entendimento e todo nosso sistema mental, e nos
ajudará a nos aproximar da divindade da maneira correta. Näo é que podemos fazer toda e qualquer
coisa sem que Ele saiba; näo é que somos os mestres marioneteiros de nossa
própria vida e do mundo; näo é que vamos exercer nossa maestria, nossa
influência sobre o meio-ambiente num esforço egoísta. Sempre lembrem que um grande olho se estende acima de suas
cabeças vendo tudo como o farol examinador de um forte raio-X. Até mesmo o que nós mesmos näo sabemos
sobre nós, Ele sabe. O que está no
subterrâneo da regiäo subconsciente mais recôndita de nosso coraçäo, Ele
sabe. Se lembrarmos disso enquanto
vivemos e nos movimentamos, só poderemos nos purificar. Assim como o câncer pode ser removido
do corpo por um raio laser, toda moléstia da existência material desaparecerá
de nossos coraçöes pela influência purificadora desses divinos raios de luz dos
sagrados pés de Vishnu.
* * *
REI DAS VACAS
Possa aquele senhor das vacas ficar satisfeito conosco. Quem é Indra se comparado a
Krishna? Krishna é o controlador
de Indra. E no entanto Ele
apareceu como o controlador das vacas; a Suprema Verdade Absoluta aceitou uma
simples posiçäo de guardiäo das vacas.
Superficialmente, Ele é um mero menino vaqueiro. Mas que esse menino vaqueiro, que em Si
encerra o poder de controlar o universo inteiro, fique satisfeito conosco. Queremos adorar aquele Senhor que tomou
a humilde posiçäo de rei das vacas.
SENHOR DAS VACAS
deve varshati yajna-viplavarusha
vajrashma-varshanilaih
sidat-pala-pashu-striyatma-saranam
drstvanukampy-utsmayam
utpatyaika-karena shailamavalo
lilocchilindhram yatha
bibrad gosthamapan mahendram adabhit
priyan na indro gavam
Srimad
Bhagavatam 10.26.25
A própria essência da
Govardhana lila, a própria substância
do passatempo, está representada nesse verso. Os vaqueiros de Vrindavana costumavam observar um sacrifício
para satisfazer o rei do céu, Indra, sob cujo comando a chuva, nuvens e outros poderes elementais sutis se
movimentam. A principal riqueza
dos vaqueiros é a vaca, e o principal alimento da vaca é a grama. Só a chuva pode produzir grama, e
portanto os vaqueiros costumavam realizar sacrifícios para satisfazer o poder
sutil que supostamente comanda as substâncias naturais como a chuva.
Por satisfazer Indra, vinham
chuvas favoráveis e havia suficiente grama. Entäo as vacas podiam pastar facilmente na grama e gerar
leite profusamente. Os gopas, os vaqueiros e suas famílias,
costumavam fazer diferentes preparaçöes do leite, vendendo-as na praça do
mercado, e dessa maneira ganhavam seu sustento.
Conforme o pasto acabava num
local, mudavam-se de uma floresta para outra. Apenas com a finalidade de obter grama para as vacas,
o pai de Krishna, Nanda Maharaja, e os vaqueiros costumavam perambular de um
local para outro. Assim, às vezes
viviam em Vrindavana, às vezes em Nandagrama, e às vezes em Gokula.
Uma vez, Krishna queria Se
afirmar e modificar a adoraçäo a Indra.
Queria estabelecer Seu próprio domínio, Vrindavana, em sua glória
original impoluta.
Embora fosse apenas um
menino, era um menino de capacidade extraordinária. Tinha só sete anos de idade. Porém no Padma Purana
é dito que o desenvolvimento ou crescimento de personalidades especiais é uma e
meia vezes maior que de pessoas comuns.
Embora Krishna só tivesse sete anos de idade pelos cálculos comuns,
tinha onze segundo o cálculo geral.
Krishna disse: "Porque
devemos realizar esse sacrifício para Indra? Temos interesse direto pela Colina de Govardhana e näo por
Indra." Ele anunciou essa
idéia aos gopas, e de alguma forma,
de bom grado ou reluntando, os gopas
se submeteram ao conselho de Krishna.
Nanda Maharaja foi influenciado pela afeiçäo por seu filho e, porque era
o rei, disse-lhes: "Dessa vez
vamos adorar a Colina de Govardhana e näo Indra."
INDRA INSULTADO
E assim os gopas, os vaqueiros de Vrindavana,
seguiram o conselho de Krishna - alguns relutantemente e alguns de boa vontade -
e começaram o sacrifício para a Colina de Govardhana. Esta notícia chegou a Indra, que pensou consigo mesmo: "Um menino de capacidade especial
vive ali. Agora Ele tomou a
liderança de Vrindavana e parou esse antigo sacrifício a mim. Durante muito tempo era tradiçäo dos gopas realizar o sacrifício para
satisfazer-me, e agora um menino é a causa de pararem meu
sacrifício!" Ficou muito
irado. Indra ordenou que as nuvens
e o vento e o relâmpago atacassem os residentes de Vrindavana.
Segundo a compreensäo
védica, todos elementos säo personificados. Na antiguidade, os arianos e rajarishis, seres humanos elevados e grandes sábios, costumavam ver
tudo como pessoas. Viam tudo de
maneira pessoal. Pensavam nas
trepadeiras, árvores e tudo o mais no meio-ambiente como pessoas. Compreendiam que eram todas pessoas
que, conforme o karma, estäo vagando
através de diferentes espécies de vida.
Uma vez um professor de
biologia me perguntou sobre alternativas à evoluçäo Darwiniana. Aconselhei-o que a evoluçäo da consciência
à matéria pode ser compreendida com base na teoria de Berkeley. Qualquer coisa em que pensemos na
verdade é parte de nossa consciência.
E consciência significa pessoa.
Tudo do qual possamos estar conscientes é uma pessoa. Podemos pensar no vento como um objeto
inanimado, mas na linha védica se pensava nele como uma pessoa. Relâmpago, vento, nuvens, e chuva todos
säo pessoas. Aquilo que consideramos matéria elementar, grosseira e sutil, era
tudo considerado pelos antigos videntes da verdade como pessoas.
Indra comandou o vento, as
nuvens e a chuva para ir devastar toda área de Gokula Vrndavana. "Os residentes de Vrndavana me
insultaram!" disse ele.
"Me rejeitaram, pararam de me adorar, e em vez disso estäo adorando
aquela montanha, aquela colina de Govardhana. Näo posso tolerar esse insulto! Väo e devastem tudo."
Pela ordem e ira de Indra, o
mestre de todos elementos sutis mais elevados, começou a cair pesada
chuva. E assim o troväo, granizo,
e chuva simultaneamente atacaram toda Vraja Mandala.
Consequentemente, todos
residentes de Vrndavana se viram num grande desastre. Miséria, dor, e tristeza afligiam os animais e os protetores
dos animais, os gopalas. Assim os indefesos - as mulheres,
crianças, e animais de Vrindavana - näo tinham outra alternativa senäo tomar
refúgio em Krishna. Todos vieram a
Krishna para obter alívio.
Choravam: "ó Krishna!
Agora que vamos fazer? Tu nos influenciaste a parar com o sacrifício destinado
a Indra, e agora Indra, sendo vingativo, começou a nos afligir dessa maneira muito pesada. Como poderemos viver? Por favor salve-nos!" Todos vieram a Krishna para
proteçäo. Vendo isso, Krishna teve
muita pena deles. Sendo lhes
misericordioso, sorriu um pouco, pensando: "Todos vieram a Mim para o alívio."
Naquele momento, com apenas
uma mäo, Krishna levantou a montanha Govardhana. Para Ele, era algo muito fácil; com apenas uma mäo desalojou
a colina e a levantou tal como uma criança levanta uma bola de brinquedo.
E segurando aquela grande
montanha Krishna deu proteçäo a todos aqueles que estavam vivendo em
Gokula. Os homens, mulheres, e
crianças de Vrindavana trouxeram as vacas e todos seus pertences materiais e
tomaram refúgio sob a Colina de Govardhana.
Toda sociedade dos vaqueiros
recebeu abrigo sob aquela colina.
Dessa forma, levantando a Colina de Govardhana, Krishna deu proteçäo aos
residentes de Vrindavana, e arrasou o orgulho do senhor do firmamento, o
próprio Indra.
E portanto Nanda Maharaja
ora nesse verso: "Possa
aquele senhor das vacas ficar satisfeito conosco. Quem é Indra se comparado a Krishna? Krishna é o controlador de Indra. E no entanto Ele apareceu como o
controlador das vacas; a Suprema Verdade Absoluta aceitou uma simples posiçäo
de guardiäo das vacas.
Superficialmente, Ele é um mero menino vaqueiro. Mas que esse menino vaqueiro, que em Si
encerra o poder de controlar o universo inteiro, fique satisfeito conosco. Queremos adorar aquele Senhor que tomou
a humilde posiçäo de rei das vacas."
Desse verso do
Srimad-Bhagavatam, podemos compreender a posiçäo do passatempo do Senhor em
Govardhana. Aqui também se
descreve que quando os Vrajavasis O adoraram e se ocuparam no sacrifício para a
satisfaçäo Dele, viram a Colina de Govardhana como a Pessoa Suprema, estendendo
Suas mäos, aceitando as coisas a Ele oferecidas, e Se alimentando.
Naquele momento, Krishna
apontou: "Vejam só! Vocês pensavam que a Colina de
Govardhana era só um monte de pedra.
Näo - está viva, é a Suprema Personalidade de Deus. Naquela hora Krishna Se revelou como a
Colina de Govardhana e mostrou como também se trata da extensäo de Seu próprio
ser. Segundo as autoridades em
nossa linha, Radha-kunda é a extensäo do próprio ser de Srimati Radharani e
Govardhana é extensäo do próprio ser de Krishna. E portanto adoramos uma pedra da Colina de Govardhana, uma
parte de Giridhari, como o próprio Krishna. A partir disso podemos compreender que uma parte do infinito
é infinita. E no entanto nossa
visäo comum é täo fraca que embora Govardhana-shila
seja uma parte do infinito e portanto também infinita, para nossa visäo
material é somente um pedaço de pedra.
Esse passatempo mostra que
uma coisa pode parecer pedra comum, mas sua possibilidade é infinita. No sentido geral, a teoria da
relatividade de Einstein anunciou que qualquer coisa que vemos é aquela coisa e
ainda algo mais. De sua própria
maneira científica, ele explica que a realidade de algo inclui suas
possibilidades, sua perspectiva - a realidade näo é parada.
A realidade näo se limita ao
que vemos ou concebemos através de nossos sentidos. Nossa visäo ou estimativa de algo pode ser limitada, porém
sem que saibamos, sua perspectiva pode ser ilimitada. Nem sequer sabemos que infinita possibilidade pode haver num
gräo de areia. Näo sabemos que
tipo de possibilidade pode existir numa folha duma planta. Poderá parecer comum, mas pode conter
valiosas propriedades medicinais.
DEUS O BELO
Uma parte do infinito também
é infinita. A Govardhana-shila
representa Krishna como controlador e guardiäo das vacas. Dentro de Govardhana está aquele meigo
e gentil conceito de Deus o Belo.
Imploramos por Sua misericórdia, Seu afeto, e Seu benevolente olhar.
Isso poderá nos salvar da
influência negativa desse meio-ambiente material. Quando tentarmos colocar um ponto final em nossa forma de
vida material e acertar o curso rumo a Deus, consciência de Krishna,
negligenciando os deveres imperativos que nos sobrecarregam, poderäo advir
tantas dificuldades para nos atormentar, para nos enredar em nossa viagem rumo
à verdade máxima. Mas se nos
ativermos à ordem de Krishna, Ele nos protegerá. Krishna confirma isso no Bhagavad-gita:
sarva-dharman parityajya
mam ekam saranam vraja
aham tvam sarva-papebhyo
moksayisyami ma sucah
Ele diz: "Abandone todos outros conceitos
de dever e apenas renda-Se a Mim.
Näo tenha medo. Eu o
protegerei e libertarei de todas reaçöes pecaminosas que possam surgir por
negligenciar teus deveres ordinários."
Diferentes tendências e
impulsos materiais poderäo nos atacar - até mesmo o próprio Indra, o rei do
firmamento e controlador de todas atividades comuns, poderá nos atacar - mas se
prestarmos atençäo em nossa meta, se tivermos o cuidado de ler a ordem de
Krishna, Ele nos protegerá na sombra de Seus pés de lótus. Ele nos dará abrigo sob a sombra da
Colina de Govardhana, onde nenhum Indra conseguirá tocar em nossas
cabeças. E com plena fé que
Krishna nos dará proteçäo, devemos tentar tomar refúgio sob a Colina de
Govardhana e orar: "ó
Krishna, dai-me proteçäo de todas dificuldades que podem vir atacar-me por ter
deixado de lado minhas obrigaçöes comuns."
Embora muitas anomalias
possam tentar nos pegar, Krishna nos protegerá. E em Sua representaçäo como Colina de Govardhana, aquele
maravilhoso controlador das vacas nos salvará de todo tipo de
dificuldades. Como isso é
possível? Deus faz maravilhas. Seus meios säo desconhecidos e
inconcebíveis.
* * *
Krishna é infinito; Ele é a maravilhosa maravilha das maravilhas;
quanto mais O buscarmos, descobriremos que näo terminam Suas maravilhas. Mesmo o Senhor Brahma, o criador desse
universo e guru original de nossa sampradaya, ficou atônito ante as
maravilhas de Krishna.
SENHOR BRAHMA
Ofereço minhas oraçöes a Ti, ó louvável Senhor que és a criança do
vaqueiro Nanda. Tua compleiçäo é
de cor azul-escura como uma nuvem trovejante e estás vestido com vestes de seda
que brilham como o relâmpago. Teu
rosto encantador está adornado com ornamentos gunja mala, e Teu cabelo decorado com uma pena de paväo. Tua aparência é linda portando uma
guirlanda de flores silvestres, e tal beleza é realçada pelo bocado de comida
em Tua mäo esquerda. Carregas um
berrante de chifre de búfalo e uma vara para apacentar as vacas, debaixo de Teu
braço esquerdo. Seguras uma flauta
e outros emblemas, e Teus pés säo suaves como um lótus.
A ILUSÄO DE BRAHMA
A Suprema Personalidade de
Deus, Sri Krishna, a causa primordial de toda harmonia, é täo maravilhoso que
simplesmente por aproximarmo-nos Dele, ficaremos encantados com Seus
modos. Ele é conhecido como
Urukrama, pois Seus passos säo maravilhosos, inimagináveis, desconhecidos, e
insondáveis. Näo terminam Suas
maravilhas. Ashcaryavat pashyati kashcid enam ashcaryavad vadati tathaiva canyah:
a cada passo na direçäo Dele, sentimos maravilhas. Näo encontramos o final desse sentimento. Krishna é infinito; Ele é a maravilhosa
maravilha das maravilhas; quanto mais O buscarmos, descobriremos que näo
terminam Suas maravilhas.
Mesmo o Senhor Brahma, o
criador desse universo e guru
original de nossa sampradaya, ficou
atônito ante as maravilhas de Krishna.
Uma vez, quando Krishna estava vivendo em Dwaraka, ouviu que Brahma, o
criador do universo, viera para vê-Lo.
Krishna perguntou a Seu mensageiro: "Qual Brahma?" Quando o mensageiro colocou esta
questäo para Brahma, este pensou:
"Existem também outros Brahmas? Como isso é possível?" E disse para o mensageiro: "Basta informar a Krishna que é o pai dos quatro
Kumaras: o Brahma de quatro
cabeças." O mensageiro foi
até Krishna com a informaçäo.
"Sim, faça-o
entrar" disse Krishna, conhecendo o temperamento de Brahma. Brahma entrou, mas ficou espantado
quando viu que tantos Brahmas haviam se reunido ali de todos universos na
criaçäo. Havia Brahmas com cem,
mil, e um milhäo de cabeças - todos ali presentes. Porque toda criaçäo se baseia no hipnotismo de Krishna, o
Brahma de quatro cabeças podia ver Krishna e todos aqueles outros Brahmas, mas
os outros Brahmas näo conseguiam se ver.
Cada um deles só via Krishna.
Cada um pensava: "Krishna
veio ao meu universo e me chamou por alguma necessidade." Mas o Brahma desse universo podia ver
tudo por causa daquela pergunta:
"Qual Brahma? Qual é o significado de Qual Brahma? Existem outros Brahmas? Estou
curioso..." Dessa maneira, o
Senhor Brahma, criador do universo, ficou perplexo pelas maravilhosas
possibilidades de Krishna.
Antes, em Vrndavana, Brahma
também teve alguma dúvida sobre a posiçäo do Senhor. Pensou:
"Quem é esse menino vaqueiro?
Seus modos säo muito questionáveis. Movimenta-se de tal maneira que parece que näo liga para
ninguém. Ele está dentro de minha brahmanda, meu universo, mas näo se
importa em conhecer-me. Que
atitude é essa? Quem é Ele? Ele näo é Narayana. Só Narayana está acima de mim. E estou um pouco acostumado a Seu jeito
e modos. Mas esse menino näo é
Narayana. Que possa existir algo
acima de Narayana é impossível.
Entäo quem é Ele?"
Para testar Krishna, Brahma
sequestrou todos meninos vaqueiros e bezerros que O acompanhavam e escondeu-os
numa caverna. Depois de um ano,
voltou para ver como estava continuando a vida em Vrndavana, para ver como
Krishna estava sem Seus bezerros e meninos vaqueiros. E descobriu que tudo estava como dantes. O Senhor, rodeado de Seus amigos
vaqueirinhos, estava carregando Sua flauta sob Sua axila e um bocado de comida
em Sua outra mäo. Encontrou tudo
continuando conforme era antes.
Entäo Brahma começou a
pensar: "Que é isso? Será que os bezerros e os meninos
vaqueiros voltaram sem que eu reparasse?" Novamente checou a caverna onde os escondera e encontrou
todos lá. Entäo pensou: "Como isso é possível? Roubei os bezerros e meninos vaqueiros
e os escondi aqui e agora que voltei, descubro que ainda estäo todos aqui como
antes."
Finalmente, perplexo, caiu
aos pés de lótus de Krishna, orando:
"Meu Senhor, näo consegui reconhecer-Te. Vieste para fazer um papel täo simples e comum, de menino
vaqueiro. Como alguém poderia
acreditar que detens uma posiçäo maior ainda que a de Narayana? Por favor perdoe tudo que fiz."
Em muitas partes do Srimad-Bhagavatam encontramos o Senhor
Brahma, o criador do universo, sendo testado por Krishna. E no entanto Brahma é nosso gurudeva. Ele é o guru
original de nossa linha. Que ele
pudesse ficar desconcertado é täo perplexante e difícil de entender que
Madhvacharya eliminou essa seçäo do Srimad-Bhagavatam. Ele näo conseguia aceitar esses dois
capítulos do Srimad-Bhagavatam onde
Brahma estava em ilusäo, em que tinha alguma compreensäo errônea acerca de
Krishna. Porém Sri Chaitanya
Mahaprabhu aceitou tudo in toto.
Isso é algo muito
estranho. Como pode o guru original de nossa sampradaya ficar confuso sobre
Krishna? É acinthya, inconcebível.
Ainda assim, tudo é inteligível através da filosofia de acinthya-bhedabheda-tattva,
"inconcebível unidade e diferença". Como podemos acomodar que nosso guru original fique perplexo, näo só uma, mas duas vezes? Isso é lila, um passatempo divino.
Encontramos um exemplo de acinthya-bhedabheda-tattva na forma em que Krishna lida com Seus
devotos. Krishna em Si é
independente de tudo. Mesmo assim,
às vezes Ele Se mostra como sendo completamente subordinado a Seus servos e que
tem que fazer o que estes desejarem.
E em outras ocasiöes, às vezes os ignora completamente. Esses säo os passatempos espontâneos do
Doce Absoluto. As vezes Ele mostra
absoluta submissäo a Srimati Radharani, e novamente a ignora. Essa é a própria natureza da lila de Krishna.
PASSATEMPOS TORTUOSOS
Rupa Goswami forneceu um
verso de seu Ujjvala-nilamani como
base para a devida compreensäo de krishna-lila. Quando pensamos sobre os passatempos do
absoluto, nós, o finito, teremos que usar esta armadura: aher
iva gatih premnah svabhava-kutila bhavet. Temos que entender que os passatempos de Krishna säo
naturalmente tortuosos, assim como o movimento de uma serpente. Uma serpente näo consegue se movimentar
numa linha reta; move-se em zig-zag.
As ondas que fluem do absoluto se movem da mesma maneira. Essa característica de krishna-lila sempre se mantém acima de
tudo o mais. Krishna nunca poderá
ser governado por nenhuma lei. Com
essa consideraçäo inicial devemos nos aproximar de qualquer estudo do
absoluto. Devemos sempre manter em
mente que Ele é absoluto, e nós somos infinitesimais. Ele é adhoksaja,
transcendental, além do mundo de nossa experiência.
Certa vez perguntei a
Prabhupada: "Porque existe
uma diferença entre Sanatana e Rupa no concepçäo deles da parte final de krishna-lila? Sanatana fechou seu resumo dos passatempos de Krishna em seu
Krishna-lila-stava em Mathura, e Rupa
levou um passo mais em direçäo de Dvaraka em seu Lalita-madhava. Ele
escreveu duas peças que lidam com krishna-lila: uma sobre Dvaraka e uma sobre
Vrindavana. Vidagdha-madhava acontece em Vrndavana; Lalita-madhava acontece em Dvaraka. Porém Sanatana Goswami gostava de completar os passatempos
de Krishna em Mathura.
Segundo Sanatana Goswami,
após longo período de separaçäo entre Krishna e Sua família e amigos, como uma
roda, o passatempo se movimenta de Mathura novamente para Vrndavana. Depois que Krishna se fôra para
Mathura, os residentes de Vrndavana, vencidos pela separaçäo, começaram a
pensar: "Krishna se foi há
tanto tempo. Nanda e Yasoda
perderam seu filho!" A
separaçäo se intensifica e desenvolve ainda mais, até que começam a
pensar: "Oh, Nanda e Yasoda
näo tem nenhum filho!" Entäo
pensam: "Eles tem que ter um
filho" e começam a orar para o aparecimento de Krishna. Entäo Krishna aparece como o filho de
Nanda e Yasoda. O ciclo está
completo e todos estäo contentes pensando: "Oh sim, Yasoda tem um filho!" Assim os passatempos de Krishna começam
a se desenvolver em Vrindavana e movimentam-se para Mathura, onde Ele mata
Kamsa.
Em seu Krishna-lila-stava, o seu resumo de krishna-lila, Sanatana Goswami näo levou Krishna para Dvaraka de
Mathura Mandala. Porém Rupa
Goswami, em sua peça Lalita-madhava,
mostrou os paralelos entre krishna-lila
em Vrndavana e krishna-lila em
Dvaraka. E assim, em seu Lalita-madhava, Rupa Goswami traça um
paralelo entre Lalita como Jambavati, Radharani como Satyabhama, e Chandravali
como Rukmini. Dessa forma, ele
mostra a transformaçäo entre Vrndavana e Dvaraka.
ALÉM DA EXPERIENCIA
Indaguei a Srila
Bhaktisiddhanta Saraswati Prabhupada sobre essa diferença entre Rupa e
Sanatana. Ele simplesmente
disse: "É adhoksaja, além de nossa
compreensäo. Assim krishna-lila é
"incompreensível" (acinthya). Nem tudo pode caber em nossa mäo. O Senhor Supremo possue "Todos Direitos
Reservados". Isso deve ser
compreendido se quisermos estar conectados com tal plano de realidade.
Portanto o Srimad-Bhagavatam diz: jnane
prayasam udapasya namanta eva:
é um defeito tentar entender tudo sobre a divindade. O conhecimento pode
ser uma qualificaçäo aqui nesse mundo,
mas em relaçäo à verdade transcendental de ordem mais elevada, a
tendência a querer saber tudo é uma desqualificaçäo.
Queremos saber o valor de
tudo. Queremos ter em nosso poder
a chave de tudo. Mas isso na
realidade é um entrave ao progresso.
Se nos afirmamos dessa maneira, por contrapartida perdemos a pouca
confiança que possamos ter na divindade, e haverá algum atraso em nos
entregarem a chave. Se um servo,
ao conseguir emprego na casa do paträo, ficar muito ansioso para ser o
encarregado das chaves da casa, entäo o paträo irá suspeitar dele. Portanto querer saber tudo é um tipo de
doença, inimiga do progresso.
Isso é claro que é difícil
de aceitar. Mas ainda assim é
verdade. Rendiçäo é tudo. Que cultivo de conhecimento encontramos
nas gopis - as mais exaltadas devotas
de Krishna? Qual era seu
conhecimento das escrituras?
Nenhum.
O que entendemos como
"pureza padräo", o que pensamos ser conhecimento - todas essas coisas
säo desqualificaçöes no tocante a dar prazer ao absoluto. Um exemplo de como nossos padröes
equivocados de "pureza" e "castidade" säo uma
desqualificaçäo, pode ser visto na seguinte história.
UM MÉDICO MISTICO
A fim de provar a posiçäo
suprema de Srimati Radharani, certo dia Krishna aparentou repentinamente cair
doente. Enquanto jazia doente, Ele
veio numa outra forma, disfarçado de médico, e disse: "ó Yasoda, ouvi que teu menino pegou alguma
doença. É verdade?"
"Sim, sim, quem
és?"
"Sou um médico - um
médico místico. Gostaria de ver
teu filho. Qual é a doença
dele?"
"Ele desmaiou; talvez
esteja com dor de cabeça."
Entäo Krishna vestido de
médico disse a Mäe Yasoda:
"Essa doença é muito séria.
Quero curá-Lo. Mas só
poderei fazê-lo se conseguir um pouco d'água trazido num pote poroso. É preciso
pegar alguma água do Yamuna num pote que tenha muitos furos. Só uma moça casta pode fazer isso. Uma moça casta deve trazer uma água num
pote poroso. Com o auxílio disso
darei um remédio a esse menino, e Ele voltará à consciência
imediatamente."
Entäo Yasoda procurou
loucamente em Vrndavana por uma moça casta. Jatila e Kutila eram sogra e cunhada de Radharani. Porque elas naturalmente pregavam que
havia dúvida ou suspeita sobre a castidade das outras moças entre as gopis, elas próprias em geral eram
consideradas como sendo castas.
Portanto Yasoda pediu a uma delas, Jatila, primeiro. "Leva esse pote poroso e pega uma
água do Yamuna."
"Como é possível? Pegar água num pote poroso é
impossível."
"Näo. O médico diz que se a moça for
realmente casta, entäo conseguirá pegar água num pote poroso."
Jatila näo pôde se esquivar
do pedido louco de Yasoda. Seu
pedido fôra täo intenso que ela tinha que ir. Mas näo conseguia pegar água do Yamuna porque havia tantos buracos
no pote. Entäo Kutila foi
solicitada a pegar água no pote.
Mas ela näo se atrevia a tentar, em vista da tentativa de sua mäe. Ainda assim, Yasoda fora täo sincera em
seu pedido, que Kutila näo conseguiu se esquivar da tarefa. Yasoda näo podia tolerar por um segundo
que seu filho estivesse em tal condiçäo.
E assim seu pedido fora täo intenso que Kutila teve que ir. Mas ela também näo conseguiu pegar água, porque havia tantos
buracos no pote d'água que a água simplesmente jorrava.
Ficaram atônitas, pensando: "Que podemos fazer? Dentre todas moças de Vraja, näo se
encontra nem uma única moça casta?
Que coisa horrível!"
Assim, Krishna vestido de médico, escolheu Radharani, dizendo: "Acho que Ela é uma moça casta.
Peça que vá pegar a
água."
E a pedido de Mäe Yasoda,
Radharani näo pode evitar a tarefa.
Ela teve que ir pegar a água, mas estava pensando em Krishna: "Se vieres em Meu socorro, só
entäo será possível; senäo será impossível." Ela orou.
Radharani mergulhou o pote poroso na água enquanto Krishna tocava o pote
de dentro d'água. E Radharani com
grande suspeita tirou o pote da
água e com grande espanto disse:
"A água está lá!"
Ela havia levado algumas de Suas servas, as sakhis, Suas principais amigas, junto, e todas ficaram maravilhadas
ao verem que Ela pegou a água do Yamuna.
Os buracos estavam ali porém a água permanecia no pote. Assim Ela levou a água até Yasoda e
todos ficaram pasmados. E deram
aquela água com algum remédio fictício ao menino Krishna, e Krishna Se levantou
de Seu estado "inconsciente".
Essa foi uma tática de
Krishna para revelar a posiçäo de Radharani, para mostrar o que é
castidade. Que é castidade? "Castidade" comum näo é
castidade real. Pureza real,
castidade verdadeira, está bem acima de todas consideraçöes relativas de
castidade. E isso é inconcebível,
além de nosso conhecimento e razäo, assim como um pote poroso pode conter
água. É um milagre.
Porém o Senhor faz
maravilhas. Seus modos säo cheios
de milagres. Devemos estar
preparados para isso. Devemos
estar preparados para o fato que todo conhecimento desse mundo, toda nossa
experiência, poderá provar-se equivocada.
Portanto diz-se: "jnane prayasam udapasya namanta eva: fique livre de tuas experiências
passadas, daquilo que deprendeste do mundo dos sentidos, conhecimento empírico
(pratyaksa-jnana). Tua tendência será sempre tentar abrir
caminho mundo espiritual adentro por meio da força do conhecimento
mundano. Mas esse verso está
dizendo: "Oh pessoas caídas,
seu capital é a experiência desse mundo.
Porém isso näo vai dar, näo terá valor naquele plano superior. O que ali se encontra é algo novo,
portanto aproximem-se daquele mundo com uma mente aberta; compreendam que tudo
é possível com o infinito. Todas
suas expectativas, toda sua experiência passada, näo tem valor. Porque näo param de tentar se esquivar
desse ponto?"
O mundo transcendental é
algo bem novo para nós. É bastante
difícil tentar sair dessa superstiçäo de assim-chamada "verdade"
aqui. Mas ainda assim é necessário
que aceitemos que toda e qualquer coisa é possivel com Deus. Ele é o mestre das
impossibilidades. Possibilidade e
impossibilidade só se encontram em nosso dicionário, no entanto mesmo Napoleäo
queria remover a palavra "impossível". Ele disse:
"Impossível é uma palavra no dicionário de um tolo."
Como deveremos entender que
o guru original de nossa sampradaya ficou desconcertado? É "impossivel". Temos que suspender nosso
"conhecimento" (jnane prayasam
udapasya namanta eva).
Poderemos considerar que talvez Krishna está brincando de
esconde-esconde com Brahma, nosso gurudeva. É assim como um jogo de
esconde-esconde. As vezes Krishna
está derrotando outros e às vezes Ele é derrotado.
KRISHNA E BALARAM
Quando Krishna e Balarama
estäo brincando com Seus amigos na selva, em geral brincam em dois grupos. Krishna fica num grupo e Balarama
noutro. Krishna é considerado como
sendo menos forte que Balarama.
Balarama era a pessoa mais forte dali, e em seguida havia Sridhama,
portanto Sridama costumava brincar no lado de Krishna.
Sempre que Balarama era
derrotado, ficava irado. Krishna
diplomaticamente ajudava Seu próprio
time, e quando Balarama via que Seu próprio time estava sendo desleal devido
aos truques de Krishna, virava-Se para Seu irmäo mais novo e dizia: "Vou Te castigar!" Mas Krishna dizia: "Näo. Näo consegues Me punir; Mäe Yasoda Me colocou sob Tua
guarda. Näo podes
maltratar-Me."
Certo dia, Balarama bateu em
Krishna, porém Krishna foi até Mäe Yasoda e denunciou-O. Balarama ficou muito perturbado e disse: "Te bato uma vez, e vais reclamar
com Tua mäe que näo Te amo?
Krishna, como pudeste fazer isso?" Afinal Krishna ficou perplexo e aceitou Sua derrota.
Portanto krishna-lila se movimenta de maneira
tortuosa (aher iva gatih premna...). Esse ponto fundamental, o fundamento de
nossa compreensäo sobre krishna-lila,
foi dado por Rupa Goswami nesse verso.
Ele diz: "Näo fiquem
ansiosos por encontrar razäo em tudo nos passatempos da divindade. Eles säo naturalmente tortuosos. Em krishna-lila
vamos ver que embora nenhum partido tenha defeito, ainda assim, um irá colocar
defeito no outro e começar uma querela.
Ali näo se encontra defeito.
Mas ainda assim, pela necessidade da lila,
encontram-se falsos defeitos, e principia alguma briga. Esse é o sentido de lila, passatempos: o que aqui encontramos pela
necessidade, lá flui automaticamente."
Näo podemos tentar aplicar
nossa razäo ou padräo de medida aos movimentos do infinito. E qualquer avanço que tenhamos feito
por conectar com tal fluxo de lila
será perdido em nossas tentativas de medir; essa será a única consequência de
nossa análise. Portanto devemos
tentar ter um gosto pela lila com uma
atitude submissa. As vezes a
razäo, lógica e análise säo necessárias, mas somente para pregar para as
pessoas em geral que tem um entendimento inferior. Apenas para o propósito de pregar para pessoas viciadas na
razäo é que temos que aceitar o auxílio da razäo. Mas quando a devoçäo se torna automática, anuraga, entäo tanto a razäo quanto a
escritura säo deixadas na posiçäo subterrânea. Ali näo há lugar para argumentos escriturais. Até certo ponto, a razäo é necessária
para nosso desenvolvimento até vaidhi-bhakti,
os estágios elementares da devoçäo.
Porém acima disso, näo tem utilidade.
Anuraga-bhajana é automática; essa é a natureza de lila: aher iva gatih premna. Tudo ali se movimenta por Sua doce
vontade. Doce vontade significa
que näo é um programa fixo.
Movimenta-se de tal forma que näo podemos dizer "Irá passar por essa estrada."
Quando o Maharaja de Mysore
costumava ir à cidade de carro, näo falava com seu motorista, dando-lhe
instruçöes quanto ao caminho a seguir, porque se qualquer programa fixo fosse
combinado, entäo sua vida poderia correr perigo. Entäo sempre que chegavam a algum cruzamento na estrada,
encostava sua bengala a determinado ombro do motorista. Se no cruzamento, o Maharaja quisesse
ir para a direita, tocava o motorista em seu ombro direito. Dessa maneira, nunca revelava por qual
caminho seguiria, mas só no último momento é que orientava o motorista para
tomar certo rumo.
Assim os divinos movimentos
de Krishna säo guardados reservados
por Sua doce vontade:
"Todos Direitos Reservados". Queremos procurar
por alguma lei acima de Sua doce vontade, mas isso é inconsistente. Se auto-contradiz. Por um lado dizemos que Krishna Se move
por Sua própria doce vontade, mas por outro lado tentamos achar alguma lei que
governe Seu movimento. Isso é uma contradiçäo. A Lila se move pela doce vontade. Quando dizemos que é lila,
entäo näo podemos dar nenhum formato a isso. Podemos dizer que foi mostrada num determinado local de uma
maneira particular. Mas näo
podemos ter certeza se hoje será tomado o mesmo rumo.
É por isso que encontramos
diferenças nas explicaçöes dadas sobre diferentes lilas em diferentes eras.
Jiva Goswami explicou que a razäo para diferentes descriçöes dos
passatempos do Senhor nos Puranas é
porque numa ocasiäo tal lila se
desenrolou dum modo, e noutra ocasiäo foi de outra maneira. Assim encontramos diferenças até mesmo
nas explicaçöes do mesmo passatempo.
Estudiosos poderäo
desafiar: "Porque é que em
algum lugar do Padma Purana a lila é mencionada dessa forma, mas o Bhagavata Purana revela a descriçäo de
outra maneira? Porque o Harivamsa difere do Mahabharata?" Dizemos que em diferentes kalpas ou eras, os passatempos säo encenados de maneiras
diferentes. De infinitas maneiras
determinada lila do Senhor poderá ser
representada nesse mundo, porque Ele é infinito, independente, e absoluto. Portanto, deixando de lado todas
dúvidas e suspeitas, seremos mais generosos ao nos aproximar do absoluto, livre
de todas inibiçöes.
Aproximaremo-nos Dele com tal estado de espírito, e tentaremos mais e
mais deixar de lado nossos preconceitos e precedentes anteriores, os registros
de nossa experiência passada.
DEUS ESTA MORTO?
Vamos nos aproximar Dele
lembrando que Ele ainda está
vivendo. Näo é uma coisa
estereotipada. Näo devemos esperar
apenas o que já foi feito doutra feita.
Se esperarmos a mesma coisa só irá nos reasegurar através da repetiçäo
de que Ele näo é uma coisa viva; que a Divindade está sob a lei histórica. Devemos pensar que no passado Ele Se
mostrou de determinada maneira, portanto Ele tem obrigaçäo de mostrar-Se sempre
daquela forma? Ele näo está vivo
até hoje? Será que Ele näo pode
mostrar nada de novo?
A cada momento, cada
segundo, Ele pode mostrar tudo de uma maneira bem nova. Portanto nosso coraçäo deve se abrir
bem quando nos aproximamos da autoridade superior do plano do jogo absoluto. Isso significa que a rendiçäo tem que
aumentar até näo ter limite. A
rendiçäo é sem limites, e Seu jogo ou lila
também é ilimitada. Com esse tipo
de visäo profunda, vamos tentar ler Sua lila. Assim embora Brahma e os outros deuses
e gurus e transmissores de muitos shastras possam ter feito determinada
descriçäo de Seus passatempos, vamos ter que entender que os passatempos de
Krishna näo estäo presos às descriçöes deles. Krishna näo está confinado numa gaiola.
Portanto, por essa razäo Sri
Chaitanya Mahaprabhu näo hesitou em nos dar uma descriçäo da confusäo de Brahma
(brahma-vimohana-lila). Brahma confundiu-se na krishna-lila em Vrndavana, e novamente
quando Brahma foi numa entrevista com Krishna em Dwaraka, encontramos a mesma
situaçäo. A marca da doce vontade
do infinito é tal que ali qualquer coisa pode ser acomodada, e mesmo o Senhor
Brahma, criador do universo, pode ficar perplexo diante de Krishna.
Todos esses passatempos säo
como uns tantos faróis nos mostrando o caminho a seguir. Brahma é nosso guru, mas ele foi iludido por Krishna. E Vedavyasa, o guru
universal, também foi repreendido por Narada. Narada foi testado muitas vezes. Todos esses exemplos estäo nos mostrando o caminho, estäo
apontando a direçäo. É dito que shrutibhir vimrgyam: os livros autênticos sobre a verdade
revelada estäo apenas mostrando o caminho. Eles dizem:
"Väo por essa direçäo.
Aonde? Näo sabemos
exatamente, mas podem tomar essa direçäo." Só estäo mostrando a direçäo. Todos os shrutis,
a orientaçäo dada pelos sábios da verdade revelada, däo alguma direçäo: "Väo por esse caminho, nessa
direçäo, e talvez possam encontrar."
Krishna diz: "vedais ca sarvair aham eva vedyo. Todos Vedas tem a
intençäo de revelar-Me, o infinito."
Destinam-se a mostrar como o infinito está se movimentando. Se analiso um átomo na minha mäo, posso
analisá-lo repetidamente e reanalisá-lo sem chegar a lugar algum. Já está na minha mäo, e contudo é
infinito. Portanto foi dito que
conseguiremos o maior benefício através da rendiçäo. Krishna diz:
"Abandona todos teus preconceitos e as limitaçöes extraídas do
mundo limitado e fica aberto.
Entäo será fácil o infinito lançar diferentes vislumbres de luz em tua
alma e tua faculdade cognitiva. E
entäo também será fácil limpar teu plano de entendimento, limpar teu espelho, o
espelho de teu coraçäo."
Em conecçäo com o infinito
descobrirás que em tudo há centro, e em nenhum lugar circunferência. Mas para vivenciar isso tem que tentar
viver na eternidade, em Vaikuntha.
Kuntha significa
"medida". Vaikuntha
significa "sem tortuosidade, sem limite, sem medida." Isso é Vaikuntha.
Quando Krishna abriu Sua
boca, Yasoda ficou estarrecida ao descobrir a criaçäo universal inteira. Yasoda näo entendeu nada.
"Que vejo? O universo
todo? O infinito dentro do finito?" Naquele momento ela quase desmaiou, mas
aí o gato dela miou alto. E
Krishna, como se estivesse com muito medo do som do gato, agarrou Sua mäe por
temor. Entäo de repente a
apreensäo de Yasoda desapareceu.
Pensou: "ó näo... Ele
é meu filho! Näo tem nenhuma
representaçäo do infinito dentro Dele; Ele é meu filho!" E O abraçou.
Quando Brahma sequestrou os
meninos vaqueiros e bezerros, pensou que havia deixado alguma lacuna na lila, mas acabou descobrindo que esta
fluía assim como dantes. Nem mesmo
a menor parte fora perturbada.
Krishna tinha Se expandido em bezerros e meninos vaqueiros. Quando o próprio Krishna tomou a forma
de todos bezerros e meninos vaqueiros, entäo as mäes sentiram um tipo de
afeiçäo infinita, tanto assim que näo conseguiam entender, mas ficavam
encantadas, pensando: "Como
säo lindos esses meninos!" E
as vacas também estavam loucas para mostrar sua afeiçäo para aqueles bezerros. Entäo Brahma pensou: "Será que esses meninos vaqueiros
e bezerros que roubei vieram aqui sorrateiramente para juntarem-se a
Ele?" Novamente foi verificar
o local onde os escondera. E
viu: "Näo, os meninos e
bezerros estäo onde os guardei nas cavernas da montanha. Estäo lá." De novo retornou até onde Krishna
estava e viu tudo continuando conforme era. Naquela hora Brahma se rendeu e foi tranquilizado. Falou a seguinte oraçäo:
naumidya te'bhravapuse
tadidambaraya
gunjavatamsa-paripicchala-sanmukhaya
vanyasraje kavalavetravisana-venu-
laksmasriye mrdupade
pashupangajaya
Srimad-Bhagavatam 10.14.1
"Ofereço minhas oraçöes
a Ti, ó louvável Senhor que és o filho do vaqueiro Nanda. Tua tez é da cor azul escura de uma
nuvem trovejante e estás vestido com roupas de seda que brilham como o
relâmpago. Teu rosto encantador
está adornado de ornamentos gunja-mala,
e Teu cabelo está decorado com uma pena de paväo. Pareces lindo usando uma guirlanda de flores silvestres, e
tal beleza é realçada pelo bocado de alimento em Tua mäo esquerda. Carregas um berrante de búfalo sob Teu
braço esquerdo. Seguras uma flauta
e outros emblemas, e Teus pés säo macios como um lótus."
Esse é o significado geral
desse verso. O sentido interno
desse verso, contudo, é este:
"ó venerável Ser, submetemos nossas oraçöes a Ti. Quem és? És invisível, intocável, desconhecido, e impossível de
conhecer. Tua tez é da cor de uma
nuvem negra, e portanto és muito difícil de ver, porém podes ser visto devido a
Tua roupa amarela." Amarelo é
a cor de Radharani. Portanto só
com o auxílio da potência de Krishna é que se pode asseverar quem Ele é. Tadit
significa relâmpago. Com a ajuda do relâmpago conseguimos enxergar uma nuvem
negra de noite. Assim embora
Krishna seja desconhecido e incognoscível, Sua potência pode revelá-Lo para
nós. Brahma diz: "És a entidade venerável que
passei a conhecer. Agora curvo-me
diante de Ti. Teu corpo é como o
de uma nuvem negra, e isso é alguma representaçäo mística. Negro geralmente näo se consegue detectar. Porém Tuas vestes de cor amarela
auxiliam-nos a saber o que és. Tem
alguma semelhança com a veste amarela de Narayana. Teu corpo negro e vestes amarelas sugerem a personificaçäo
de Narayana. És desconhecido e
incognoscível até para Ti mesmo. Mas
Tua veste amarela - Tua potência - Te torna conhecido para nós.
"E desces até nosso
nível como se estivesses na nossa posiçäo. Estás vestido como um vaqueirinho, brincando na selva com um
bocado de alimento em Tua mäo.
Isso nos engana ao tentarmos determinar quem és. E adoras coisas comuns. Até a guirlanda que usas é feita de
flores selvagens comuns. Teu gosto
parece ser pelas coisas inferiores.
"E todos esses sinais
säo enganadores para nós. Tomas um
bocado de alimento da Tua mäo e corres atrás das vacas. Isso é sinal de ser de classe
inferior. As pessoas de casta mais
elevada como brahmanas e ksatriyas näo podem se mover assim ou se
comportar de tal modo com seu alimento.
O instrumento que carregas - uma flauta de bambu - também näo tem sofisticaçäo. E Tua passada é curta. Tudo isso nos desencaminha a termos um
conceito inferior de Ti. Estás Te
escondendo, portanto como é que podemos compreender-Te? Que falha há por parte de nós, entäo,
que näo reconhecemos Tua supremacia?
É difícil aceitar que Tu, Krishna, és o mestre de tudo.
"Tens tantos ornamentos
simples. Näo achamos nada que seja
deslumbrante ou cheio de esplendor aqui em Vrndavana. Estamos acostumados a achar tais coisas em Vaikuntha. Mas isto é novo. Vieste aqui para mostrar Teus
passatempos brincalhöes. Aqui em
Vrndavana descobrimos um novo conceito.
E é maravilhoso, simples, e encantador. Simples, no entanto altamente atraente.
"Com simples coisas
comuns Te decoraste, porém és täo extraordinariamente encantador. É impossível de entender e
descrever. Em geral neste mundo, a
posiçäo de vaqueirinhos näo tem nenhuma significância real. Eles representam a seçäo inferior da
sociedade. Mas aqui em Vrndavana,
tal posiçäo é täo maravilhosa e encantadora que Te achamos todo-atrativo -
hipnotizando-nos.
"E Teu movimento é
muito lento porém seguro. Teu
movimento é tal que näo Te importas com mais nada neste mundo. Embora estejas numa posiçäo inferior,
Tua postura é tal que aparentemente näo ligas para nada neste mundo. Em Ti encontramos a mais elevada
concepçäo vestida de maneira bem simples - mas uma maneira muito
maravilhosa. Em conecçäo Contigo,
coisas de valor comum se tornam encantadoras. Embora eu seja o Criador e tenha criado tudo, näo consigo
entender este tipo de criaçäo.
Estou orgulhoso por ter criado tantas coisas neste mundo, mas estou
atarantado ao ver a beleza do meio-ambiente aqui em Vrndavana. Aqui Teu movimento é lento, mas seguro
e belo. Podes ser o filho de um
ser humano que mantém vacas; isso näo é um padräo muito elevado na sociedade ou
nas escrituras, mas é a natureza de Tua personalidade que seja o que fizeres,
aquilo passa a ter a posiçäo mais elevada. Que é isso!
Seja quem fores, minha vaidade foi derrotada. Tomo refúgio a Teus sagrados pés - rendo-me. Por favor ajuda-me a compreender o que
realmente és."
Dessa maneira, Brahma se
rendeu. E assim, Krishna está além
da compreensäo até mesmo do criador do universo. Ele é infinito.
E Ele é infinito näo só na consideraçäo do espaço, mas também na consideraçäo
do tempo - Ele é infinito em qualquer tipo de consideraçäo. Sua potência infinita está representada
na consciência, na existência, e também nas relaçöes do amor.
DOÇURA ABSOLUTA
As escrituras nos däo três
conceitos do infinito: Brahman,
Paramatma, e Bhagavan. O conceito
Brahman é o infinito que tudo inclui.
O que quer que concebermos está nele. Paramatma é o menor dos menores: anor aniyan. Qualquer coisa que se possa conceber
que seja pequena, é ainda menor que isso.
E o Bhagavan, ou conceito pessoal de Deus, é de dois tipos: um é como o senhor de infinita
majestade e poder, e o outro é de absoluta doçura.
Jiva Goswami deu o
significado essencial de Bhagavan em seu Bhakti-Sandarbha. Ele diz: bhagavan
bhajaniya-sarva-sad-guna visistha.
Com Bhagavan, ele descreve este aspecto do infinito: bhajaniya,
adorável. Quando entramos em
contato com Ele, entäo queremos nos render para a satisfaçäo Dele - esse tipo
de infinito. Existem vários tipos
de infinito. O conceito mais alto
do infinito é bhajaniya guna visistha: Ele é täo lindo e atraente que está
atraindo todos para se renderem a Ele.
Nenhum outro conceito do infinito, nem do espaço infinito, nem do tempo,
nem de coisa alguma, consegue se aproximar deste conceito mais alto do infinito: o infinito todo-atrativo. Todos outros aspectos do infinito -
tempo infinito, espaço infinito, poder infinito - säo externos. Porém amor infinito que atrai amor e
auto-rendiçäo é o tipo mais elevado de infinito. E isso é Krishna.
Atraçäo é o elemento mais
fundamental em tudo. Tudo o mais
pode ser eliminado e esquecido se entrarmos em contato com a atraçäo e o
amor. Tudo pode ser ignorado se
estivermos em contato com o amor.
A realizaçäo de nossa existência, de toda existência, de tudo, está no amor. O amor é o princípio no centro que é a
única realizaçäo de toda existência.
O próprio cerne da existência está ali; näo se pode ignorar ou contestar
através de quaisquer outras formas ou aspectos de nossa existência
substancial. É incontestável e absoluto.
Seja o que for que possamos
experimentar, a necessidade mais central a ser preenchida permanece: o amor. O rei absoluto de tudo é o amor. Nada consegue persistir quando comparado com ele. Entrando em conflito com o princípio do
amor, todos teräo de aceitar a derrota.
Mahaprabhu evidenciou que esta é a coisa mais substancial neste mundo.
Madhvacarya, em seu conceito
sobre como devemos ver o acharya, o
mestre espiritual, näo conseguiu harmonizar a confusäo de Brahma. Afinal, ele é o sampradaya guru, o principal guru da tradiçäo, a Brahma-Madhva-sampradaya. Portanto Madhvacarya omitiu estes dois
capítulos sobre a ilusäo de Brahma do Srimad-Bhagavatam. Mas Mahaprabhu näo fez isto. Ele aceitou a ediçäo de Sridhara Swami,
que está de acordo com a filosofia suddhadvaita
de Vishnuswami. A Vishnuswami sampradaya säo seguidores de
raga-marga, devoçäo espontânea. Sridhara Swami incluiu estes dois
capítulos com seu comentário, e Mahaprabhu aceitou-o, e isso é corroborado no
Caitanya-caritamrta. Madhvacarya
näo conseguiu acomodar a idéia que o guru
pudesse ser seduzido. Näo pôde
tolerar que o guru pode näo saber de
tudo, pode näo ser onisciente, mas Mahaprabhu conseguiu.
* * *
O poder do amor é inimaginável.
Embora seja impossível, o infinito é derrotado pelo finito. Qual é essa posiçäo inimaginável? Ela só pode ser obtida através do amor. E quäo adorável e precioso e valioso é
esse amor! Para adquirir uma gota
desse divino amor, nenhum sacrifício é suficiente. Assim somos encorajados a
"morrer para viver".
BALAKRISHNA
Somos adoradores näo da paternidade de Deus, mas da qualidade filial de
Deus. Näo O adoramos como o
criador ou como o controlador, na parte externa da circunferência, mas no
conceito filial, Ele está no centro.
Ele näo está na circunferência mas no centro. Esse é o conceito do Srimad Bhagavatam: qualidade de filho, e depois de
consorte, uma expressäo mais celestial, se encontra ali. Ele está no centro e Suas extensöes
emanam Dele. Portanto em nosso
conceito do absoluto, Seu pai está controlando-O, Sua mäe está maltratando-O, e
O vemos cair aos pés de Sua amada.
DEUS COMO FILHO
Isto pode ser compreendido
ao considerarmos que somos adoradores näo da paternidade de Deus, mas da
qualidade de filho de Deus. Näo O
adoramos como o criador ou como o controlador, na parte externa da
circunferência, mas no conceito filial, Ele está no centro. Ele näo está na circunferência mas no
centro. Näo é que por um lado Ele
esteja fornecendo tudo, criando tudo no
segundo plano. Näo; Ele está no centro. Esse é o conceito do Srimad-Bhagavatam: qualidade de filho, e depois de
consorte, uma expressäo mais celestial, se encontra ali. Ele está ali no centro, e Suas
extensöes emanam Dele. Portanto em
nosso conceito do absoluto, Seu pai está controlando-O, Sua mäe está
maltratando-O e punindo-O, e também O vemos cair aos pés de Sua amada. Sem falar no guru, até mesmo o próprio Deus pode aparentar ficar confuso quanto
à Sua posiçäo absoluta.
E porquê? Amor divino. Prema. Assim que coisa altamente preciosa o
amor divino deve ser. Após a
liberaçäo, além da devoçäo calculista, no plano mais elevado de toda criaçäo, o
amor eterno reina supremo. E esse
divino amor emana Dele assim como raios de luz emanam do sol.
Portanto Ele está no centro
e Sua extensäo está por todos lados.
Baladeva por um lado supre a energia da existência, mantendo tudo no
segundo plano (o pano de fundo), e o lado extático é controlado por Sua
potência Srimati Radharani, que consegue fazer do Absoluto Independente, uma
bolinha na brincadeira de Sua mäo.
É inconcebível, é
incalculável, porém essa é a própria natureza da divindade. O Senhor diz: aham
bhakta-paradhino... "Sim,
aceitei livremente a subjugaçäo por Meus devotos. Näo tenho independência própria. O modo como Meus devotos Me tratam é täo maravilhoso que Me
torna subserviente a eles." O
amor divino é täo encantador que é considerado como sendo meta última da vida,
e Sri Chaitanya Mahaprabhu pessoalmente veio junto com Nityananda Prabhu para
divulgar essa notícia para o mundo.
OCEANO DE AMOR
Poderemos provar desta vida
divina somente naquele plano do néctar.
Podermos viver nas ondas daquele oceano de amor é o mais elevado
objetivo de nossas vidas.
Naquele reino divino nossas
personalidades individuais podem ser mantidas. Näo é necessário ao mergulharmos fundo naquele plano de
consciência, que percamos nossa própria personalidade, nossa própria individualidade. Näo é nem um pouco necessário. E no entanto a natureza do amor divino,
é que ainda estás vivendo, mas estás vivendo por conta Dele, integralmente
convertido ao Seu serviço. É uma
coisa maravilhosa: se pode manter
a própria personalidade para o interesse de Krishna. Mas näo se pode ter nenhum motivo egoísta, nenhum conceito
de interesse separado. Fundir-se
lá näo é o fundir-se físico, mortal, näo um fundir-se do tipo perder-se, mas o
tipo de fundir-se de que fala o Srimad-Bhagavatam:
martyo yada tyakta-samasta-karma
niveditatma vicikirsito me
tadamrtatvam pratipadyamano
mayatma-bhuyaya ca kalpate vai
"Quem é submetido a
nascimento e morte alcança imortalidade quando abandona todas atividades
materiais, dedica sua vida à execuçäo de Minha ordem, e age de acordo com
Minhas diretrizes. Dessa maneira,
se torna apto a desfrutar da bem-aventurança espiritual derivada de trocar
doçuras amorosas Comigo."
E no Bhagavad-gita 18.55 Krishna diz:
bhaktya mam abhijanati
yavan yas casmi tattvatah
tato mam tattvato jnatva
visate tad-anantaram
"Somente através do
amor e devoçäo é que posso ser compreendido como sou. Depois disto, compreendendo-Me plenamente, poderás fundir-te
em Meu séquito."
Este "fundir-se" é
explicado por Krishna: "Eles
entram em Mim para tornarem-se uma pessoa em Minha família. No círculo de Minhas amizades, ele
entra: visate tad anantaram.
Ele se torna como se fosse Meu próprio." Entrar na família do Senhor é um fundir-se vivo, näo um
fundir-se físico ou morto no Brahman, espírito. Isto é o resultado de prema,
amor divino.
Esse ideal está acima do
conceito geral de fundir-se na unidade do Brahman, onde nos perdemos num oceano
de consciência como se fosse de sono profundo. Näo estamos interessados nisso. Em vez disso, através da consciência de Krishna, nos
perdemos nadando no oceano de doçura.
Isto foi aceito por Sri Chaitanya Mahaprabhu.
VITORIA DA DEVOÇÄO
Uma vez, Radharani deixou a rasa-lila quando Ela viu que todas gopis estavam sendo tratadas quase
igualmente por Krishna. Tratamento
igual para com cada uma delas näo A satisfez. Portanto Ela decidiu demonstrar uma composiçäo de canto e dança
para agradar Krishna de um modo muito maravilhoso e transcendental. Radharani mostrou Sua habilidade de
várias maneiras, e entäo, no momento derradeiro, Ela repentinamente
desapareceu. E como Krishna estava
ocupado naquele cantar e dançar combinado, Ele de repente descobriu que
Radharani estava ausente. Portanto
Ele deixou todos para buscar Radharani.
Achou-A no caminho, e após caminhar por algum tempo, Radharani
disse-Lhe: "Näo consigo
mexer. Näo posso mais
caminhar. Se quiser continuar,
terá que Me carregar. Näo consigo
prosseguir adiante." E de
repente, Krishna desapareceu.
Um discípulo de Srila
Bhaktisiddhanta Saraswati Thakura certa vez perguntou-lhe porque Krishna
desaparecera daquela forma. Mas
nosso guru maharaja ficou muito
perturbado por ouvir tal pergunta.
Nesta lila, Krishna está
aparentemente demonstrando pouco-caso por Radharani. Assim nosso guru
maharaja, por sua própria natureza, näo podia nem mesmo tolerar tal
pergunta. Ele tinha tanta
parcialidade para com Radharani que näo estava disposto a ouvir qualquer coisa
contra Ela. E assim, num humor um
tanto excitado respondeu:
"Encontra alguma devoçäo aqui? Que bhakti se
encontra aqui, para ter me perguntado esta
pergunta?" A pergunta foi
rejeitada. Ele näo podia tolerar
nem mesmo uma indagaçäo referente àquele passatempo.
Quando esta notícia chegou a
mim, tentei achar o que Bhaktivinoda Thakura escrevera em suas próprias
palavras sobre este verso do Srimad-Bhagavatam
na sua própria traduçäo, Bhagavatarka-Marici-Mala. Bhaktivinoda Thakura harmonizou as
dificuldades no verso. Ele explica
que Krishna estava pensando:
"Gostaria de ver qual será a mentalidade de separaçäo Nela. " Só para apreciar a profundidade da
separaçäo que Ela sentia Dele é que Krishna desapareceu. E entäo, é claro, Krishna retornou após
algum tempo.
Mas nosso guru maharaja näo podia nem mesmo
tolerar a idéia. "Onde se encontra a devoçäo
aqui?" Mas Bhaktivinoda
Thakura interpretou esse passatempo como significando que Krishna fora impelido
a ver que tipo de felicidade em separaçäo Srimati Radharani
experimentaria. Ele tomou isso
como exemplo de como o absoluto Se torna subserviente a Seu devoto. E assim descobrimos que o negativo,
Srimati Radharani, é täo poderoso que o positivo, Krishna, fica sem poder perto
Dela. É como se o positivo
perdesse Sua existência separada.
Essa é a vitória da devoçäo.
A devoçäo é representada
como o lado negativo, puxando pelo positivo. Existe o suco dentro da fruta e aquele que extrai o suco da
fruta. A mais alta devoçäo se
encontra onde a extraçäo está em sua condiçäo de intensificaçäo máxima - ali
temos a vitória dos devotos: onde
o absoluto aceita derrota diante de Seus servos. Isto revela a real presença da devoçäo, dedicaçäo, rendiçäo.
SENHOR DO AMOR
A rendiçäo é täo poderosa
que pode até capturar o absoluto.
Estamos aspirando por tal tipo de potência. E quem quer possua isso - estes seräo o todo de tudo; seräo
nossos mestres. Em nosso melhor
interesse, devemos olhar na direçäo em que tal poder seja intensificado. Tentaremos olhar para onde quer que
encontremos rendiçäo num estágio intenso, condensado. Nossa meta deve direcionar-se a isso. Estamos mendigando por isso. Näo somos mendigos de algo que possa
ser encontrado neste mundo mundano:
na dhanam na janam na sundarim... näo aos bens, seguidores ou desfrute
com mulheres, mas eliminado tudo o mais, nossa meta deve direcionar-se rumo a
uma coisa - aquela condiçäo mais intensificada de serviço divino ao Senhor do
Amor.
Devemos tentar converter
tudo de tal maneira que possa ir para aquele quadrante desconhecido além da
jurisdiçäo de nossa experiência sensorial ou aquisiçäo mental, como um foguete
enviado ao espaço sideral. Srimad-Bhagavatam, que destila a
essência de todas escrituras reveladas, diz que o amor divino é a coisa mais
original e desejável. Näo devemos
nos permitir correr aqui e acolá buscando satisfaçäo grosseira. Devemos concentrar fortemente nossa
atençäo no amor divino. O amor
divino é a coisa mais elevada para nós; é a mais elevada na criaçäo, a mais
elevada na eternidade.
E postarmo-nos na posiçäo
negativa é a estratégia de permanecer na relatividade da regiäo mais elevada de
serviço a Krishna. Srila
Bhaktisiddhanta Saraswati Thakura certa vez compôs um verso expressando a atitude
certa. Pujala ragapatha gaurava bange mattala sadhu-jana visaya range. "A senda do amor divino é adorável
para nós e deve ser mantida nas alturas como nossa mais elevada
aspiraçäo."
Ele ordenou que construíssem
uma cabana para si em Govardhana e disse:
"Vou morar aqui. Näo
sou qualificado para morar em Radha-kunda. Portanto vou viver numa posiçäo inferior, porém meus gurus - Gaurakisora dasa Babaji,
Bhaktivinoda Thakura, e outros - estäo qualificados para ali servirem. Portanto irei serví-los lá no
Radha-kunda, e depois retornarei a uma posiçäo um pouco mais baixa, em
Govardhana. Vou ficar
ali." Essa é a tática certa
para manter uma posiçäo subjetiva no mundo subjetivo.
Senäo, caso pensarmos que
estamos na regiäo mais elevada, essa realidade mais elevada desaparecerá diante
de nós. Somente de uma posiçäo
mais baixa poderemos mirar esse plano mais elevado com respeito. Mas sempre que pensamos que alcançamos
essa posiçäo mais elevada, que estamos lá - näo estamos em lugar algum. Essa é a natureza do mundo mais
elevado. Assim devemos manter uma
distância respeitosa. Se tentarmos
olhar diretamente, perderemos, mas se tentarmos olhar para tal plano através de
uma tela ou de um lugar escondido, entäo poderemos ver. É muito singular. Se queremos entrar em contato direto
com coisas de uma ordem mais elevada, entäo elas desaparecem de nossa
experiência. Se näo conseguimos
entrar em conecçäo direta com algo, poderemos descobrir sobre isso através de
espionagem - é algo como espionagem.
Se tentarmos conhecê-lo diretamente, é impossível. Somente por detrás de um biombo é que
se pode ter um vislumbre.
Dessa maneira podemos
experimentar a mais alta verdade ontológica. Como se fosse por acaso a verdade ontológica vem a nós. Ele nos aceita repentinamente, e
conseguimos encontrá-Lo. Ele é
absoluto. Ele é um autocrata. Ele é independente; sempre que por Seu
próprio capricho Ele nos dá Sua conecçäo, poderemos obtê-la. Nunca está nas minhas mäos. Ele näo é um objeto para ficar
diretamente sob meu controle. Ele
está sempre acima.
Através deste sistema
podemos chegar à mais alta realizaçäo.
Na ordem mais elevada da lila
de Radha-Govinda, Krishna pede a Radharani para fazer algo, e Ela Se recusa,
dizendo: "Näo, näo vou fazer
isso." E no entanto isso tem
sido aceito como o mais elevado humor do lado negativo. Negar a Krishna aquilo que Ele quer, se
chama bhama-bhava. E Radharani está cheia dessa
natureza. Mas isso acentua a
ânsia, o anseio de Krishna. O
sistema todo é tortuoso. E no
entanto este é o meio recomendado para os mais pobres entrarem em contato com o
mais elevado. É um maravilhoso
estratagema. A transaçäo direta, a
transaçäo clara face-a-face, está ausente aqui. Tudo é como roubar.
Tudo lá é um desempenho furtivo.
Na área mais elevada, na área da autocracia, é tudo chantagem. E por essa razäo é conhecido como aprakrta - apenas semelhante ao conceito
mais baixo das coisas. Em nossa
presente condiçäo de vida, näo conseguimos tolerar autocracia. É considerada a coisa mais baixa. Porém a autocracia está lá no mundo
mais elevado. Portanto é conhecida
como aprakrta: a regiäo mais elevada do mundo
transcendental que consegue harmonizar tudo.
A beleza daquele plano é que
mesmo o que é considerado como sendo do tipo mais baixo aqui, é tudo
harmonizado lá. A força harmoniosa
é täo grande lá, que o que é indesejável, desagradável, e mau aqui, é
harmonizado de tal modo que obtém a posiçäo mais elevada lá. A posiçäo singular de Krishna é tal que
o mais baixo prova ser o mais elevado por Seu toque mágico. Porque Ele está lá, nenhuma mácula é
uma mácula; é pura. Consciência de
Krishna é o toque de Krishna, a beleza da mais elevada ordem. Assim como a pedra-de-toque näo só
converte prata em ouro, mas também transforma ferro, chumbo ou qualquer coisa
inferior em ouro, a pedra-de-toque de Krishna é täo poderosa que o tipo mais
baixo de tudo dentro de nossa concepçäo recebe a mais alta posiçäo por Seu
toque mágico.
Raghunatha Dasa Goswami diz
que se fores incapaz de aceitar isto como verdade, entäo serás lançado para
baixo, no Vaikuntha: "Vai
viver ali, onde a lei geral impera, onde há relaçöes justas. Desça para a terra das relaçöes
equitativas, relaçöes simples, onde poderás calcular e continuar a viver mui
satisfatoriamente."
UM MENINO VAQUEIRO
Mas o mundo mais elevado de
Vrndavana é uma posiçäo por demais diplomática. Mesmo Mahadeva e Brahma ambos ficam confusos ao tentar
compreendê-lo. Perplexo por Krishna,
Brahma se rendeu a Ele e confessou:
"Como eu poderia saber que a verdade mais elevada era um menino
vaqueiro com uma vara sob o braço e um bocado de alimento em Sua mäo,
procurando por Seus amigos?"
Brahma disse: "Tenho
alguma intimidade com meu pai Narayana; sempre que surge alguma dificuldade, me
aproximo Dele para obter alguma instruçäo e depois ajo de acordo. Mas nunca entrei em conecçäo com
qualquer poder supremo como esse.
Um menino vaqueiro tomando Seu alimento numa mäo e com uma vara na
outra, saindo em busca de Seus amigos - Ele é o mais elevado? É inconcebível. Mas agora vejo que estás bem acima de
meu pai Narayana. Vaikuntha é um
campo justo e legítimo que conhecemos.
Porém nunca experimentamos tais passatempos de diplomacia obscura e
cheia de tato. Näo podemos ser
censurados por näo termos consciência de que esse tipo de coisa está
acontecendo na regiäo mais elevada.
É maravilhoso e oculto, obscuro.
E no entanto existe um plano onde tanta opulência e doçura säo
desconhecidas por nós."
Thomas Gray certa vez escreveu:
"As escuras cavernas
inexploradas do oceano contém muitas jóias cheias de raios os mais puros e
serenos; muita flor nasce para ruborizar-se sem ser vista, e desperdiçar sua
doçura no ar do deserto."
- Elegia num
Cemitério Rural
Como é estranho descobrir
que o mestre de tudo é um ladräo.
Tudo está na posse Dele, e no entanto Ele Se torna como um ladräo. Todo mundo pertence a Ele, mas Ele faz
papel de um debochado. Os
passatempos de Krishna säo todos maravilhosos. Tudo pertence a Ele, entretanto Ele se comporta como um
ladräo, como um de nós. Esse é um
plano singular e um tipo peculiar de passatempo.
Ali, todos säo iguais, e
alguns podem até ser superiores. O
pai e a mäe do absoluto podem estar castigando-O, e o Senhor poderá estar
chorando. Aqui temos bhakti. Onde está bhakti? Qual é o sintoma de devoçäo pura? Onde a autoridade mais elevada se torna
submissa ao servo - isso é devoçäo.
Bhakta-paradinah: o mais elevado forçosamente foi
rebaixado para servir o devoto. A
devoçäo possui tal posiçäo singular e poder. Ksetra-hari prema
bhajana: a última aquisiçäo de
devoçäo é aquela que consegue controlar o Senhor Supremo e trazê-Lo
forçosamente ao devoto como servo amistoso. O mestre se rende ao servo.
O infinito está à disposiçäo
do finito. Podemos conceber
isto? Näo só isso, mas é feito
furtivamente de várias maneiras diplomáticas. Assim na consciência de Krishna, o finito alcança a posiçäo
mais suprema e impensável, quando o infinito vem para serví-lo. Tal posiçäo gloriosa e inimaginável
parece impossível. No entanto tal
impossibilidade pode se efetuar via devoçäo, raga, amor. O poder do
amor é inimaginável. Embora seja
impossível, o infinito é derrotado pelo finito. Qual é essa posiçäo inimaginável? Só pode ser alcançada através do amor.
E quäo adorável e precioso e
valioso é o amor! Para adquirir
uma gota desse amor, nenhum sacrifício é suficiente. Assim somos encorajados a "morrer para viver". E nesse sentido, a morte irrestrita é
adorável. Para obter tal amor
divino é o impossível do impossível, porém Mahaprabhu veio para nos dar
isso. Como Ele é magnânimo! Ele mesmo tomou a posiçäo de um
pesquisador mendigando de porta em porta:
"Alista teu nome. Vim
para recrutar todos para aquela regiäo mais elevada onde o infinito será um
escravo do finito. Tomo uma gota
desta coisa valiosa." É o
impossível do impossível, o inconcebível do inconcebível.
Portanto abandona teu hábito
de correr como um louco, e reuna e concentre toda tua força para progredir
nessa linha, de tentar ir para o templo do amor divino.
No Srimad-Bhagavatam 10.47.61, Udhava diz:
asam aho carana-renu-jusam aham
syam
vrndavane kim api gulma-latausadhinam
ya
dustyajam svajanam arya-patham ca hitva
bhejur mukunda-padavim
srutibhir vimrgyam
"As gopis de Vrndavana abandonaram seus
maridos, crianças, e famílias que säo muito difíceis de se renunciar, e
sacrificaram até mesmo seus princípios religiosos para tomarem refúgio aos pés
de lótus de Krishna, os quais säo buscados até mesmo pelos próprios Vedas. ó, conceda-me a fortuna de tomar
nascimento como uma folha de grama em Vrndavana, para que eu possa tomar a
poeira dos pés de lótus destas grandes almas sobre minha cabeça."
O risco aumenta o humor do
amor. É uma parte necessária da
forma mais elevada do amor:
arriscar assim chamadas realizaçöes mundanas. A busca do amor divino deve ser empreendida mesmo arriscando
tanta assim-chamada pureza deste mundo.
Isso comanda a posiçäo mais elevada. Ainda assim, deve ser empreendida com muito cuidado. Deve seguir a linha da humildade
mostrada por Newton, que era considerado pelos cientistas contemporâneos de sua
época como sabendo tudo. Ele
disse: "Näo sei
nada." Isso é o caminho da
devida realizaçäo. Quanto mais se
estiver em meio à genuína pureza, tanto mais se pensará "Sou
impuro." Essa é a natureza da
medida infinita. Porque o encanto
é täo infinito, näo se consegue estimá-lo a näo ser desta maneira.
Quanto mais alcançam, mais
anseiam, mais sinceridade se encontra dentro deles. Essa é a característica da realizaçäo do infinito. Quanto mais se progride, mais se
acredita estar desamparado para ir adiante e medir. Nenhuma parte do infinito entra no plano da medida.
mukam karoti vacalam
panghum
langhayate girim
yat krpa tam aham vande
sri gurun dina-taranam
Näo conseguimos compreender
o infinito; näo nos achamos qualificados para fornecer nenhuma expressäo sobre
isto, portanto ficamos mudos, pensando:
"Que direi?"
Porém Ele nos faz falar, Ele nos faz abrir nossas bocas. Senäo o leitor, o conhecedor, fica
mudo.
Uma pessoa buscadora
fidedigna fica muda diante das maneiras de Krishna. Näo consegue dar expressäo a isso. Porém o poder de cima desce e faz com que faça alguma
declaraçäo. Dessa forma, a verdade
daquela parte chega até aqui. Ela
começa a falar, dar vazäo a seus sentimentos, pressionada pelo plano mais
elevado, aquela entidade mais elevada.
Ela näo possui nenhum poder próprio de caminhar, mas o maravilhoso poder
do Senhor pode auxiliá-la a atravessar montanhas. Essa é a natureza da graça do todo-poderoso, do
absoluto: por Seu poder, tudo pode
mover-se e viver. Yato va imani bhutani jayante, yena jatani
jivanti, yat prayanty abhisamvisanti:
"Ele é a causa da produçäo, sustento, e novamente retraçäo. Evoluçäo, dissoluçäo, e sustentaçäo no
meio. Ele é a causa primordial,
universal."
Estamos brigando numa terra
estrangeira por ganhos fictícios.
Porém Krishna esta ocupado numa busca amorosa por Seus servos há muito
perdidos. Ele quer salvá-los e
levá-los todos para o lar. Somente
pela graça desse absoluto é que é possível. Uma onda está vindo de lá para nos levar de volta para casa,
aonde tudo finalmente entra. Tudo
que é criado desaparece na existência sutil na dissoluçäo total deste
mundo. Mas novamente com uma nova
evoluçäo aparece. E alguns entram
na lila permanente e näo retornam a
esse mundo de exploraçäo e renúncia.
BUSCA POR KRISHNA
Devemos indagar sobre
Krishna. Mas primeiro devemos
indagar: "Quem sou eu? Onde estou? De que maneira devo movimentar-me para me aproximar do
domínio mais elevado?"
Estamos sempre perguntando, mas por que tipo de coisa? Agora devemos abrir nossos coraçöes bem
e indagar sobre Ele. Essa é nossa
necessidade espantosa. Näo podemos
evitá-la. E o que essa indagaçäo
contém, näo podemos prever o nível de pensamento. Brahman, Paramatma, Bhagavan. Indagar sobre Brahman é o mais elevado: a busca por Sri Krishna, a Realidade, o
Belo.
É uma necessidade natural
dentro de nós, em nosso próprio interesse; näo podemos evitar. Um homem sensato que näo quer se
enganar näo pode evitar a busca por Sri Krishna. A coisa mais geral em nossa natureza é indagar pela
felicidade. Essa é a questäo geral
de todos seres animados. A busca
por Sri Krishna significa procurar por rasa,
a mais alta forma de êxtase.
Se nos examinarmos, veremos
e exclamaremos: "O quê que eu
fiz? Qual é minha
necessidade? E como estou passando
meus dias? Tenho que me
arrepender, chorar. Passei meus
dias inutilmente, sou um traidor de mim mesmo, estou cometendo suicídio. Minha verdadeira reclamaçäo é contra
mim mesmo e contra meus assim chamados amigos. Näo temos nada a fazer por aqui." Portanto, veja e chore; faça ou
morra! Progrida no caminho certo,
ou estarás convidando tua morte. O
teor geral da vida, de toda existência, da maneira mais científica, será este: Buscar por Sri Krishna, a Realidade, o
Belo. Essa é a meta mais elevada
näo só da humanidade, mas de toda criaçäo. E todos problemas se harmonizam e resolvem por meio disso.
Nenhuma reclamaçäo contra
esta tentativa pode ser normal. O
desvio dessa instruçäo geral, o chamado geral, é todo falso, desnecessário, e
injuriante. Esta é a verdade, a necessidade de todo mundo,
onde quer que haja vida. O mais
grandioso, extenso, e amistoso chamado a todos, ao mundo inteiro - o único
chamado amigável - é esse: "Marche
rumo a Krishna." É o único
chamado. Todos outros tópicos
devem ser silenciados, devem ser parados, e só este chamado permanece, o
verdadeiro bem-estar do mundo permanece.
Assim os Upanishads
dizem: yasmin vijnate sarvam idam vijnatam bhavati yasmin prapte sarvam idam
praptam bhavati." Indaga
sobre aquilo que ao ser conhecido, nada mais restará para conhecer. Tenta alcançar isso que quando obtido,
nada mais resta para obter."
Um amplo chamado inclusivo
está sendo emitido, e isso é realmente näo-sectarismo. Aparentemente os pensadores abnormais
pensam ser sectário. Mas para cada
pessoa de pensamento normal, é a coisa mais universal e geral que pode ser
repartida.
No presente estamos brigando
numa terra estrangeira por ganhos fictícios. Mas uma doce onda está vindo do alto para salvar-nos e
levar-nos todos para casa. Somente
pela graça da busca amorosa do Senhor por Seus servos perdidos é que isso é de
todo possível. E tudo que se
espera de nós é juntarmo-nos à busca por Sri Krishna e marcharmos rumo ao
domínio divino. Vamos juntar-nos à
marcha universal rumo ao domínio divino, salvar-nos, e retornar ao lar, de
volta para Deus.
* * *
BELEZA E AMOR
O anseio mais íntimo de toda alma viva é pela beleza, amor, afeiçäo, e
harmonia; näo pelo poder, conhecimento, ou qualquer outra coisa. Este é o diagnóstico de toda criaçäo no
tempo e espaço: a causa em comum é
uma só. Mas é raro que uma alma
chegue a um estágio täo claro de anseio pela realidade, a ponto de entender
este ponto. Encontramos poucas
almas neste mundo que estäo realmente conscientes de sua necessidade mais
íntima, que percebem:
"Queremos Krishna!
Queremos Vrndavana!"
DEVOÇÄO LIVRE DO CONHECIMENTO
bhidyate hrdaya-granthis
chidyante sarva-samsayah
ksiyante
casya karmani
mayi drste'khilatmani
"Nossa aspiraçäo
interna por rasa, êxtase, está
sepultada em nossos coraçöes que estäo amarrados e selados. Porém ouvir e cantar as glórias de
Krishna arrebenta o selo do coraçäo e permite que este acorde e se abra para
receber Krishna, o reservatório do prazer, o próprio êxtase em pessoa."
Aqui, o Srimad-Bhagavatam está dizendo: "Existe um nó em nossos coraçöes, mas este nó será
arrebentado pela consciência de Krishna.
Naquele momento, o fluxo de nossa tendência inata pelo amor divino (svarupa shakti) irá inundar o coraçäo
inteiro. Quando o nó do coraçäo é
arrebentado, entäo, enquanto a alma adormecida acorda, o conceito Goloka de
dentro irá emergir e inundar todo seu ser."
Mas isto aparentemente é um
problema difícil. Como é possível
que todas nossas dúvidas possam se aclarar? É possível ao finito conhecer tudo? Esta declaraçäo parece um tanto
inconsistente. Parece
absurda. Os Upanishads no entanto, dizem:
"Quem O conhece, conhece tudo; quem O alcança, obtém
tudo." Como o finito saberá
que tem tudo, que chegou a conhecer tudo?
Parece absurdo, porém é confirmado nas escrituras. E se este problema for resolvido, entäo
todos problemas säo resolvidos automaticamente. O finito perceberá a satisfaçäo integral; todas suas
tendências perquiridoras ver-se-äo satisfeitas. Isso é confirmado näo só nos Upanishads, mas também no Srimad-Bhagavatam.
No início logo que cheguei à
Gaudiya Math, me misturava aos devotos com muito cuidado. Eu pensava: "Eles dizem que o que ensinam é a
única verdade e que tudo o mais é falso - essa é uma pílula amarga de se
engolir. Eles dizem: "Todo mundo está sofrendo de
ignorância. E o que nós dizemos é a coisa certa." Pensei: "O que é isso!
Uma pessoa sensata näo pode engolir facilmente tal pílula." Eu também näo conseguia digerí-la täo
facilmente a princípio. Mas o que
eles estavam dizendo foi confirmado por Sri Chaitanya Mahaprabhu, Srimad-Bhagavatam, Bhagavad-gita, e os Upanishads. Todas essas autoridades dizem: "Sim, é assim mesmo. Se O conhecer, se conhece tudo o mais. Se O alcançar, se obtém tudo o
mais."
Srimad-Bhagavatam 4.31.14, num verso similar ao da linha acima dos Upanishads, também diz que todas dúvidas säo aclaradas por
consciência de Krishna, e como resultado, chegamos ao real conhecimento. Ali está escrito:
yatha taror mula nisecanena
trpyanti tat-skandha-bhujopasakhah
pranopaharac ca yathendriyanam
tathaiva
sarvarhanam acyutejya
"Regando-se a raiz de
uma árvore, todas folhas e galhos automaticamente säo nutridos. Semelhantemente, por suprir alimento ao
estômago, todos membros do corpo säo nutridos. Da mesma maneira, se satisfizermos o conceito central do
Supremo Absoluto, todas nossas obrigaçöes säo automaticamente realizadas."
Se colocamos alimento no
estômago, o corpo todo é alimentado.
Se derramamos água na raiz da árvore, toda árvore é nutrida. Da mesma maneira, se fizermos nosso
dever para com o centro, entäo tudo está feito. Essa é a grandeza, a posiçäo misteriosa do centro
absoluto: Ele possui controle
sobre o todo completo. Esta é a
peculiar posiçäo do centro no sistema do todo orgânico.
Se determinada posiçäo do
cérebro for capturada, entäo todo corpo é controlado: uma agulha naquela seçäo em particular do cérebro, e todas
funçöes do corpo seräo paralizadas.
A posiçäo peculiar do centro absoluto é algo assim como isso. Assim o impossível se torna possível.
Suponhamos que eu seja uma
pobre moça que näo tem nada.
Normalmente näo seria possível adquirir qualquer coisa. Mas se eu casar com um homem rico que é
dono de uma grande propriedade, posso ter o comando sobre muitas coisas através
de minha relaçäo com ele. Embora
possamos ser pobres, nosso relacionamento com um paträo poderoso nos torna
senhores de muitas coisas. Da
mesma maneira, o Centro Absoluto controla tudo, e nosso relacionamento afetuoso
com Ele poderá nos dotar do comando sobre muitas coisas. É assim que é possível para a alma
finita tomar posse de tudo - através do elo sutil da afeiçäo.
Através de Krishna tudo é
possível. E quanto mais nos
aproximamos Dele, mais pegaremos.
Sua influência inspira Seus devotos, e todas Suas qualidades preenchem seus coraçöes (sarva maha-guna-gana vaisnava-sarire,
krsna-bhakte krsnera guna sakali sancare - Chaitanya-caritamrta,
Madhya-lila 22.75. Dessa maneira,
embora näo seja ele mesmo um senhor, através do elo do amor poderá ser senhor
de qualquer coisa. Essa é a linha
de pensamento explicada pelo Srimad-Bhagavatam
e os Upanishads.
Sem ter uma verdadeira
conecçäo com o centro absoluto, tuas tentativas de conhecer tudo seräo
inúteis. Se tentares conhecer
mesmo uma partícula de areia, passaräo vidas e vidas, milhöes de vidas passaräo,
e continuarás a analisar a areia, näo encontrando o final de tentar compreender
mesmo uma partícula.
O CENTRO ABSOLUTO
Ensinam-nos: "Se quer indagar - indaga sobre o
centro. Esse é o chamado dos Upanishads: näo desperdiça teu tempo tentando analisar a menor parte
desta criaçäo, buscando ser o senhor da mesma; näo é possível. Tua indagaçäo deve se orientar
devidamente. Krishna diz: Eu sou o centro, e digo: Conheça-Me e através de Mim conseguirás
conhecer tudo porque conheço tudo e controlo tudo. Tua conecçäo Comigo poderá dar-te essa capacidade. Aproxima-te de tudo através de
Mim. Aí serás capaz de conhecer a
devida posiçäo de todas coisas.
Senäo conhecerás somente um aspecto parcial da realidade, e isso será
externo e incompleto. E passarás
milhares de vidas tentando conhecer e entender a realidade sem nenhum
fim." O Bhagavatam diz:
athapi te deva padambhuja-dvaya-
prasada-lesanughrita eva hi
janati tattvam bhagavan mahimno
na canya eko'pi
ciram vicinvan
"Somente quem é
abençoado com a misericórdia do Senhor pode conhecer Sua verdadeira
natureza. Por outro lado, aqueles
que tentam empiricamente entender Suas inconcebíveis glórias podem estudar e
especular para sempre sem chegar à conclusäo acertada."
Aqui, através do Bhagavatam, Krishna nos fala: "Podes devotar-te por uma
eternidade numa direçäo errônea, sem nenhuma possibilidade de chegar ao final
do entendimento. Mas se tentares
aproximar-te do centro absoluto, entäo instantâneamente poderás conhecer o que
é o quê." Essa é a orientaçäo
dada pelos Upanishads e Srimad-Bhagavatam, essa é a direçäo que
devemos tomar, e isso é devoçäo.
É täo satisfatório que uma
vez que tenha alcançado isso, näo ligarás para conhecer mais coisa alguma. Precisamos apenas concentrar-nos no
serviço a Krishna. O Srimad-Bhagavatam 10.14.3 declara:
jnane prayasam udapasya namanta
eva
jivanti san-mukharitam bhavadiya vartam
sthane sthitah sruti-gatam
tanu-van-manobhir
ye prayaso
'jita jito 'py asi tais tri-lokyam
"Detestávelmente
abandonando todas tentativas de compreender a Suprema Verdade, aqueles que
desejam realizar-Te devem render-se completamente a Ti. Devem ouvir de devotos auto-realizados
sobre Teu santo nome e passatempos transcendentais. Em qualquer que seja a situaçäo em que se vejam, devem
progredir dedicando plenamente sua mente, corpo, e palavras a Ti. Dessa maneira o infinito, que nunca é conquistado
por ninguém, passa a ser conquistado por meio do amor."
Só conseguimos aproximar-nos
do Senhor Supremo através da submissäo, e quando o alcançarmos, nem ligaremos
para conhecer mais nada. Näo
ligaremos para o que está acontecendo ou näo, no mundo exterior. Nos ocuparemos profundamente no serviço
Dele para Sua satisfaçäo. Ali, no
Seu serviço, descobriremos preenchido o objetivo de nossas vidas. E esse conhecimento externo das
"coisas lá fora" parecer-nos-á entulho. Perceberemos:
"Qual a necessidade de desperdiçar tempo com toda sorte de cálculos
- o néctar está aqui! É muito mais
profundo do que o que se encontra no plano externo." E naquele momento, voltaremos toda
nossa atençäo para o Seu serviço.
Frequentemente se pergunta
porque varnashrama-dharma, o sistema
de estratificaçäo social védico, foi ignorado por Sri Chaitanya Mahaprabhu, e
porque é que qualquer pessoa de qualquer posiçäo social é aceita por nossa
escola devocional. Temos que
atravessar as restriçöes do sistema de casta (varnashrama-dharma), oferecendo os resultados de nosso trabalho a
Krishna (krsna karmarpanam), devoçäo
misturada com o desejo de desfrutar dos frutos do trabalho (karma-mishra-bhakti), e devoçäo
misturada com desejo de desfrutar da liberaçäo (jnana-mishra-bhakti).
Tudo isso foi rejeitado por Sri Chaitanya Mahaprabhu. Seu slogan era eho bahya age kaha ara:
"Estas coisas säo externas; vá mais fundo, aprofunda-te." Quando Sri Chaitanya Mahaprabhu
perguntou o que estaria mais além e mais acima de todos esses diferentes
conceitos de teísmo, Ramananda Raya sugeriu jnana-sunya-bhakti,
devoçäo sem misturas, pura. Quando
isso foi sugerido por Ramananda Raya, Mahaprabhu disse: "Sim, aqui começa o verdadeiro
teísmo."
KARMA E JNANA
Isso significa que karma, trabalho fruitivo, e jnana, o cultivo do conhecimento, säo
desnecessários. Pode-se começar
uma vida de bhakti independente de karma e jnana - a partir de qualquer posiçäo. Bhakti só precisa
ser desenvolvida através de sukrti,
piedade devocional acumulada, e através de ruci,
nossa sinceridade e ânsia por Krishna.
Isso é o que é necessário, e
näo nossa aspiraçäo por conhecer qualquer coisa e tudo (jnana) ou de termos tanta energia sob nosso controle (karma). Essas duas sendas nos levam à exploraçäo e renúncia. Porém onde quer que se esteja, se
quisermos entrar em contato com o Senhor, precisamos ter apenas um pouco de
inclinaçäo por ouvir sobre Ele de uma devida fonte, um verdadeiro santo. E assim, pode-se principiar na escola bhakti independente de qualquer posiçäo
no sistema social de varnashrama.
Para se tornar consciente de
Krishna, näo é preciso ser um homem sábio, nem um homem muito energético, nem
ser senhor da opulência e poder - o único requisito exigido é que se tenha um
anseio sincero pelo Senhor. Deve-se
encontrar alguma doçura, algum sabor em Suas palavras e Seus assuntos ao
ouví-los de uma fonte certa - um genuíno santo. Esse sabor gradualmente levará mais e mais além para dentro
do domínio mais elevado.
Se querem ser bem sucedidos
em sua busca pelo infinito, os buscadores do conhecimento e poder, os jnanis e karmis, afinal teräo de abandonar seus apegos, libertarem-se de seu
círculo, e chegar a essa posiçäo.
Teräo de depender do sabor.
Gosto é tudo. Um gosto por
Seus assuntos é a qualificaçäo de importância total para um devoto. É o todo de tudo. Onde quer que se esteja näo
importa. Através de seu gosto por Krishna,
a pessoa progredirá de ruci até a
meta final da vida.
Por isso somos
advertidos: "Abandona tudo, e
mesmo rejeitando todos conceitos de sociedade e religiäo como sendo externos,
rende-te exclusivamente a Krishna."
Sem hesitar, devemos tomar refúgio exclusivo do Senhor com plena
confiança, deixando de lado a má associaçäo, e até mesmo negando os princípios
regulativos que governam a sociedade e religiäo. Isto é, devemos abandonar todo apego material. Sharanagati: Tomar refúgio sob Sua proteçäo
absolutamente.
A TREPADEIRA DA DEVOÇÄO
Um devoto pensa: "Krishna é muito, muito doce. Näo posso evitá-Lo, näo consigo viver
sem provar Sua doçura." Esse
sentimento é a verdadeira semente que pode produzir a trepadeira de bhakti, a trepadeira da devoçäo. E esta gradualmente crescerá até que
toque os pés de Krishna.
A trepadeira crescerá e no
entanto näo tentará encontrar apoio em qualquer lugar dos planos de consciência
dentro desse mundo, porém crescerá mais e mais alta. Finalmente quando chegar ao conceito pessoal do Absoluto,
experimentará algum tipo de satisfaçäo.
Ainda assim, näo parará por aí.
Irá subir para Goloka. Näo
irá parar na devoçäo calculista de Vaikuntha. Atravessando aquele plano, ascenderá ao estágio da devoçäo
espontânea, automática.
DE VOLTA PARA DEUS
Ali encontrará o Senhor do
Amor. Amor é o fator de veneraçäo
e adoraçäo em todo aquele plano. A
característica essencial daquele reino é a relaçäo de amor divino com o objeto
central. E nós encontraremos nossa
realizaçäo ao conseguirmos serviço em determinada posiçäo em relaçäo a Ele. É isso que todo mundo precisa: entrar na terra do amor e obter alguma
ocupaçäo no serviço amoroso da representaçäo central de doçura absoluta, beleza
e amor. E esse centro absoluto
mais elevado adveio como Sri
Chaitanya Mahaprabhu a fim de convidar Seus servos há muito perdidos a
retornarem para a casa Dele, dizendo:
"Vim para convidá-los e levar todos para Meu lar - venham
Comigo!" Que oportunidade
afortunada temos! Ao aceitarmos
Sua proposta de conseguirmos ingressar nessa linha, quäo felizmente poderemos
retornar ao lar, de volta para Deus.
Essa é a própria essência de
todas religiöes. Consciente ou
inconscientemente, cada alma está buscando o amor divino. Ainda assim, diferentes variedades de
obstáculos estäo vindo para nos dissuadir de nossa campanha. Porém o coraçäo
näo ficará satisfeito a näo ser que chegue até lá. Uma vez começada, nossa jornada rumo a Krishna nunca poderá
ser detida em lugar algum. Será
meramente uma questäo de atraso; um longo, longo tempo, eras e mais eras
poderäo passar, mas nosso sucesso final näo poderá ser obstado.
Somente Krishna consegue nos
atrair realmente. Näo conseguimos
apreciar nada mais a partir do fundo de nosso coraçäo e aceitar isso como nosso
destino final. Apenas queremos
beleza e amor, näo poder e conhecimento.
MENDIGOS DE AMOR
Poderá parecer que queremos
poder. As vezes pensamos que temos
que ter tudo; queremos essa capacidade controladora. Queremos que tudo passe a ficar sob nosso controle, que
qualquer coisa que queiramos se realize.
Mas isso näo é o que realmente queremos. Poderá parecer que queremos poder, mas afinal o poder näo
consegue nos satisfazer. E às
vezes poderemos pensar que queremos saber tudo. Pode ser que näo queiramos o poder de controle sobre tudo,
mas queremos saber tudo; näo gostamos de ser ignorantes. Porém isso também näo é a meta final
que poderá satisfazer nossa necessidade interna. Isso näo é o que realmente queremos. Temos que nos tornar inteirados quanto
à nossa verdadeira necessidade - a busca interna de nossos coraçöes. Se o fizermos corretamente,
descobriremos que somos todos mendigos de amor e afeiçäo. Adoraçäo é a necessidade mais íntima em
todo lugar. E isso só pode ser
completamente satisfeito nos passatempos de Krishna em Vrndavana.
Esta conclusäo foi divulgada
por Vedavyasa, o compilador das escrituras védicas. Mesmo estudiosos contemporâneos admitem que Vedavyasa tem
disseminado todas possíveis linhas de pensamento filosófico nos Vedas, Puranas, Mahabharata e Vedanta-sutra. E em seus últimos dias, na sua maturidade filosófica, ele
deu o Srimad-Bhagavatam, o qual
culmina no conceito do amor divino, krishna-prema.
"QUEREMOS KRISHNA"
O anelo mais íntimo de cada
alma vivente é pela beleza, amor, afeiçäo, e harmonia, näo pelo poder,
conhecimento ou qualquer outra coisa.
Este é o diagnóstico da criaçäo inteira no tempo e no espaço: a causa em comum a todos é uma só. Porém é raro uma alma chegar a um
estágio täo claro de anseio pela realidade, a ponto de entender este ponto. Encontramos poucas almas nesse mundo
que estäo realmente conscientes de sua necessidade mais íntima, que
compreendem: "Queremos
Krishna! Queremos
Vrndavana!". Tais almas
sinceras näo se encontra facilmente.
Isso é mencionado em muitos lugares na escritura (Manusyanam sahasresu...narayana parayana...brahmanam sahasrebyo...).
Só existe uma meta - näo é
preciso muitas - sómente uma, aquela
meta, aquela que estamos querendo, e que é uma relaçäo de amor divino.
Uma compreensäo intelectual
da consciência de Krishna é impossível.
Assim como uma abelha näo consegue provar mel lambendo o exterior de uma
jarra de vidro, näo se pode entrar no domínio do espírito mais elevado através
do intelecto. Como súditos somos
subordinados ao Senhor Supremo.
Portanto deve haver seva,
serviço. Seva é o fator todo-importante. No Bhagavad-gita
menciona-se que pranipata, aproximar-se
respeitosamente, pariprasna, indagar
sinceramente, e seva, uma atitude de
serviço, säo necessários para
entrar no domínio do amor divino.
Somente através do serviço Krishna ficará satisfeito e descerá, e só
entäo conseguiremos entender a natureza do plano superior. Isso é conhecimento védico.
Somos tatastha-shakti, potência marginal, e se quisermos conhecer
qualquer verdade a respeito da realidade superior, devemos compreender que esta
é mais sutil que nossa existência, que é supra-subjetiva. Ela pode nos tocar porém nós näo
conseguimos subir até esse domínio por nossa própria doce vontade. Somente se recebermos a graça que pode
nos fazer subir, é que o conseguiremos.
Quem tiver esta compreensäo
conseguirá combater todos intelectualistas existentes. O intelecto näo tem capacidade para
entrar na área subjetiva superior.
Esta suprema verdade é atindriya-manasa-gocarah: além do plano dos sentidos, mente, e
intelecto. Esta expressäo manaso vapuso vaco vaibhavam tava gocarah
de Brahma, admitindo para Krishna que Ele estava além do alcance de seu corpo,
mente e palavras, näo foi só uma declaraçäo insincera superficial. Se quisermos conhecer a verdade
absoluta, a única condiçäo para realizá-Lo é uma atitude submissa. Dessa maneira, Ele poderá ficar
satisfeito com nossa tentativa e revelar-Se a nós. Revelaçäo divina näo é uma questäo de pesquisar dentro deste
mundo - devemos ter um coraçäo sincero para servir.
Os cientistas estäo
descobrindo tantas coisas maravilhosas.
Porém essas coisas já estäo ali?
Ou seriam os cientistas os criadores? Essas verdades maravilhosas já estäo ali. Só que algumas estäo sendo descobertas. Näo é criaçäo dos cientistas, logo eles
näo säo superiores a essas verdades.
E em todo caso, só conseguem saber uma parte delas, e mesmo isso com
algum esforço. Porém a natureza
consciente da realidade, a razäo superior da divindade, é desconhecida deles,
embora possam continuar a pesquisar, e pesquisar. O que quer que encontrem é apenas cobertura externa, näo o
verdadeiro espírito, a substância.
Na te viduh svartha-gatim hi
visnum. No Srimad-Bhagavatam 7.5.30 está escrito:
matir na krsne paratah svato va
mitho 'bhipadyeta grha-vratanam
adanta-gobir visatam tamisram
punah punas carvita-carvananam
O Srimad-Bhagavatam nos fala que podemos tentar entender o mundo da
realidade superior através do intelectualismo, mas haveremos de voltar
perplexos por nossas tentativas.
Se tentarmos pressionar a entrada nesse domínio por meio de nossa
inteligência, voltaremos insatisfeitos e desanimados, e vagaremos aqui neste
mundo mortal repetidamente. O
mundo da experiência sensorial irá e virá
através de suas diferentes fases, mas näo consegue entrar naquele plano
espiritual. Para entrar naquele
mundo, o único requisito é submissäo a um agente real da divindade. Este poderá revelar o processo, e se
pudermos aceitar isso, conseguiremos entrar naquele mundo; senäo teremos que
vagar neste mundo de experiência sensorial.
Alguns estudiosos pensam que
conhecimento é de importância primordial.
Segundo estes, se quisermos entrar naquele reino, devemos primeiro
adquirir conhecimento através da erudiçäo e depois tentar o amor. Acham que através do conhecimento
sozinho, podemos compreender o que é o amor divino, e entäo poderemos conseguir
ingressar naquele domínio. Näo
aprovam a idéia de jnana-sunya-bhakti,
ou "devoçäo livre-de-conhecimento".
Certa vez, o fundador do
Bharat Seva Ashram Sangha queria que eu me juntasse à missäo dele. Disse-lhe: "Minha cabeça já foi comprada pelos ensinamentos de Sri
Chaitanya-deva." Ele disse: "Sim, também O reverencio, mas
digo que primeiro deves aprender a indiferença ao prazer mundano, conforme
pregava Buda. Entäo poderá vir a
estudar o Vedanta de Shankara,
entender o que é conhecimento propriamente dito, e realizar que este mundo todo
é nada, e Brahman, espírito, é tudo.
Entäo poderá aproximar-se do prema-dharma,
o amor de Sri Chaitanyadeva, que também acho que é o mais elevado objeto de
realizaçäo." Retruquei: "Você diz isso, mas Sri Chaitanyadeva näo disse que deveríamos ir à
escola Budista para aprender abnegaçäo e depois para a escola Shankarista
adquirir conhecimento Vedantista antes de conhecê-lo. Ele disse que onde quer que estejamos, devemos obter a
associaçäo de um verdadeiro santo Vaisnava e continuar com sravana-kirtana, ouvir e cantar as glórias do Senhor." Esse homem quedou-se mudo. Näo conseguia falar; foi silenciado.
De outra feita, o presidente
da Arya Samaj veio ver-me em Karachi e disse-me que: "Se o finito pode conhecer o Infinito, entäo Ele näo é
infinito." Repliquei: "Se o Infinito näo puder dar-se a
conhecer ao finito, entäo Ele näo é infinito." Näo conseguiu responder ao meu argumento.
TODOS DIREITOS RESERVADOS
Portanto näo é através de
qualquer qualificaçäo por parte do nosso lado que o absoluto pode ser
percebido. A quem quer que Ele
decida Se dar a conhecer, este O conhecerá. Isso é explicado nos Upanishads: Ele näo pode ser conhecido através de palestras
ou discussöes, por meio de memória afiada ou vasta inteligência, ou pela
genialidade ou intelecto sobrenatural.
Pode-se ter estudado extensamente todas escrituras reveladas, porém isso
näo é qualificaçäo. Krishna
reserva toda independência para o Seu lado. Só existe um jeito pelo qual Ele pode ser conhecido: a quem quer que Ele decida Se dar a
conhecer, tal pessoa poderá conhecê-Lo.
De outra maneira todos direitos estäo reservados ali por Sua doce
vontade.
Como podemos atrair Sua doce
vontade? Eis a questäo. Como poderemos agarrar Sua doce
vontade. Isso só pode ser feito
através de sharanagati, rendiçäo,
aumentando nosso lado negativo.
Devemos pensar: "Sou
täo pobre; sem Tua graça, näo posso viver." Devemos pensar assim para tentar despertar misericórdia
dentro do coraçäo Dele. Devemos
apelar para a compreensäo Dele de que estamos com extrema necessidade Dele e
que sem Sua graça näo conseguimos viver.
Somente tal tipo de sentimento sincero de necessidade consegue atrair
Sua atençäo para nós. Senäo näo
temos nenhuma possibilidade de capturá-Lo. Portanto a abordagem negativa tem sido recomendada
para capturá-Lo. Nossa oraçäo
exclusiva é que somos muito necessitados e sinceros. Só isso pode atrair Sua atençäo para nós. E isso näo é uma opiniäo ou
especulaçäo, é um fato. É
realidade.
Uma vez conheci um sannyasi erudito em Badarikashrama que
posava como um ateísta no decurso de nossa discussäo. Ele argumentava:
"Qual é a evidência que Deus ou a alma existe?" Entäo citei um verso do Srimad-Bhagavatam 11.22.34:
atma parijnana-mayo vivado
hy astithi nastiti bhidartha-nisthah
vyartho 'pi naivoparameta pumsam
mattah paravrtta-dhiyam sva-lokat
Expliquei-lhe que embora atma, o espírito, seja auto-refulgente,
existe uma constante rixa entre dois partidos opostos. Um partido diz: "Deus existe!" O outro diz: "Deus näo existe!" O Srimad-Bhagavatam
diz que atma é auto-refulgente, mas
ainda assim verificamos que uma classe de homens diz: "Ele existe, podemos vê-Lo, Ele pode ser
visto." Esta rixa näo tem fim
porque um dos partidos näo tem olhos para ver o que é auto-evidente. Esta rixa é uma inútil perda de tempo,
mas ainda assim nunca irá terminar;
vai continuar para sempre.
Por quê? Porque existem
aqueles que tem olhos para ver Deus e aqueles que näo tem olhos para vê-Lo ou a si próprios. Uma dessas classes de homens desviou-se
da consciência de Deus. Há uma
barreira entre eles e a consciência de Deus, entre eles e a
auto-consciência. Logo a desavença
só irá continuar devido à ignorância deles.
Aqueles que tem olhos para
ver diräo: "O sol existe; ali
está o sol." E aqueles que
näo tem olhos diräo: "Näo,
näo, näo existe sol." Esse
argumento irá continuar para sempre, mas isso näo significa que o sol näo
exista. Ele pode se mostrar.
Com relaçäo a isso foi feita
uma analogia. Um menino nasce numa
masmorra, uma prisäo escura. E
cresce sem ter nenhuma experiência de luz solar. Um de seus amigos de fora da prisäo costumava vir e
visitá-lo. Certo dia, o amigo do
menino disse: "Vamos ver o
sol. Venha comigo, vou te mostrar." O menino replicou: "Sim, eu vou." Porém começou a levar uma lanterna
consigo. Seu amigo comentou: "Näo é necessário levar a
lanterna." O menino
disse: "O que está
dizendo! Pensa que sou
idiota? Alguém consegue ver alguma
coisa sem ajuda de uma lanterna?
Näo sou burro!" Entäo
seu amigo pegou o pela mäo à força e mostrou-lhe o sol. O menino disse: "Oh, isso é o sol! Por sua luz tudo pode ser visto."
A alma é assim. Deus é assim. Ele só pode ser visto através de Sua própria luz, e é só
através de Sua luz que podemos ver qualquer coisa. Ele é auto-refulgente.
Por meio de Sua própria luz Ele pode mostrar-Se a outrem. Ele é a fonte de todo
conhecimento. Este é o conceito
apropriado de Deus. Ele está
existindo automaticamente. Näo
pode ser visto pelo nosso conhecimento, assim como o sol näo pode ser visto com
auxílio de mais nenhuma outra luz.
Näo é necessário que tentemos adquirir consciência de Deus através do
intelecto ou conhecimento. O
conhecimento de Deus é independente.
Pode ir e vir por sua própria vontade. E se Ele vier a mim, tudo virá a mim. Porém nada pode forçá-Lo a colocar-Se
diante de nossa visäo. O sol näo
pode ser levado para dentro de nossa masmorra, mas é preciso que busquemos o
sol e vejamos as coisas pela graça dele; da mesma maneira, o Senhor é
auto-refulgente. Ele só pode ser
visto por Sua própria luz.
O intelectualismo é uma
desqualificaçäo. Estamos interessados
em jnana-sunya-bhakti, devoçäo livre
de conhecimento. Afeiçäo, atraçäo,
simpatia - estas coisas säo todas resultado de ter um coraçäo. Os cientistas acham que os animais näo
tem um cérebro verdadeiro, näo possuem nenhuma inteligência. Contudo vemos que até mesmo sem ter
muito cérebro, um animal consegue viver, porém sem um coraçäo, um animal näo
consegue viver, ninguém consegue viver.
Como o cérebro é uma representaçäo de um computador, os animais näo tem
um verdadeiro computador para calcular.
Animais podem seguir conhecimento intuitivo, e assim conseguem funcionar
inconscientemente. E podemos ver
que a intuiçäo pode ir além do cálculo cerebral. Tantas aves e bichos conseguem compreender que está para
ocorrer um terremoto, porém até agora, nenhum cálculo humano consegue
compreender precisamente quando irá acontecer um terremoto. Há muitas coisas que nosso cérebro näo
consegue sentir, näo consegue captar, ao passo que até mesmo os animais conseguem
receber algum indício de antemäo.
E após longa e profunda pesquisa, os homens näo conseguem encontrar o
que está além de sua razäo. A
posiçäo da razäo e do intelecto é explicada no Srimad-Bhagavatam 10.14.3:
jnane prayasam udapasya namanta
eva
jivanti san-mukharitam bhavadiya-vartam
sthane sthitah shruti-gatam
tanu-van-manobhir
ye prayaso
'jita jito 'py asi tais tri-lokyam
"Com ojeriza rejeitando
qualquer tentativa dentro da linha intelectual, devemos nutrir um espírito
submisso dentro de nós e tentar
viver nossas vidas em associaçäo com os tópicos sobre o Senhor. É claro que isso näo significa qualquer tópico sobre o Senhor; eles
devem advir de uma fonte genuína.
E näo importa que posiçäo tenhamos no momento. Quem quer que preste atençäo
sinceramente aos ensinamentos de Seus agentes divinos através do pensamento,
palavra e atos, pode conquistar a Ele que de outra maneira seria
invencível."
Esta é a senda da realizaçäo
recomendada pelo Srimad-Bhagavatam,
que condena a senda da realizaçäo intelectual:
sreyah srtim bhaktim udasya te
vibho
klishyanti ye kevala-bodha-labdhaye
tesham asau kleshala eva shisyate
nanyad yatha sthula-tushavaghatinam
"ó Senhor, aqueles que
desejam ter um conceito claro de Ti através do intelecto deles descobrem que
suas tentativas säo inúteis. Seus
esforços findam apenas em frustraçäo, tal como quem tenta pilar cascas de arroz
vazias." (SB 10.14.4)
Assim jnana, conhecimento, é como uma casca vazia. Energia e conhecimento säo apenas
aspectos externos. A verdadeira
substância, o arroz, é devoçäo - amor.
Isso é a coisa saborosa interna.
Outras coisas säo coberturas (jnana-karmady-anavrtam). Mas o que está dentro da cobertura tem
sabor, é eterno, auspicioso, e lindo:
satyam, shivam, sundaram. Beleza é a realidade, êxtase é a
realidade; tudo o mais é apenas uma cobertura externa. Se nos ocuparmos da cobertura, näo
conseguiremos obter a substância que está dentro. Entäo nossa vida se torna um desapontamento:
naiskarmyam apy
acyuta-bhava-varjitam
na shobate jnanam alam niranjanam
kutah punah shasvad abhadram ishvare
na carpitam karma yad apy akaranam
"Mera renúncia näo é
considerado como sendo realizaçäo na vida de ninguém. Embora no estágio da liberaçäo näo encontremos nenhuma
contaminaçäo de morte, nascimento, doença, e debilidade, ainda assim isso näo
pode ser considerado perfeiçäo.
Entäo que dizer de karma, uma
vida laboriosa de trabalho que näo é feito para a satisfaçäo de
Krishna?" SB 1.5.12
A única coisa que pode dar
realizaçäo tanto no trabalho quanto no descanso, é Krishna: Ele é o princípio harmonizador de
ambos. Se o trabalho for feito
como um serviço para Krishna, entäo nosso trabalho se converte em ouro: näo é mais ferro. E só se a renúncia estiver relacionada
ao serviço divino é que tem qualquer valor.
ADÄO E EVA
Aqueles que estäo sofrendo
devido ao trabalho árduo naturalmente querem descansar. Dependem do trabalho para viver, no
entanto achamo-lo inútil e indesejável:
se queremos viver, devemos trabalhar; ainda assim, é considerada uma
vida de desonra. Em geral nossa
aspiraçäo é por uma vida sem trabalho; estamos buscando uma vida tranquila de
descanso onde näo sejamos servos de nosso trabalho. Esta é a tendência geral em nossa vida de luta e trabalho.
Na Bíblia, Adäo e Eva
estavam rendidos a Deus no céu, e seu sustento era automático; quando caíram,
tiveram que ganhar seu päo pelo suor de suas testas. Foram forçados a labutar a fim de viver. E é uma forma de vida baixa e
desonrosa. Porém se queremos
viver, temos que trabalhar.
Pensamos: "Será que
existe uma vida que se possa viver sem trabalhar?" Encontramos tal tendência em nossa vida
desde o início da existência.
Portanto aspiramos por ficarmos livres do karma.
BUDA E SHANKAR
Mas a escola budista e
shankarita querem descobrir um lugar onde possamos viver sem trabalho. Buda diz que a própria vida é
desnecessária; que na realidade näo existe trabalho, nem vida, nem
existência. Segundo a escola
budista, podemos dispensar a existência.
É uma mania manter nossa existência no mundo agitado, portanto devemos
dispensar esta nossa existência.
Porque de fato deveríamos viver?
Assim os budistas advogam nirvana,
o cessar da existência.
E Shankaracharya diz: "É claro que há vida, porém esta vida näo é desejável. Estamos sempre sofrendo prejuízos, e há
uma força que está sempre nos diminuindo, e afinal morremos. A morte lenta nos desafia, veneno
lento." É verdade que a vida
no mundo da mortalidade é indesejável.
Entäo qual é a soluçäo?
Shankara diz que a tentativa de manter nosso próprio eu é individual é
indesejável. Näo existe
possibilidade de manter a individualidade e ao mesmo tempo desfrutar de
verdadeira paz, paz eterna.
Portanto vamos ter que abrir mäo do encanto da vida individual.
Segundo Shankara, existe um
só Espírito Universal, e esse é um conceito cheio de bem-aventurança. Somos meros reflexos dele. Esse Espírito reflete-se em tudo. De alguma maneira criou esse misterioso
ego ou consciência individual. Näo
devemos ficar muito ansiosos por manter esse ego individual; temos que dissolvê-lo. E quando isto for feito, descobriremos
que só resta Espírito.
Em nossa condiçäo atual näo
pode haver cura da doença da mortalidade.
A cada momento estamos nos perdendo de alguma maneira ou outra. Isso näo se consegue resolver. Porém Buda e Shankara proporcionaram
uma compreensäo apenas parcial.
Entretanto o Srimad-Bhagavatam
diz: "A devida soluçäo é
praticar abnegaçäo, desapego do meio-ambiente, vendo-o em relaçäo ao serviço de
Krishna. O conhecimento através do qual se obtém perfeiçäo enquanto mantém a
própria individualidade, interesse e perspectiva é possível apenas com bhakti, devoçäo, dedicaçäo. Pela exploraçäo tens que morrer. E pela abnegaçäo a pessoa se funde numa
espécie de zero (Viraja, Brahmaloka) nalgum lugar desconhecido, para nunca mais
se levantar dali novamente. Mas eu
recomendo o tipo de renúncia e conhecimento que é abraçado pela devoçäo,
dedicaçäo a Krishna. Se aceitar
isto, entäo seu eu interior, seu verdadeiro ser, pode viver para sempre uma
vida feliz."
Naiskarmyam significa nenhum sofrimento no trabalho. Um trabalho de amor é a funçäo inata da alma. Em nossa concepçäo comum, o trabalho
leva a uma reaçäo. Enquanto
trabalhamos as coisas diminuem e desaparecem, atacadas pela morte. Porém essas dificuldades foram
todas eliminadas pelas recomendaçöes no Srimad-Bhagavatam. Srimad-Bhagavatam advoga vairagya e jnana cingidas por bhakti,
uma vida de dedicaçäo. O Bhagavatam diz: "Livra-te da exploraçäo e da
renúncia. Näo terás de depender
delas. Elas podem ser absorvidas
pela dedicaçäo. Renúncia e
conhecimento säo completos na devoçäo, e ao mesmo tempo se pode manter a
individualidade."
O Srimad-Bhagavatam harmonizou conhecimento e renúncia suprindo a
própria vida de ambos na devoçäo.
Através da devoçäo, podemos manter nossa individualidade, nossa
atividade, nossa perspectiva, e ao mesmo tempo encontrar imensa paz e êxtase na
vida. O Srimad-Bhagavatam oferece-nos
uma vida feliz, eterna, simplesmente pela adiçäo de dedicaçäo a jnana e karma.
Irás trabalhar, ou
energizar; mas näo cairá sob a jurisdiçäo de karma, que tem uma reaçäo.
Sua energia será usada para o centro. O Bhagavad-gita
nos fala: "Trabalhem apenas
para o centro, ou ficaräo atados a uma reaçäo." Portanto foi esclarecido que uma vida muito saudável é
possível para nós, se nos dedicarmos ao centro mais elevado. Isso näo é nem desonra e nem cansa. Tampouco é ignorância. Portanto devemos tomar este caminho que
o Srimad-Bhagavatam nos recomenda.
Se estivermos atentos a isso
e tentarmos seguir o conselho que vem da fonte real, das pessoas
verdadeiramente santas, iremos nos ajustar devidamente; desenvolveremos uma
compreensäo correta. E tudo se
harmonizará. Quem tiver esta
realizaçäo será vitorioso diante de todas possíveis sugestöes ou conceitos de
conhecimento. Só pela devoçäo,
pela dedicaçäo a Krishna, podemos facilmente nos tornar livres da ignorância no
mundo do sofrimento.
Ser um devoto significa
servir; serviço é tudo. Nossa vida
correta encontra-se em dedicar-nos em auto-distribuiçäo, näo
auto-engrandecimento. Podemos
viver em serviço. Todas
dificuldades seräo removidas se nos ativermos à linha da dedicaçäo. Ali encontraremos tudo: nossa individualidade, o meio-ambiente
mais favorável, nossa perspectiva mais elevada. Apenas é preciso modificar nosso ângulo de visäo. E esse ângulo de visäo deve ser
adquirido através do centro. Seja
o que olharmos, devemos tentar estudar sua posiçäo de acordo com o centro. Devemos localizar ou calcular sua
posiçäo em relaçäo ao centro. E
com esse ângulo de visäo, obteremos alívio de tudo que é indesejável. Esse é o ensinamento do Srimad-Bhagavatam.
É essa a especialidade da
filosofia do Bhagavata. Sempre tenta estabelecer o conceito do
amor divino, sentimento divino, e da emoçäo divina acima do intelectualismo e
maestria sobre a energia. Os
mestres do poder e os mestres do conhecimento näo possuem valor algum se forem
destituídos do mestre do amor. Por
outro lado, se é possível para alguém destituído de conhecimento e poder entrar
na área do amor, sua vida tem sucesso.
Seu movimento näo é mais considerado trabalho reativo (karma), e seu conhecimento é
conhecimento real sobre Krishna (sambandha-jnana). Verdadeiro conhecimento sobre Krishna,
Sua parafernália, e quem é quem no mundo espiritual, näo está dentro da
jurisdiçäo do conhecimento que podemos obter conduzindo pesquisa científica. Näo é assim; realiza-se em si mesmo.
E Devarishi Narada foi até
Vedavyasa para recomendar-lhe:
"Deves introduzir isto mui claramente em teu livro novo. Nos Vedas
e Upanishads e no Mahabharata anteriormente trataste de
diferentes aspectos do conhecimento e do trabalho. Mas näo ficou täo claro. E agora bem clara e definitivamente deves descrever o
sucesso da vida em sua forma mais plena, independente de conhecimento e
energia." É possível
reinstalarmo-nos na nossa fortuna perdida, independente da energia e pesquisa
intelectual.
O SELO DO EGO
Apenas temos que quebrar o
selo do ego, e o fluxo natural de amor divino virá e automaticamente auxiliará
sua própria causa. Existe um
arranjo assim para nós, por meio do qual poderemos retornar ao lar. Näo vamos achar que é uma jornada
trabalhosa, entediante. Seremos
levados pela nossa atraçäo natural, independente de orientaçäo externa. A tendência dentro de nós pelo amor divino
consegue compreender seu próprio terreno; ela tem esse dom natural de
atraçäo. Haverá uma atraçäo
automática pelo nosso lar; nenhuma pesquisa científica é necessária.
Em vez disso, teremos que
parar com nosso intelectualismo, ambiçäo, e aspiraçäo. Näo é necessário. É uma corrida infrutífera. Nunca irá nos ajudar a chegar à
meta. O coraçäo irá rejeitar
isso. Näo haverá lugar para
qualquer suspeita. É uma seleçäo
infalível, natural, completa.
Assim, devemos tentar encontrar essa coisa natural que näo pode ser
adquirida como resultado de qualquer programa prolongado de pesquisa. É bastante natural. É só o artificialismo dentro da gente
que deve ser removido e despachado para sempre.
E as reaçöes que adquirimos
após tanto tempo em nossa falsa jornada iräo evaporar por si mesmas. Näo iräo apresentar nenhum
problema. Isso é certo. Näo haverá nenhuma reaçäo, e nenhuma
necessidade de descobrir qualquer nova descoberta ou invençäo. Uma vez obtida esta realizaçäo, veremos
que nossa "civilizaçäo-de-conhecimento-progressivo" é inteiramente
redundante.
Näo é necessário nenhum
intelectualismo. Assim como uma
criança conhece sua mäe, podemos reconhecer nosso verdadeiro lar. Em meio a tantas vacas, um bezerro
correrá para sua própria mäe. Tem
algum tipo de cheiro instintivo ou uma orientaçäo natural que os dirige. Da mesma maneira, nenhum esforço,
nenhuma investigaçäo, nenhum experimento ou suspeita säo necessários. Devoçäo a Krishna é automática,
natural, feliz, e espontânea. É
uma vida espontânea, um fluxo automático, um movimento natural.
Nosso verdadeiro interesse é
amor. Amor é independente de
tudo. É a substância mais interna
de nossa existência. "Tenta
mergulhar profundamente na realidade" nos recomendam. "Mergulha fundo na realidade, e
encontrarás teu lar ali naquele reino divino. És filho daquele solo." Esta é a mensagem do Srimad-Bhagavatam
e Sri Chaitanya Mahaprabhu. E isso
näo é um conceito muito parco, um sonho abstrato ou nebuloso, mas é a realidade
mais intensa e concreta.
Sri Chaitanya Mahaprabhu
demonstrou isso por Seu caráter, por Sua busca täo intensa por Sri Krishna, e
pelo modo intenso e profundo com que Ele Se ocupou na lila de Krishna, ignorando tantos fatos que parecem concretos no
mundo exterior. Esquecendo de
tudo, desprezando tudo que é täo importante para nós, Ele negligenciou todas
outras funçöes e consideraçöes do dever.
Ele Se ocupou em krishna-lila
täo profunda e intensamente - mergulhando fundo nela - que capturou Seu coraçäo
inteiro tanto, que externamente Se achava incapacitado.
* * *
Rupa Goswami Prabhupada diz que o nome, forma, qualidades e associados
eternos de Krishna - tudo em torno Dele - näo é mundano, porém puramente
espiritual. Isso näo pode ser
percebido por nossos sentidos grosseiros.
Simplesmente por vibrar o som krishna,
nossas línguas näo conseguem produzir Krishna, nossos narizes näo conseguem
capturar a fragrância transcendental de Seu corpo, nossos olhos näo conseguem
ter uma visäo de Sua bela figura que é supramental. Isto é verdadeiro näo só para nossos sentidos físicos, mas
também para a mente. Nossas mentes
näo conseguem conceber Krishna.
Ele é transcendental e supramental. Sua existência transcende todo conhecimento que possuímos.
O SANTO NOME
Para ser efetivo, o som do
santo nome de Krishna deve ter uma qualidade divina. O santo nome de Krishna que é infinito, pode acabar com tudo
de indesejável dentro de nós; porém o nome deve ser investido de um conceito
espiritual real. Näo deve ser
apenas uma mera imitaçäo física produzida apenas com auxílio dos lábios e da
língua. Esse som näo é o santo
nome. Se for para ser genuíno, o
santo nome de Krishna, Hari, Vishnu ou Narayana deve ser vaikuntha-nama: deve
ter existência espiritual, fundamento divino. Esse princípio é tudo ao vibrarem o santo nome.
Estamos interessados na
vibraçäo sonora que tem profundidade espiritual. A imitaçäo física do santo nome näo é o devido nome; näo é shabda brahma, som divino. Apenas som de imitaçäo poderá advir do
plano do conceito mundano. O santo
nome de Krishna significa som divino; deve ter algum fundamento
espiritual. Algo espiritual deve
ser distribuído através do som físico.
No caso de uma cápsula de
remédio, a cápsula näo é o medicamento; o remédio está dentro. Externamente, uma cápsula poderá
parecer igual a outra, porém dentro de uma delas poderá ter remédio e dentro de
outra pode haver cianureto. A
cápsula em si näo é o remédio.
Portanto näo é o som do nome de Krishna que é Krishna: Krishna está dentro do som. O santo
nome tem que ser carregado com o devido espírito, näo um sentimento mundano.
Mesmo os seguidores da
escola impersonalista de Shankara tem fé que o nome näo está confinado à
jurisdiçäo do som físico.
Consideram que está dentro do plano mental, dentro do plano de sattva guna. Infelizmente pensam que o santo nome é o produto de maya, ou conceito equivocado, e assim
concluem que os nomes de Hari, Krishna, Kali, e Shiva säo todos apenas uma e
mesma coisa. A Missäo Ramakrishna
e a escola de Shankara ambas pregam desta maneira. Porém esse conceita também tem sua origem no plano do
equívoco.
SOM DIVINO
O som divino do nome puro (suddha-nama) deve ter sua origem além da
área do conceito equivocado ou maya. Maya
se estende até ao mais elevado planeta do mundo material, Satyaloka. Além de Satyaloka está o rio Viraja e o
mundo da consciência, Brahmaloka, e depois o céu espiritual, Paravyoma. O nome puro de Krishna deve ter sua
origem em Paravyoma, o céu espiritual.
E se formos examinar mais ainda, o santo nome de Krishna realmente
provém do plano mais original de toda existência: Vraja, Goloka.
Segundo esta compreensäo, o som deve ter sua origem no plano mais
elevado do mundo espiritual em Vrndavana se for para ser considerado o genuíno
nome de Krishna.
O mero som físico näo é o
santo nome de Krishna. Um
verdadeiro conceito do santo nome é necessário, näo só para libertar-nos deste
mundo de conceito equivocado, mas também para obter o serviço a Krishna em
Vrndavana. Só esse verdadeiro nome
de Krishna que tem sua origem no plano de Vrndavana pode nos elevar e levar até
lá.
Senäo, embora o espírito
esteja dentro do nome, se o som que vibramos for baseado em qualquer outro conceito, poderá apenas
levar-nos até aquela camada de conceito.
Isto é bastante científico; näo é irrazoável. A mera palavra krsna
näo é o santo nome. O que é
importante é o significado daquele som e a profundidade do sentido, o profundo
conceito do significado do nome.
Isso é tudo - é de importância total para nosso propósito.
Há uma boa história que
ilustra esse ponto. Quando nosso
mestre espiritual, Srila Bhaktisiddhanta Saraswati Thakura, era um jovem
menino, o pai e ele foram visitar o sagrado local de Kulinagrama, localizado no
distrito de Hooghly perto de Calcutá.
Kulinagrama era o vilarejo onde o grande devoto Haridasa Thakura, bem
como outros Vaisnavas famosos, costumavam viver, e foi o lar de quatro geraçöes
de devotos.
UM TEMPLO MAL-ASSOMBRADO
Foram visitar aquele antigo
local sagrado, e bem nos arrabaldes de Kulinagrama, quando estavam entrando no
vilarejo, passaram por um velho templo.
De repente um velho saiu do templo e humildemente perguntou-lhes: "Por favor fiquem aqui esta noite. De manhä poderäo entrar no vilarejo e
tomar darshana de todos locais
ali." Bhaktivinoda Thakura e
nosso guru maharaja, que na época era
um jovem menino, passaram a noite na casa do templo.
Logo após o cair da noite,
enquanto estavam descansando, Bhaktivinoda Thakura experimentou algo
incomum. Percebeu que tijolos
estavam sendo lançados de diferentes direçöes. Pensou:
"Como isso pode estar acontecendo e porquê? Quem jogaria tijolos grandes desse
jeito?" Entäo ficou um pouco
apreensivo que talvez houvesse fantasmas morando ali, criando
perturbaçöes. Começou a cantar
alto o Hare Krishna maha-mantra. Após algum tempo, a perturbaçäo
desapareceu, e Bhaktivinoda Thakura e Srila Bhaktisiddhanta passaram o resto da
noite ali tranquilamente.
Pela manhä, entraram no
vilarejo e começaram a visitar diferentes locais sagrados. Após algum tempo, um dos cavalheiros
locais notou-os e disse:
"Entraram em nosso vilarejo cedo esta manhä. De onde estäo vindo? E onde passaram a noite?" Bhaktivinoda Thakura explicou: "Ficamos naquele templo bem do
lado de fora do vilarejo." Um
deles disse: "Oh! Como puderam ficar ali? Tantos fantasmas moram ali e jogam
pedras e tijolos em qualquer um que passe pelo local de noite. Como conseguiram ficar ali?" Entäo Bhaktivinoda Thakura disse: "Sim, é isso mesmo. Mas quando percebi tal perturbaçäo ali,
comecei a cantar alto o Hare Krishna maha-mantra,
e subsequentemente o problema desapareceu." Os homens do vilarejo entäo perguntaram a Bhaktivinoda: "Quem és, e de onde estás
vindo?"
Entäo ficaram sabendo que
era Bhaktivinoda Thakura. Já
tinham ouvido falar dele, e alguns tinham lido seus livros. Deram as boas vindas a ambos, e
mostraram todos locais sagrados que ainda näo haviam visto.
Em dado ponto, disseram a
Bhaktivinoda Thakura: "O
cavalheiro que antes era sacerdote daquele templo foi transformado em fantasma
após seu desaparecimento. Desde
entäo, verificamos regularmente as perturbaçöes causadas por aquele
fantasma. Porque ele se tornou
fantasma? Como sacerdote daquele
templo, costumava cantar regularmente o santo nome de Krishna. Somos testemunhas de tal fato; todos
nós já o ouvimos. Porque ele foi
transformado em fantasma? Näo
conseguimos entender isso. Por
favor explique."
(Retrato de Bhaktivinoda Thakura e
seguintes dizeres:)
Bhaktivinoda Thakura lhes disse que o sacerdote devia estar repetindo
apenas as sílabas do nome. O que
produzia era apenas um som mayik, um
som físico, de profundidade apenas labial. Näo tinha essência espiritual; a vida do nome estava ausente
quando estava cantando. O
sacerdote estivera cometendo ofensas ao santo nome (nama-aparadha), e como resultado se tornara fantasma. Eles perguntaram: "Entäo como poderá ser libertado
de tal condiçäo miserável?"
Bhaktivinoda disse:
"Se ele encontrar um sadhu
fidedigno que tem uma conecçäo genuína com Krishna, e ele ouvir o verdadeiro
nome dos labios dele, entäo poderá ser libertado de sua condiçäo
fantasmagórica."
SOM COM PROFUNDIDADE APENAS LABIAL
Bhaktivinoda Thakura lhes
disse que o sacerdote devia estar repetindo apenas as sílabas do nome, o nama-akshara. O que produzia era apenas um som mayik, um som físico, de profundidade apenas labial. Näo tinha essência espiritual; a vida
do nome estava ausente quando estava cantando. Era nama-aparadha,
cantar ofensivo. Bhaktivinoda
perguntou-lhes: "Como era o
caráter dele?" Disseram: "Näo era um homem bom. Cometia muitos atos pecaminosos. Isso nós sabemos. Porém näo podemos negar o fato de que
costumava cantar o nome do Senhor quase sempre. Como poderia se tornar um fantasma?"
Bhaktivinoda Thakura
explicou que o som físico do nome näo é o nome propriamente dito. O sacerdote estivera cometendo ofensas
ao santo nome (nama-aparadha), e como
resultado se tornara fantasma.
Eles perguntaram:
"Entäo como poderá ser libertado de tal condiçäo miserável?" Bhaktivinoda disse: "Se ele encontrar um sadhu fidedigno que tem uma conecçäo
genuína com Krishna, e ele ouvir o santo nome, ou a devida explicaçäo do Bhagavad-gita ou Srimad-Bhagavatam dos labios dele, entäo poderá ser libertado de
sua condiçäo fantasmagórica. As
escrituras mencionam que esta é a única maneira de tornar-se livre do
enredamento da natureza material."
Após esta discussäo, Bhaktivinoda Thakura e Bhaktisiddhanta Saraswati
deixaram Kulinagrama.
A partir desse dia, todos
problemas causados pelo fantasma no templo de Kulinagrama cessaram. Os habitantes do vilarejo ficaram
espantados. Um deles disse: "Esse sacerdote que tinha se
tornado um fantasma deve ter sido libertado de sua condiçäo fantasmagórica após
ouvir o santo nome cantado por Bhaktivinoda Thakura. Quando a perturbaçäo começou, Bhaktivinoda cantou alto o
nome; gradualmente, por ouvir o santo nome de Krishna de seus santos lábios,
essa alma oprimida foi liberada de sua condiçäo como fantasma."
Depois disso, muitas pessoas
viajavam para ver Bhaktivinoda Thakura.
Diziam-lhe: "Temos confiança
em que és um grande Vaisnava - após ouvir o santo nome de Krishna de seus
lábios, um fantasma foi liberado."
Esta história foi publicada nos jornais, e Srila Bhaktisiddhanta
Prabhupada costumava recontar a história que experienciara pessoalmente com
Bhaktivinoda Thakura.
O ponto é que simplesmente o
som externo do nome näo é o nome real.
A coisa mais importante é a realizaçäo espiritual por trás do nome -
isso é o verdadeiro nome. Senäo,
um gravador pode pronunciar o santo nome de Krishna. Até mesmo um papagaio pode pronunciar o nome - porém o som
físico näo é a coisa em si. Como
fundamento deve haver a verdade
espiritual, que é consciente. Esse
super-conhecimento está além do conhecimento desse plano mundano.
NAMA SUPRAMENTAL
Esta compreensäo é
confirmada por Rupa Goswami Prabhu em seu verso:
atah sri-krsna-namadi
na bhaved grahyam indriyaih
sevonmukhe hi jihvadau
svayam eva sphuraty adah
Diz ele que o nome, forma,
qualidades, e associados eternos de Krishna - tudo ao redor Dele - näo é
mundano, porém puramente espiritual.
Näo conseguimos perceber isso através dos sentidos grosseiros. Simplesmente por vibrar o som krishna, nossas línguas näo conseguem
produzir Krishna, nossos narizes näo conseguem capturar a fragrância
transcendental de Seu corpo, nossos olhos näo conseguem ter uma visäo de Sua
bela figura que é supramental.
Isto é verdadeiro näo só para nossos sentidos físicos, mas também para a
mente. Nossas mentes näo conseguem
conceber Krishna. Ele é
transcendental e supramental.
Sua existência transcende
todo conhecimento que possuímos.
Näo podemos ser o sujeito e
fazer de Krishna nosso objeto. Ele
é o sujeito. Ele existe além de atma e paramatma. Nunca
devemos esquecer disso. Devemos
sempre lembrar do plano no qual Ele existe. Como almas finitas somos tatastha
jivas - a potência marginal do Senhor. A diminuta alma pode pensar e conhecer apenas aquelas coisas
que säo mais grosseiras que ela mesma.
Porém ao tentar conhecer aquilo que é mais sutil que ela própria, vê-se
incapaz. Uma conecçäo com esse
reino espiritual mais elevado só é possível quando a área superior deseja
trazer o inferior para aquele plano.
Portanto, compreendê-Lo só é possível através de rendiçäo (sevonmukhe hi jihvadau).
ESCRAVATURA DIVINA
Se pudermos aceitar a
corrente da rendiçäo - se conseguirmos morrer como somos e entregar nosso eu
mais íntimo à disposiçäo Dele - a vontade Dele pode facilmente levar-nos até a
plataforma espiritual. Nossa alma
se tornará uma folha de grama naquela corrente, e assim será levada até o
centro do infinito. Näo é que
possamos entrar ali e andar orgulhosos como fazemos aqui nesse mundo material
grosseiro. Aqui andamos com nossos
pés, porém lá andaremos com nossas cabeças. Só através da graça do Senhor sobre nossas cabeças
conseguiremos atrair aquele plano para que nos eleve.
Tudo lá é qualitativamente
superior à nossa existência. A
substância daquele reino divino, a atmosfera, o ar, o éter - tudo ali - é
superior a qualquer valor que possamos ter. Só aqueles com sincero espírito de serviço poderäo obter a
entrada ali. E lá seräo levados à
mais elevada posiçäo de amor divino pelos residentes daquele plano, que säo
veneráveis, generosos, afetuosos, e cheios de bons desejos.
Temos como nossa
perspectiva, a chance de ir até lá, mas sempre como uma questäo de graça - e
nunca uma questäo de direito.
Devemos aceitar este credo desde o início. Ainda assim, a atmosfera lá é täo feliz e amorosa que
ninguém dali sente qualquer distinçäo entre escravo e mestre. Um escravo lá näo tem a sensaçäo de ser
escravo. Todos säo família. Tendo obtido o estado de escravatura
divina, a pessoa considera:
"Sou um escravo - a generosidade de Krishna e Seus associados
eternos é minha fortuna."
Porém pelo poder de Yogamaya, aqueles que säo levados a subir até aquele
plano esquecem que säo escravos.
Essa é a grandeza e a magnanimidade daquela atmosfera onde o amor está
fluindo intensamente. Na realidade
é pelo amor deles e näo por nossa própria fortuna que poderemos de alguma
maneira obter entrada naquela terra elevada e nobre.
Mas para realizarmos isso,
temos que realizar a posiçäo espiritual do nome, forma, e associados eternos de
Krishna. O nome de Krishna näo é
material. Näo podemos captar o
nome de Krishna simplesmente por vibrarmos as sílabas do nome com nossa
língua. Ravana queria capturar
Sitadevi e pensou que o conseguira.
Porém o fato é que ele näo conseguia nem mesmo tocar o santo corpo de Sitadevi.
O que Ravana capturara era
apenas uma representaçäo mundana de Sitadevi, um doublé material, uma imitaçäo
que era como uma estátua de Sitadevi.
A própria Sitadevi é outra coisa; näo é feita de carne e osso. Para uma pessoa aqui nesse mundo, Sitadevi
e Seu plano divino é completamente inaproximável. Uma pessoa mundana näo consegue ver, sentir, ou entrar
naquele plano - sem falar de arrebatar Sitadevi e levá-la embora. As escrituras explicaram que a captura
de Sitadevi foi só "show".
Ravana foi enganado. É
claro, o rapto aparente de Sita por Ravana aconteceu para servir a algum
propósito, para ensinar algo para as pessoas deste mundo mundano. Mas no sentido real, nenhum Ravana pode
entrar em conecçäo com qualquer um dos associados eternos do Senhor que estäo
vivendo em Vaikuntha. Da mesma
maneira, nenhuma pessoa mundana consegue tocar no nome de Vaikuntha
simplesmente por imitar seu som.
Recentemente perguntaram-me
sobre um jovem menino que fora morto num acidente. Contaram-me que ele gritara o nome de Krishna na hora da
morte. Perguntaram: "Qual foi o destino
dele?" Expliquei que sermos
jovens ou velhos no plano de carne e osso näo é nenhuma qualificaçäo para
realizaçäo espiritual. Deve-se
examinar a mentalidade da pessoa.
Segundo a hora e local determinado e a concepçäo da pessoa envolvida,
aquele som pode ser o nome genuíno, ou pode ser namabhasa, a sombra do nome real.
NAMA NACIONAL
Quando Gandhi foi baleado,
gritou: "Rama! Rama!" Ele foi baleado no peito, e seus óculos foram projetados na
rua. Dentro de meia hora ele
morreu, porém pronunciou as palavras:
"Rama! Rama!" Estava a caminho para fazer uma
palestra religiosa, porém sua própria mentalidade estava cheia de pensamentos
sobre progresso nacional, portanto no caso dele, a vibraçäo do santo nome pode
ter agido no plano da construçäo da naçäo. Para entender o destino de uma pessoa na hora da morte,
devemos perguntar: "Qual era
a mentalidade dela?"
As vezes cantar o nome pode
resultar em namabhasa - a sombra do
santo nome. Ser o suddha nama, o nome genuíno, vai
depender do sistema mental da pessoa que canta o nome. Depende da relaçäo dela com Krishna, a
intençäo dela.
GOPI, GOPI, GOPI
Alguns dias antes de Sri
Chaitanya Mahaprabhu tomar sannyasa,
Ele estava cantando gopi, gopi, gopi. Ouvindo isso, um brahmana tântrico veio dar alguns conselhos ao Senhor. "Pandit" disse, "És um
sábio; conheces as escrituras.
Ainda assim, estás cantando o nome gopi,
gopi? Que benefício obterás
com isso? As escrituras dizem que
se cantarmos o nome de Krishna, poderemos obter algum benefício. Encontrarás isso em muitos lugares nas
escrituras, especialmente nos Puranas. Porque entäo, cantas gopi, gopi?"
Irritado com a ignorância do
brahmana, Sri Chaitanya Mahaprabhu,
num humor de seguidor das gopis,
pegou uma vara e começou a admoestá-lo:
"Vieste do campo inimigo para converter-nos em seguidores de
Krishna?" Correu atrás do brahmana para bater-lhe com a vara. Nesse exemplo, vemos que Sri Chaitanya
Mahaprabhu estava cantando gopi, gopi
e negligenciando o nome de Krishna.
Aparentemente Ele foi aconselhado a tomar o nome de Krishna e ficou
irado - mas qual é o pensamento subjacente aqui?
Se queremos compreender o
efeito de alguém cantar o santo nome, devemos examinar seu propósito subjacente. As vezes seu cantar poderá ter algum
efeito, mas nem sempre. Todavia,
Jiva Goswami menciona o seguinte exemplo como evidência de que o santo nome
pode ter algum efeito mesmo se a pessoa näo está ciente de seu pleno
significado.
Uma vez um javali selvagem
atacou um maometano, e este gritou:
"Harama! Harama! Harama significa "esse abominável porco!" Por outro lado, Ha Rama significa "o Senhor" que permitiu que um javali
me atacasse. De algum modo, o
Senhor Rama foi invocado, e o santo nome teve uma influência divina sobre o
maometano, que obteve a liberaçäo.
Outro exemplo dado nas
escrituras é o de Valmiki. Antes
de se tornar um santo, o sábio Valmiki era um dacoita (seguidor da seita de
ladröes). Porém o grande sábio Narada
tinha um plano para beneficiá-lo.
Narada pensou: "Esta
pessoa é o mais notório e hediondo dacoíta que jamais vi. Deixe-me experimentar com ele para ver
a potência do santo nome. Vou
pedir que ele cante o santo nome de Rama." Ele tentou, porém Valmiki näo conseguia pronunciar o santo
nome de Rama. Entäo Narada
disse-lhe para cantar mara - a
palavra para "assassinato" - em vez disso. O dacoíta disse:
"Sim, posso fazer isso.
Isso é justamente o oposto do nome de Rama." Ele começou a cantar: "mara-mara-mara-mara-rama-rama-rama-rama" Desta maneira, após algum tempo, mara se tornou rama. Valmiki começou
a cantar o nome de Rama, e gradualmente sua atitude mental modificou-se. Portanto é possível o nome ter um
efeito em alguém mesmo se a pessoa näo tiver uma concepçäo acertada do
significado. Isto se chama namabhasa: a sombra do nome.
Pode provocar a liberaçäo.
Porém um verdadeiro devoto näo se interessa por liberaçäo. Ele quer entrar no domínio do serviço
divino.
O som e seu efeito depende
da atitude que aceitamos, e da qualidade que conseguimos conceber, porque o
verdadeiro vaikuntha nama é
infinito. Nesse plano, o divino
nome é igual à substância invocada.
Quando o aspecto sonoro é uma só e mesma coisa com o aspecto original da
coisa, isto é vaikuntha nama. Aqui neste mundo, o nome de um homem
cego pode ser Padmalochan - olhos de lótus - mas na realidade ele pode ser
cego. O nome e a figura podem ser
inteiramente diferentes. Porém em
Vaikuntha, no mundo infinito, o nome e o nomeado säo uma só unidade.
Entretanto para
experimentarmos o vaikuntha nama,
devemos evitar tanto nama aparadha,
ofensas ao santo nome, e namabhasa, a
sombra do santo nome. Por namabhasa, obtemos algum alívio deste
enredamento mundano, e por nama aparadha,
ficamos enredados neste mundo mayik. Mas o som físico comum näo pode
representar o nome real, que é sobrenatural.
É dito que um nome de
Krishna pode remover mais ignorância e pecado que um homem tem poder de
cometer. Mas qual é a qualidade de
tal nome? Podemos cantar o nome
físico de Krishna tantas vezes sem obter o resultado de um só nome
verdadeiro. Há uma grande
diferença entre o som comum do nome, o nome mayik
superficial e o nome puro. O nome
puro é uma só e mesma coisa que Krishna, porém isso só desce até nosso nível
por Sua graça. Näo conseguimos
vibrá-lo simplesmente por meio de mover nossa língua e nossos lábios. O nome puro de Krishna näo é só da boca
para fora, mas do coraçäo. E ele
afinal vai além do coraçäo e alcança a terra de Krishna. Quando Krishna desce, o nome de Krishna
passa pelo coraçäo e movimenta os lábios e a língua. Essa vibraçäo é o santo nome de Krishna, krsna nama.
PODER NEGATIVO
Quando Krishna na forma de
som desce do mundo transcendental para o coraçäo, e do coraçäo, controlando
cada aspecto do sistema nervoso, chega aos lábios e ali começa a dançar, isso é
krsna nama. A iniciativa está no mundo transcendental. Esse som näo é produzido do plano
físico. O som espiritual tem de
descer até este plano; Ele pode descer, mas nós näo conseguimos subir até lá
täo facilmente. Ele é o
Supersujeito; nós somos um objeto para Ele. Näo podemos interferir com a independência Dele. Só pelo poder negativo da rendiçäo
poderemos atrair o Supremo Positivo para descer até nosso nível.
E assim o santo nome näo é
uma produçäo de nossos sentidos.
Pode ser realizado apenas quando nos aproximamos Dele com uma intensa
atitude servidora. Nessa ocasiäo,
o próprio Krishna poderá descer por Sua graça, sendo atraído por nossa natureza
servidora. Entäo Ele pode influenciar
este elemento e produzir som e dança transcendental dentro do plano
mundano. Isso é o santo nome, o vaikuntha nama, o verdadeiro nome de
Krishna. Näo conseguimos
produzí-lo com nossos lábios. O
som que criamos com nossa produçäo física ou mental näo é Krishna. Ele é independente de qualquer som que
possamos produzir e no entanto, porque controla tudo, Ele pode aparecer em
qualquer lugar, em qualquer forma, em qualquer plano, em qualquer som.
E isso é confirmado pelo Bhagavad-gita 4.6. Krishna diz: "Quando venho até aqui através do poder de Minha
potência interna, removo a influência da potência externa e apareço em qualquer
lugar e em todos cantos." A
onda mundana é forçada a retroceder, assim como um aeroplano voa pelo céu e
empurra a influência do ar e do vento enquanto passa à força. Removendo a influência das ondas
materiais, Ele aparece dentro deste mundo pela força de Sua própria força.
O Senhor diz: "Tenho Minha própria potência, e
pelo poder dessa potência, Eu removo esta energia material grosseira. E assim vivo e me movimento neste
mundo." As leis da natureza
material näo se aplicam a Ele. Ele
tem poder especial. E com ajuda
desse poder especial, Ele subjuga as leis da natureza material e chega até
aqui. Ele faz o que quer com Sua
própria potência. Onde quer que
Ele vá, as leis da natureza material se retiram daquele lugar e fazem a vontade
Dele. Deste modo, Ele pode
aparecer dentro do reino do som como o santo nome.
A importância real do nome
näo se acha meramente no arranjo das sílabas, mas no profundo significado
dentro desse som divino. Alguns
eruditos argumentam que no Kali-santarana
Upanishad, o Senhor Brahma diz que o Hare Krishna maha-mantra só é devidamente pronunciado quando o nome Rama precede
o nome de Krishna. "Hare
Rama, Hare Rama, Rama Rama, Hare Hare / Hare Krishna, Hare Krishna, Krishna
Krishna, Hare Hare."
KRISHNA NAMA
No Kali-santarana Upanishad, o Hare Krishna maha-mantra é dado desta maneira. Mas falar que o nome de Rama tem que preceder o nome de
Krishna no mantra é um entendimento superficial. Dizem que por vir dos Upanishads,
o Hare Krishna mantra é um mantra védico, e portanto, porque as pessoas comuns
näo podem ter acesso aos mantras védicos, Sri Chaitanya Mahaprabhu reajustou
esse mantra revertendo a ordem das palavras. Desse modo, dizem, a preocupaçäo de que é um mantra védico
dessa maneira é cancelada, e assim Sri Chaitanya Mahaprabhu concedeu-o para
todos sem quebrar as injunçöes dos Vedas.
Alguns devotos em Uttar Pradesh que tem grande afeiçäo por Sri
Chaitanyadeva gostam de dar essa opiniäo.
Porém nós acreditamos que
mencionar "Hare Rama" primeiro é apenas superficial. Refere-se à idéia de que como o Rama avatara apareceu primeiro e o Krishna avatara depois, o nome de Rama,
"Hare Rama", deve vir primeiro no maha-mantra. Uma leitura mais profunda considerará
que quando duas coisas similares estäo conectadas, a prioridade será ordenada
näo com base no precedente histórico, mas considerando a concepçäo mais
elevada. O santo nome de Krishna é
mais elevado que o santo nome de Rama.
Isso é mencionado nos Puranas: três nomes de Rama equivalem a um nome
de Krishna. O nome de Krishna é
superior ao nome de Rama. Onde
ambos se conectam, a primeira posiçäo deve ser dada para aquele que é
superior. Portanto, o nome de
Krishna deve vir primeiro no maha-mantra.
Isso é um ponto. Outro ponto é que dentro do plano
eterno, tudo está se movendo numa ordem cíclica. Num ciclo eterno, näo se consegue determinar o que vem
primeiro e o que vem depois, e assim, no plano da lila eterna, näo se consegue determinar se Krishna é antes de Rama
ou Rama antes de Krishna. Assim
considerando isso também, como os nomes Krishna e Rama säo eternos e näo
relacionados com qualquer evento histórico, poderemos começar o mantra de
qualquer lugar.
RAMA SIGNIFICA KRISHNA
Porém acima destas
consideraçöes, nossa sampradaya deu
outra consideraçäo, mais elevada.
Uma compreensäo mais profunda irá revelar que o Hare Krishna mantra näo
se refere a rama lila. Dentro do nome Rama no Hare Krishna
mantra, os Gaudiya Vaisnavas encontraräo Radha-ramana Rama. Isso quer dizer: "Krishna, que dá prazer (raman) a Srimati Radharani." Na nossa concepçäo, o Hare Krishna
mantra é indiscriminada consciência de Krishna, näo consciência de Rama. A mais elevada concepçäo das coisas por
Sri Chaitanya é sempre svayam bhagavan, krishna lila, radha-govinda
lila. Esse é o propósito real
do advento e ensinamentos de Sri Chaitanya Mahaprabhu. Considerando isso, o Hare Krishna
mantra näo menciona a rama lila de
Ayodhya de jeito nenhum. Näo há
nenhuma conecçäo com isso na concepçäo do Hare Krishna mantra.
E a concepçäo interna do
mantra é responsável por nossa realizaçäo espiritual. Quando se pronuncia o nome de Rama, se a pessoa quer dizer
Dasarathi Rama, sua atraçäo a levará até lá, para Ayodhya; se quer dizer
Parasurama, será atraída para outro plano. E se Rama significa Radha-ramana Rama, irá para Goloka. A concepçäo interna do devoto o guiará
para seu destino.
Meu nome original era
Ramendra Chandra. Quando recebi
iniciaçäo, Srila Bhaktisiddhanta Saraswati Thakura me deu o nome de Ramendra
Sundara. Perguntei-lhe: "Qual o significado de
Ramendra?" Ele me disse: "Nós consideramos que Rama näo
significa Dasarathi Rama ou o Senhor Ramachandra, o filho do rei
Dasaratha. Significa Radha-ramana
Rama - Krishna, o amante de Radharani."
O nome "Hare"
também pode significar coisas diferentes conforme nossa concepçäo. Que o significado da palavra Hare no
mantra seja tomado como sendo Radharani também é determinado conforme o
desenvolvimento espiritual ou qualificaçäo (adhikara)
do cantor. Quando se está
firmemente estabelecido em conceber Radha-Krishna no fundo de tudo - quando se
encontra svayam-rupa, a forma
original de Deus, subjacente em todo tipo de concepçöes de todas coisas boas -
só entäo é que se encontrará esse tipo de significado e nada mais.
Para principiantes, a
palavra "Hare" no Hare Krishna Mantra pode ser concebida como
significando Hari. Isso é um
significado. Também poderá
significar Nrsimhadeva. E assim
como "Rama" pode significar Dasarathi Rama, "Krishna" pode
referir-se a diferentes tipos de Krishna.
Também há um Krishna em Vaikuntha, onde os vaibhavas ou expansöes do Senhor, totalizam vinte e quatro. Em Vaikuntha, primeiro temos Narayana,
e depois quatro expansöes:
Vasudeva, Shankarshana, Pradyumna e Aniruddha. Cada um desses quatro tem cinco agentes, totalizando ao todo
vinte e quatro. Um desses é o
Krishna de Vaikuntha. E depois tem
o Krishna de Dwaraka e o Krishna de Mathura.
Dessa maneira há várias
concepçöes de Krishna. Porém a
concepçäo mais elevada de Krishna é Krishna em Vrndavana: Radha-Govinda. Quando näo se consegue sair desse
plano, a pessoa conceberá a divindade apenas como Hari-Hara. Näo verá nada mais a näo ser
Radha-Krishna. Aqueles que estäo
completa e perfeitamente instalados em mathura-rasa
- que possuem o tipo mais elevado de visäo - näo podem descer desse plano. Se o fizerem, é somente no interesse de
Radha-Govinda. Nesse caso, o
devoto pode ir a qualquer lugar, mas seu verdadeiro interesse está bem guardado
a chave em Vrndavana. Apenas pelo
serviço de Radha-Govinda é que um devoto deixa Vrndavana.
Para aqueles que säo
seguidores da linha de Vrndavana, "Hare" no
Hare Krishna mantra só pode
significar Hara: Srimati
Radharani. Hara significa
"Radha, que até consegue capturar a atençäo de Krishna, Hari." A palavra harana significa "roubar". Quem consegue roubar a mente Daquele que é muito perito em
roubar - que consegue roubar até a mente de Krishna - Ela é Hara. Roubar em sua mais alta capacidade é
demonstrado por Radharani. E
"Krishna" significa "Aquele que é muito atraente no sentido absoluto." Ambos säo representados no mantra.
RUPANUGA MANTRA
Os seguidores da rupanuga sampradaya nunca podem ser
desviar dessa consciência no seu cantar do maha-mantra. E com essa concepçäo, eles continuam
com o serviço de Hari-Hara, Radha-Krishna. Eles se absorvem em radha
dasyam. Eles näo conseguem
pensar em mais nada além disso. E
uma vez tendo alcançado plenamente esse plano, eles nunca podem descer desse
nível, do interesse de Radha-Krishna.
Eles näo podem se permitir ficar fora desse círculo.
Essa é a posiçäo de nossa
mais alta aspiraçäo, e conforme o adhikara
ou qualificaçäo espiritual de um devoto, esse tipo de significado despertará na
mente dele. Será despertado,
descoberto pelo sadhana. Nessa ocasiäo a cobertura do coraçäo
será removida e o amor divino brotará espontaneamente da fonte do coraçäo como
a funçäo interna da alma.
* * *
Os Gaudiya Vaisnavas só conhecem Radharani. Eles só se interessam por Ela, e Seus deveres, Suas
necessidades. Estäo prontos a
serví-La em todas circunstâncias, e näo conseguem contemplar qualquer serviço
sem Ela. Essa é a mais alta
realizaçäo dos Gaudiya Vaisnavas, esse é o caráter especial do partido de
Mahaprabhu, e isso foi anunciado por Raghunatha Dasa Goswami.
* * *
Existe uma esperança que me sustenta e nutre minha existência. E com essa esperança de algum modo
estou passando meus dias. Porém
minha paciência chegou ao final.
Näo consigo aguentar mais.
Nesse momento se näo mostrares Tua graça para comigo, Sri Radha, vou
perder minha perspectiva para sempre.
Näo terei nenhum desejo de continuar minha vida.
E Vrndavana, que me é mais querida até que minha própria vida - estou
desgostoso com ela. Sem falar de
qualquer outra coisa, estou desgostoso até com Krishna. É vergonhoso pronunciar palavras assim,
mas näo consigo ter nenhum amor por Krishna a näo ser que, e até que Tu me
leves para dentro de Teu acampamento confidencial de serviço.
RAGHUNATH DAS
* * *
O SERVIÇO DE SRI RADHA
Certa vez o Diwam de
Bharatpur tinha vindo em peregrinaçäo com sua família ao mais sagrado dos
locais, Sri Radha-kunda, o lago sagrado de Srimati Radharani. Ele e sua família estavam
circumambulando o Radha-kunda. Eles se jogavam de cara no chäo, prestando
reverências deitados com os braços esticados. A cada vez que prestavam reverências assim, marcavam o lugar
com as pontas dos dedos que tocavam a terra. Depois lentamente se levantavam, davam um passo à frente
onde aquele lugar fora marcado, e novamente caíam duros, prestando reverências
com grande respeito e adoraçäo.
Dessa maneira estavam circumambulando o Radha-kunda inteiro. Ao ver tal adoraçäo intensa,
Paramananda Prabhu, discípulo íntimo de nosso guru maharaja Srila Bhaktisiddhanta Saraswati Thakura, sugeriu a
Prabhudapa que o Diwan e sua família deviam ter grande respeito por Radharani
para circumambularem o Radha-kunda de tal modo.
Na ocasiäo, Prabhupada
disse: "O ângulo de visäo
deles para com o Radha-kunda e Radharani é diferente do nosso. Eles reconhecem e reverenciam
Krishna. E porque Radharani é a
favorita de Krishna, eles também possuem alguma reverência pelo
Radha-kunda. Porém nossa visäo é
justamente o oposto. Nosso
interesse é por Radharani. E só
porque Ela quer Krishna é que temos alguma conecçäo com Ele."
E assim, os Gaudiya
Vaisnavas só conhecem Radharani. O
interesse deles é só por Ela, e Seus deveres, Suas necessidades. Estäo prontos a serví-La em todas
circunstâncias, e näo conseguem contemplar qualquer serviço sem Ela. Essa é a mais alta realizaçäo dos
Gaudiya Vaisnavas, esse é o caráter especial da partido de Mahaprabhu, e isso
foi anunciado por Raghunatha Dasa Goswami em seu Vilapa-kushumanjali (102):
ashabharair-amrta-sindhu-mayaih kathancit
kalo mayatigamitah kila sampratam hi
tvam
cet krpam mayi vidhasyasi maiva kim me
pranair vraje na ca varoru bakarinapi
Este verso é uma oraçäo
direta a Radharani. Expressa um
determinado tipo de esperança que é täo doce e reconfortante que é comparada
com um oceano ilimitado de néctar.
Ele diz: "Existe uma
esperança que me sustenta e nutre minha existência. E com essa esperança de algum modo estou passando meus dias,
arrastando minha vida por esses tempos entediantes. Esse nectáreo oceano de esperança está me atraindo e
mantendo vivo. Porém minha
paciência chegou ao final. Näo
consigo aguentar mais. Näo consigo
mais esperar.
Nesse momento se näo
mostrares Tua graça para comigo, Sri Radha, vou perder minha perspectiva para
sempre. Näo terei nenhum desejo de
continuar minha vida. Será tudo
inútil. Sem Tua graça, näo suporto
viver mais um momento. E Vrndavana,
que me é mais querida até que minha própria vida - estou desgostoso com
ela. É dolorosa; está sempre me
apertando. Sem falar de qualquer
outra coisa, estou desgostoso até com Krishna. É vergonhoso pronunciar palavras assim, mas näo consigo ter
nenhum amor por Krishna a näo ser que, e até que Tu me leves para dentro de Teu
campo confidencial de serviço."
Esta é a oraçäo de Raghunatha Dasa.
Quando Srila Bhaktisiddhanta
Saraswati começava a explicar este verso, sua figura se transformava. Ele ficava cheio de emoçäo; sua face se
tornava como a de um fantasma.
Neste verso, Raghunatha Dasa
Goswami, correndo risco extremo, diz:
"ó Radha, se eu näo receber Teu favor, näo quero nada. Quero a Ti e somente a Ti. Ter uma relaçäo independente com
qualquer outra pessoa, eliminando-Te, é impossível em minha vida. Tu deves ser a primeira, e depois os
outros. Sem Ti, nunca poderemos nem
mesmo pensar numa relaçäo separada com Krishna."
Bhaktivedanta Swami Maharaja
escreveu que sem a companhia de Radharani, Krishna näo é belo. Tudo é relativo - dependente. Um professor depende do estudante, e o
estudante depende de seu professor.
Embora Krishna seja o desfrutador, Ele é completamente dependente da
desfrutada, Srimati Radharani.
Ambos säo correlacionados; um näo pode ser separado do outro. Como a desfrutada, Radharani também é
absolutamente dependente de Krishna, o desfrutador.
Radharani diz: "Meu destino está perdido para
sempre porque Me dei, Me vendi a muitos lugares. Quando ouvi a flauta, Me dediquei à cançäo da flauta. Quando ouvi o nome de Krishna, Me
dediquei para aquele som. E quando
vi uma linda pintura de Krishna, Me dediquei inteiramente àquele retrato. Portanto Me vendi completamente em três
lugares, sem nenhuma possibilidade de qualquer felicidade ou paz na Minha
vida. Se eu tivesse Me dedicado
apenas a uma só coisa, poderia haver uma possibilidade de paz, porém porque Me
dediquei em três diferentes lugares, näo tenho esperança.
Ao ver o retrato de Krishna,
näo pude conter-Me. Näo houve
outro jeito senäo entregar-Me àquela bela figura, e assim dediquei-Me
completamente. O nome de Krishna
também Me comprou totalmente. E o
doce som da flauta - isso também Me atraiu para o extremo da dedicaçäo. Portanto, como posso esperar
tranquilidade na Minha vida? É
impossível, Minhas amigas."
Radharani näo o sabia na época, mas a fonte da flauta de Krishna, Seu
nome, e Sua beleza säo um só ser.
Se Ela pudesse ter percebido como todos três se encontram juntos, entäo
teria sido possível para Ela ter a mente tranquila. Mas é difícil entender esse princípio.
Como é que esse som da
flauta de Krishna o som de Seu nome, e um retrato de Sua forma näo säo
diferentes Dele? Idealismo. Nas palavras de Hegel, realismo
ideal. A idéia absoluta näo é para
ser rejeitada como uma coisa abstrata; em vez disso, é a base de toda
existência. A realidade está ali,
porém é realismo ideal. E o fundamento
da realidade de Vrndavana é dado por Nityananda, Baladeva: "nitaiyer koruna habe, braje radha-krishna pabe, dharo nitai-carana
du'khani.
Depois que Bhaktivinoda
Thakura descreve a posiçäo de Radharani em seu Sharanagati, diz:
"Quero servir aqueles que possuem o serviço de Radharani em seu
coraçäo. Quero servir a poeira dos
pés daqueles cuja única fortuna é o serviço de Sri Radha. Quero cair diante deles e tomar a
poeira de seus santos pés. Se näo
puderes fixar tua mente no serviço de Radharani, entäo todas tuas tentativas de
servir Krishna säo inúteis. Se näo
conseguires ter sinceridade no serviço de Srimati Radharani, entäo todo teu
trabalho para Krishna foi para o inferno." Näo conseguimos conceber um sol sem calor, nem conseguimos
conceber Deus sem Sua potência.
Assim também, nenhuma concepçäo de Krishna é possível sem Srimati
Radharani. Näo podemos conhecer
qualquer Madhava sem Radha.
Ela é a outra metade de
Krishna - na linguagem de Srila Bhaktisiddhanta, a metade predominada. O serviço devocional como um todo é
representado por Ela, porque tanto a intensidade e a amplitude de Seu serviço a
Krishna säo sem paralelo. Existem
tantos exemplos de donzelas castas e piedosas na antiga história dos Puranas: Saci, a fiel esposa de Indra; Sati, a esposa do Senhor
Shiva; Laksmidevi, deusa da fortuna; Satyabhama, esposa de Krishna em Dwaraka;
Rukmini, principal rainha de Krishna em Dwaraka; e mesmo as antagonistas de
Radharani, lideradas por Chandravali.
Todas elas representam diferentes aspectos de Radharani. Todas surgem da potência principal
conhecida como Radha.
O nome Radha vem da palavra aradhana: pessoa que pode servir, que pode adorar, que pode oferecer
respeito, que realmente ama Krishna, que pode prestar-Lhe serviço amoroso. Todas essas outras donzelas que säo
famosas por sua castidade e piedade näo passam de representaçöes parciais de
Radharani. Se notarmos as
escrituras e examinarmos atentamente a posiçäo dessas damas virtuosas, descobriremos
que a fonte de toda sua castidade e devoçäo é Srimati Radharani. Ela é a origem da devoçäo. E assim Bhaktivinoda diz: "Curvo-me e tomo a poeira dos santos
pés daqueles cuja única fortuna é o serviço de Radharani. Näo anseio por nada
mais." Quem quer que saiba
disso e sempre viajar por esse caminho com um coraçäo sincero é muito
afortunado.
É o ideal que nos torna
grandes, näo alguma posse material.
Quem tem o mais elevado ideal é realmente afortunado. O mais elevado ideal é a coisa mais
valiosa que podemos possuir. E
coisas menos valiosas devem ser eliminadas se for para concentrarmos nossos
esforços e salvar-nos de empenho inútil.
Chaitanya Mahaprabhu veio para nos mostrar o ideal mais elevado - a
senda do amor divino. E
encontramos amor divino por Deus na sua intensidade mais alta na vida Dele e
ensinamentos do Srimad-Bhagavatam. Todo o Srimad-Bhagavatam destina-se a ilustrar o ideal do amor divino que
alcança sua mais elevada expressäo em Srimati Radharani.
O Srimad-Bhagavatam canta mui gloriosamente sobre o relacionamento de
amantes de Radha e Krishna. Os Vedas e outros Puranas näo säo täo expressivos sobre tais passatempos
confidenciais, contudo encontramos uma sugestäo das glórias de Radha e Krishna
no Srimad-Bhagavatam. E os Goswamis expressaram mais
plenamente a devoçäo de Radharani em seus escritos. No Padyavali de
Rupa Goswami, encontramo-La dizendo:
"Meu Senhor, as pessoas dizem que tenho má reputaçäo por causa da
Minha conecçäo Contigo. Näo sinto
nenhum problema em Meu coraçäo por causa disso. Minha preocupaçäo é porque näo pude entregar-Me a Ti
completamente. As pessoas em geral
dizem que estou ilicitamente conectada Contigo, mas o que Me perturba é que näo
pude realmente Me entregar a Ti.
Sinto que näo sou digna de Teu serviço. Só isso é que é problema em Meu
coraçäo."
E o êxtase do amor divino
aumenta na separaçäo. Um dia, quando Krishna estava brincando com Seus amigos
vaqueirinhos nas terras pastoris de Vrndavana, Krishna repentinamente sentiu
extrema separaçäo de Radharani. Enviou seu melhor amigo Subala a Radharani,
dizendo: "Vá até Minha Radha
e traga-A. Sem Ela, näo posso
viver. De repente estou com tanto
desejo pela companhia Dela, que näo consigo mais aguentar. De alguma maneira consiga
trazê-La." Subala disse: "Como é possível trazê-la aqui
para a selva em plena luz do
dia?" Krishna falou para
ele: "De alguma maneira
consiga-o."
Subala pensou: "Que devo fazer?" Subala era mui intimamente conectado
com a família do marido de Radharani.
Foi até a casa de Radharani e disse para as amigas dela: "Krishna näo consegue mais tolerar
a separaçäo de Radharanai. Ele
está täo ansioso por encontrar-Se com Ela que está ficando louco. De algum jeito façam um arranjo para
que Se encontrem."
"Como seria
possível?" as gopis
perguntaram. Subala explicou-lhes
que Krishna estava ali perto na selva.
Discutiram entre si o que fazer.
Subala era um belo jovem que parecia com Radharani. Assim Subala botou as vestes de
Radharani e Ela vestiu-se com a roupa de vaqueirinho de Subala.
Quando Radharani foi
descoberta usando a roupa de Subala, Ela foi intimada pelos membros de Sua
família: "Subala! Que estás fazendo aqui?" Nas roupas de Subala, Radharani
disse: "Está faltando um
bezerro e a mäe dele está mugindo.
Assim vim até aqui para procurar o bezerro." Portanto deram um bezerro para
Radharani, e Ela carregou esse pequeno bezerro sobre Seu peito para dentro da
floresta. Dessa maneira, Radharani
foi disfarçada de Subala, enquanto Subala, que vestira a roupa de Radharani,
permanecia no quarto Dela.
Radharani havia recebido uma
idéia de onde Krishna estava Se escondendo próximo à beira da floresta. Ela foi procurá-Lo. Afinal, quando Radharani viu Krishna,
aproximou-Se Dele na roupa de Subala.
Krishna estava louco. Näo
podia detectar que Radharani tinha vindo, e sim confundiu-A com Subala. Disse: "Oh, Subala, voltaste sem Radharani! Näo conseguiste trazê-La?"
Radharani começou a
gracejar: "Näo" disse
Ela, "Foi impossível para mim trazê-La durante o dia." Krishna disse: "Entäo o que devo fazer? Näo posso
mais tolerar Minha vida."
Radharani disse: "Se
me mandares, posso ir até Chandravali e trazê-la." "Näo, näo" disse Krishna,
"Coalho näo pode satisfazer uma sede por leite. Näo é possível!"
Krishna estava abatido pelo desapontamento. Entäo Radharani abraçou-O, dizendo: "Meu Senhor, näo consegues
reconher Tua serva? Falhaste em Me
reconhecer!" Entäo Krishna
novamente ficou cheio de júbilo.
Embora os passatempos de
Radha e Govinda sejam mencionados nas escrituras, tudo isso säo coisas muito
elevadas. Näo säo para se
expressar comumente em palavras, mas ainda assim às vezes somos forçados a
falar sobre isso porque o elevado ideal de amor divino dado pelo Srimad-Bhagavatam é a meta suprema da
vida. É claro, a erudiçäo de
Sukadeva Goswami e Sri Gauranga Mahaprabhu ajudaram, até certo ponto, a
estabelecer a dignidade da proposta de que o amor está acima do
conhecimento. Foi admitido por
todos que Sukadeva obteve a mais alta realizaçäo dos eruditos no conhecimento;
ele foi admitido por unanimidade dos sábios para ficar na posiçäo mais
alta. Por causa disso, quando
Sukadeva Goswami veio inaugurar o princípio de que o amor divino está acima de
tudo o mais, os sábios tiveram que prestar atençäo. Chaitanya Mahaprabhu demonstrou para os sábios que Sua inteligência
e erudiçäo excediam a de todo mundo.
Assim quando Ele chegou com as novas sobre o amor divino, foi mais fácil
para homens comuns aceitar isso como o ideal mais elevado e tentar alcançá-lo.
Assim Vasudeva Ghosh
diz: yadi gaura na ha'te tabe ki haita kemane dharitam de. Se Mahaprabhu näo tivesse aparecido
nesta Kali-yuga, entäo como poderíamos tolerar viver? Como poderíamos manter nossas vidas? O que Ele deu - a própria essência da
vida, o próprio sabor, o encanto da vida - sem isso, achamos ser impossível
para qualquer pessoa viver neste mundo.
Isso foi inventado, descoberto por Gauranga. Se Ele näo tivesse vindo, entäo como poderíamos viver? É impossível viver destituído de algo
täo sagrado e agradável como o amor divino. Sem Chaitanya Mahaprabhu, como poderíamos saber que
Radharani permanece suprema no mundo do amor divino? Recebemos todas estas coisas Dele, e agora pensamos que a
vida vale a pena viver. Senäo
viver seria suicida.
E servir aqueles que
conseguem servir Radharani é o meio de aproximar-se das vizinhanças Dela. Por servir os servos dos servos, nos é
assegurado o sucesso em conseguir a graça de Krishna. Se de alguma maneira pudermos ser incluídos no grupo dos
servos de Srimati Radharani, nosso futuro está assegurado.
Dentro do grupo dos
servidores de Radharani, aspiramos a ser rupanugas,
seguidores de Sri Rupa. E os
seguidores de Sri Rupa teräo grande sinceridade ao aterem-se às ordens de Sri
Rupa, assim como ele faz com Lalita.
Desse modo, através de Rupa Goswami, nosso serviço devocional está indo
até o plano mais elevado. E nosso
mais elevado benefício só está lá.
Nem mesmo nossa conecçäo com Radharani ou Lalitadevi é a mais elevada
meta da vida, mas nossa aspiraçäo mais alta é servir na Rupanuga-sampradaya; isso quer dizer que nossa mais elevada
realizaçäo é na conecçäo de Sri Rupa.
Radha-dasyam tem sido mencionado como a mais alta realizaçäo. Por quê? A qualidade e a quantidade de rasa que Radharani pode extrair de Krishna nunca pode ser
encontrada em nada mais. Portanto
se nos situamos logo atrás de Radharani, teremos permissäo de provar näo só da
quantidade, mas também da qualidade mais elevada de rasa.
Nenhuma outra pessoa
consegue extrair tanta rasa de
Krishna. O tipo mais pleno, mais
elevado de qualidade é extraído de Krishna: Ele Se dá total e inteira e profundamente. Portanto se estivermos no grupo de Sri
Rupa, entäo poderemos receber um gostinho desse tipo de rasa.
No acampamento de Radharani,
quando Krishna e Radha estäo desfrutando de passatempos mui solitários num
local ermo, as sakhis crescidinhas
näo podem se aventurar a entrar no aposento e assistí-Los. As jovens meninas, as manjaris, säo enviadas. A líder desse jovem grupo pode entrar
onde ambos, Radha e Govinda, estäo mui intimamente conectados, quando até mesmo
as sakhis näo se aventuram a ir, por
temor de causar alguma interrupçäo.
Porém Rupa e as manjaris podem
entrar ali naquela hora devido à sua tenra idade. Esse tipo de rasa
que näo pode ser obtida nem mesmo através das sakhis só pode ser obtido através das manjaris.
Bhaktivinoda Thakura ora
para obter admissäo lá. Ele tem
uma qualidade de aspiraçäo täo elevada.
Ele diz: rupanuga hoite sei doy. Ele corre para se alistar no grupo de
Rupa, que pode nos conceder esse tipo de perspectiva futura. E Prabhodananda Saraswati descreveu o
pré-requisito para se entender todas essas coisas:
yatha yatha gaura padaravinde
vindeta bhaktim krta punya-rashih
tatha tathotsarpati hrdy akasmat
radha padambhoja
sudhambhurashih
"Quanto mais te
renderes ao pés de lótus de Sri Gauranga, achar-te-ás seguramente situado no
serviço de Radha-Govinda. Näo
tentem se aproximar de Radha-Govinda diretamente; se o fizerem, poderá haver
alguma dificuldade. Porém os pés
de lótus de Sri Gauranga os levaräo até lá seguramente."
Em meu poema sânscrito
dedicado a Bhaktivinoda Thakura, expliquei todos esses pontos:
sri-gauranumatam svarupa-viditam
rupagrajenadrtam
rupadyaih pariveshitam raghu-ganair-
asvaditam sevitam
jivadyair abhirakshitam shuka-shiva-
brahmadi sammanitam
sri-radha-pada-sevanamrtam aho
tad datum isho bhavan
"O que foi sancionado
por Sri Chaitanya Mahaprabhu através de Seu advento era conhecido intimamente
apenas por Sri Svarupa Damodara Goswami.
Foi adorado por Sanatana Goswami e servido por Rupa Goswami e seus
seguidores.
Raghunatha Dasa Goswami
provou plenamente dessa coisa maravilhosa e realçou-a com sua própria
realizaçäo. E Jiva Goswami apoiou
e protegeu-a com sua própria realizaçäo.
O sabor dessa verdade divina é a aspiraçäo de Brahma, Shiva e Uddhava,
que a respeitam como a meta suprema da vida. Qual é essa maravilhosa verdade? Sri-radha-pada-sevana: que o mais alto néctar de nossa vida é
o serviço de Srimati Radharani.
Isso é muito maravilhoso. ó
Bhaktivinoda Thakura, és nosso mestre.
Está em teu poder permitir que concedam sua graça a nós. Estás numa posiçäo para conceder a mais
elevada dádiva jamais conhecida pelo mundo a todos nós. Está à tua disposiçäo. ó Bhaktivinoda Thakura, por favor seja
bondoso para conosco e conceda-nos tua misericórdia."
Assim Sri Chaitanya
Mahaprabhu, nosso mais benevolente Senhor, veio para procurar por Seus servos
há muito perdidos e para dar-lhes esse mais elevado ideal do amor divino.
GAURA HARI BOL!
* * *